23 de julho de 2014

Crítica | Planeta dos Macacos: O Confronto

Andy Serkis em PLANETA DOS MACACOS: O CONFRONTO (Dawn of the Planet of the Apes)

★★★★

Dawn of the Planet of the Apes, EUA, 2014 | Duração: 2h10 | Lançado no Brasil em 24 de Julho de 2014, nos cinemas | Baseado no romance de Pierre Boulle e nos personagens de Rick Jaffa & Amanda Silver. Roteiro de Mark Bomback e Rick Jaffa & Amanda Silver | Dirigido por Matt Reeves | Com Andy Serkis, Jason Clarke, Gary Oldman, Keri Russell, Toby Kebbell, Kodi Smit-McPhee, Kirk Acevedo.

Por mais que os humanos e os símios de Planeta dos Macacos: O Confronto pareçam dividir equivalentes habilidades mentais, há algumas diferenças básicas e claras que separam os dois grupos: os primatas, em particular, surgem como seres em fase de adaptação aos avanços cognitivos conquistados no filme anterior (apenas uma década se passou desde que pesquisas de combate ao Mal de Alzheimer conferiram inteligência e lucidez a suas cobaias) e que se organizam em comunidade de forma ainda bastante rudimentar, preservando costumes de sua predecessora fase selvagem. Por essa razão, é suficientemente tolerável que o macaco com tendências psicopatas Koba (Toby Kebbell) desencadeie uma grande intriga a partir de motivações extremamente primitivas – o que não pode ser dito, por outro lado, sobre a contribuição do humano e imbecil Carver (Kirk Acevedo) para os conflitos, já que tamanha estupidez vindo de uma espécie dominante e supostamente evoluída não é tão fácil de engolir assim.

Escrito por Mark Bomback e pelos mesmos Rick Jaffa e Amanda Silver de Planeta dos Macacos: A Origem, O Confronto avança 10 anos em relação ao filme anterior e nos leva a um cenário pós-apocalíptico em que boa parte da humanidade foi dizimada por uma implacável gripe símia. Durante uma expedição motivada pela existência de uma usina hidrelétrica desativada nas redondezas, um pequeno grupo de humanos imunes à doença e oriundos de uma comunidade sitiada de São Francisco acaba entrando no território do bando de primatas liderado pelo pioneiro Cesar (Andy Serkis) e afetando a harmonia daquela população. A rispidez do encontro (contribuição, como não poderia deixar de ser, do tal Carver, um babaca confesso), porém, altera os ânimos de ambos os grupos: de um lado, os macacos prometem uma resposta violenta caso seu território seja invadido novamente pelos humanos, que por sua vez planejam secretamente um genocídio caso os símios dificultem o acesso de técnicos à tal usina, que promete solucionar os problemas energéticos daquela comunidade.

Dirigido por Matt Reeves (Cloverfield – Monstro, Deixe-me Entrar), Planeta dos Macacos: O Confronto conta com um dos piores usos de 3D da safra recente: embora tenha sido rodado originalmente com a tecnologia, o filme não possui um plano sequer cujo efeito tridimensional chame particularmente a atenção – fruto das escolhas equivocadas (considerando exclusivamente o 3D) de Reeves, que adota uma profundidade de campo pequena, mantendo e alterando o foco entre seus personagens em boa parte da projeção. Por outro lado, as decisões narrativas do cineasta são felizes em sua maioria: é extremamente estimulante que uma surperprodução desse porte ouse adotar um ritmo mais lento e dar atenção especial ao desenvolvimento da trama, em vez de submeter o espectador à histeria e ao frenesi de sequências de ação excessivas e constantes. Da mesma forma, as discussões temáticas oferecidas pela premissa da franquia também não são deixadas de lado pelo roteiro, como, por exemplo, ao destacar a importância da comunicação e da empatia como contrabalanceamento à racionalidade.

Jason Clarke e Andy Serkis em PLANETA DOS MACACOS: O CONFRONTO (Dawn of the Planet of the Apes)

Tecnicamente, como não poderia deixar de ser, Planeta dos Macacos: O Confronto é ainda mais interessante e eficiente que o filme anterior: com raras exceções, os modelos digitais dos primatas são incrivelmente realistas, movem-se com absoluta fluidez e exibem uma gama de expressões coerente com a proposta da produção. Nesse sentido, seria injusto economizar elogios ao trabalho de Andy Serkis, cujas sutilezas são registradas com perfeição pelo performance capture e transformam Cesar na incontestável figura mais interessante em cena. Favorecendo o investimento financeiro nos aspectos técnicos, o elenco é notavelmente econômico, desde a escolha do ascendente Jason Clarke para o papel humano principal até a participação do veterano Gary Oldman, que, pela milésima vez (a segunda apenas nesse ano, como RoboCop não me deixa mentir), dá vida a uma figura de autoridade secundária sujeita a grandes doses de pressão.

Desperdiçando eventualmente alguns minutos com a irrelevante relação familiar do trio vivido por Jason Clarke, Keri Russell e Kodi Smit-McPhee, Planeta dos Macacos: O Confronto sequer promove um avanço muito expressivo no arco geral da franquia, mas é bastante eficaz e cuidadoso em suas singelas passadas – e, se a sorte continuar a nosso favor, podemos esperar muita coisa boa do que ainda está por vir.

Toby Kebbell em PLANETA DOS MACACOS: O CONFRONTO (Dawn of the Planet of the Apes)

16 de julho de 2014

Crítica | Aviões 2: Heróis do Fogo ao Resgate

AVIÕES 2: HERÓIS DO FOGO AO RESGATE (Planes: Fire & Rescue)

★★★

Planes: Fire & Rescue, EUA, 2014 | Duração: 1h23 | Lançado no Brasil em 17 de Julho de 2014, nos cinemas | Baseado nos personagens de John Lasseter, Klay Hall e Jeffrey M. Howard. História de Bobs Gannaway e Jeffrey M. Howard. Roteiro de Jeffrey M. Howard | Dirigido por Bobs Gannaway | Com as vozes de Dane Cook, Ed Harris, Julie Bowen, Curtis Armstrong, John Michael Higgins, Hal Holbrook, Wes Studi, Brad Garrett, Teri Hatcher, Stacy Keach, Cedric the Entertainer, Jerry Stiller, Patrick Warburton e John Ratzenberger.

Pôster/capa/cartaz nacional de AVIÕES 2: HERÓIS DO FOGO AO RESGATE (Planes: Fire & Rescue)A animação Carros, de 2006, é tanto uma das menores bilheterias da Pixar quanto uma das mais lucrativas marcas desenvolvidas pelo estúdio, considerando o enorme sucesso da ampla variedade de produtos licenciados relacionados ao universo do filme. Aviões, de certa forma, é um deles: lançado nos cinemas há menos de um ano como uma produção desvinculada da Pixar, o longa claramente tentava lucrar em cima da criação de John Lasseter sem qualquer traço de ambição, estabelecendo "o mundo acima de Carros" como um esforço meramente oportunista e muitíssimo inferior à sua fonte de inspiração, mesmo reaproveitando vários de seus elementos. Por essa razão, é no mínimo surpreendente que uma produção tão tola e sem vida tenha ganhado uma continuação tão… razoável.

Produzido pela DisneyToon Studios (subdivisão da companhia do Mickey Mouse responsável por continuações de qualidade duvidosa de clássicos do estúdio e filmes derivativos como os da franquia Tinker Bell), o longa traz o ex-avião pulverizador Dusty Voo-Rasante tendo sua breve e apoteótica carreira como aeronave de corrida sendo interrompida por um defeito incorrigível na caixa de redução, mecanismo cujo modelo encontra-se fora de linha e, portanto, indisponível para substituição. Desobedecendo o conselho médico/mecânico de não exceder o limite de segurança estipulado para manobras arriscadas, Dusty acaba provocando um grande incêndio em um posto de combustível de Propwash Junction – o que chama a atenção das autoridades para a falta de preparo e estrutura do departamento de bombeiros da localidade. Assim, o protagonista se dispõe a ser treinado e equipado para se tornar um SEAT (sigla em inglês para aviões usados no combate às chamas), de modo a cumprir as metas estipuladas para que o aeroporto da cidade seja reaberto e o tradicional Festival do Milho não seja cancelado.

Escrito por Jeffrey M. Howard e pelo diretor Bobs Gannaway, o roteiro certamente não é o ponto alto do projeto: como era de se esperar, Dusty é alvo de desdém por parte dos experientes membros da companhia de combate a incêndios do Parque Nacional Pico Pistão até conseguir provar seu valor e conquistar a confiança do grupo – e também não é nenhuma surpresa que o rígido e exigente líder da equipe, o Patrulheiro Blade, possua um passado obscuro e seja particularmente desconfiado e rigoroso com o protagonista, selando a batida relação entre tutor e aprendiz que já havia sido desenvolvida de forma bem parecida tanto no filme anterior quanto em Carros. Da mesma forma, é frustrante notar como os roteiristas usam uma subtrama absolutamente deslocada envolvendo um casal de trailers como distração para a grande crise do terceiro ato, cuja difícil e desafiadora resolução não é revelada para o público.

AVIÕES 2: HERÓIS DO FOGO AO RESGATE (Planes: Fire & Rescue)

Todavia, o roteiro é redondinho, coeso e enxuto o suficiente para não aborrecer: os constantes reforços do heroísmo de Dusty são bem mais toleráveis que a trama do underdog em competição desenvolvida pelo filme anterior, por exemplo. Além disso, Aviões 2 parece o projeto mais cinematográfico do renegado DisneyToon, a começar pela decisão de apresentar o filme em Cinemascope (formato de tela mais largo, na proporção 2.35:1), mais simpático às telonas do que às telinhas. Da mesma forma, a qualidade técnica não deixa nada a desejar em relação a outras produções animadas da Disney, ao passo que a direção de Gannaway é surpreendentemente segura, competente e repleta de decisões acertadas, como simular câmera na mão em sequências de ação ou abafar o áudio em cenas de grande risco e tensão.

Por fim, é praticamente impossível falar sobre Aviões 2 sem abordar o trabalho de dublagem da versão brasileira – um dos mais embaraçoso a que já fui exposto. Antes de mais nada, a participação de Tatá Werneck não chega a incomodar ou comprometer, já que a personagem possui um papel secundário irrelevante e sua personalidade avoada combina com o jeito espevitado da comediante. Porém, o grande erro da distribuidora foi, sem sombra de dúvida, a contratação de Gregório Duvivier para auxiliar na inserção de piadas e outras linhas engraçadinhas compatíveis com o humor brasileiro no roteiro da dublagem – e embora o comediante seja um roteirista talentoso, o resultado é uma salada de frutas vergonhosa de referências anacrônicas e ilógicas, que inclui menções ao Rei do Camarote, diversas linhas do funk Beijinho no Ombro e o uso esquizofrênico de expressões e bordões como "Sabe de nada, inocente!", Zap Zap e "Cada mergulho é um flash". Para se ter ideia, quando um sofisticado hotel para carros e aviões precisa ser evacuado às pressas em decorrência de um incêndio florestal a certa altura da narrativa, o presunçoso e inconsequente proprietário do estabelecimento tenta impedir que seus hóspedes abandonem o edifício com um "Keep calm e deixa de recalque", o que não faz o menor sentido e não é, em nenhum nível, uma tirada minimamente engraçada.

Decisões como essa, que soam como esforços desesperados para atrair publicidade para o lançamento (enquanto, na verdade, se sujeitam ao risco de até mesmo afastar o público), são dignas de pena, já que Aviões 2 é surpreendentemente bom para a sequência apressada de um filme tão derivativo.

AVIÕES 2: HERÓIS DO FOGO AO RESGATE (Planes: Fire & Rescue)

Crítica | Juntos e Misturados

Drew Barrymore e Adam Sandler em JUNTOS E MISTURADOS (Blended)


Blended, EUA, 2014 | Duração: 1h57 | Lançado no Brasil em 17 de Julho de 2014, nos cinemas | Escrito por Ivan Menchell e Clare Sera | Dirigido por Frank Coraci | Com Adam Sandler, Drew Barrymore, Kevin Nealon, Terry Crews, Wendi McLendon-Covey, Emma Fuhrmann, Bella Thorne, Braxton Beckham, Alyvia Alyn Lind, Joel McHale, Abdoulaye NGom, Kyle Red Silverstein, Zak Henri e Shaquille O'Neal.

Pôster/capa/cartaz nacional de JUNTOS E MISTURADOS (Blended)
Custo a acreditar que os produtores de Juntos e Misturados não conseguiram captar a ironia contida no título do filme. Fazendo referência às novas famílias formadas a partir da união entre pais solteiros, divorciados ou viúvos e às eventuais dificuldades de conciliar idades, gostos e personalidades de padrastos, madrastas e enteados, o título também parece comentar a natureza do próprio roteiro, que tenta reunir cacos e retalhos de outras produções prévias, incluindo, naturalmente, algumas estreladas pelo próprio Adam Sandler - e diferentemente do modus operandi água-com-açúcar das narrativas comumente escolhidas pelo comediante, o casamento dos vários elementos reciclados aqui não é particularmente feliz.

Escrito por Ivan Menchell e Clare Sera, Juntos e Misturados parece uma espécie de refilmagem disfarçada de Esposa de Mentirinha, que o próprio Sandler estrelou e lançou há pouquíssimas primaveras. No filme, Jim (Sandler) é um pai viúvo e Lauren (Drew Barrymore) é uma mãe divorciada que se conhecem em um encontro às cegas desastroso e que, graças a circunstâncias absurdas que me recuso a descrever aqui, acabam viajando para o mesmo resort de luxo na África do Sul e são encarados constante e erroneamente pelos funcionários e hóspedes como uma família do tipo apontado pelo título do filme. Nesse contexto, Lauren acaba preenchendo involuntariamente o vácuo deixado pela ausência de uma figura materna na vida das filhas de Jim, que por sua vez desenvolve uma inesperada afinidade com os filhos da mulher – o que naturalmente estreita os laços da dupla.

Abraçando sem qualquer tipo de pudor a antiquada dinâmica do casal que briga, mas no fundo se ama, o roteiro é esquemático ao extremo: cada um dos sete personagens principais (os dois adultos e as cinco crianças) possui um traço singular de personalidade que precisa ser trabalhado antes que os créditos finais invadam a tela. Assim, os complexos de vaidade da jovem Hilary (Bella Thorne) ou a dificuldade de rebater bolas de beisebol do garoto Tyler (Kyle Red Silverstein), por exemplo, dão abertura para que posteriormente, como todos somos capazes de prever, vejamos a garota desfilando com um visual deslumbrante e o rapaz realizando um home run em uma partida importante. Além disso, o fato de as crianças serem sempre ajudados pelo desafeto de seus respectivos pais é uma estratégia extremamente óbvia e previsível para reforçar o potencial contido na esperada união entre Jim e Lauren, manipulando as emoções do público de forma rasteira.

Adam Sandler em JUNTOS E MISTURADOS (Blended)

Dirigido por Frank Coraci (do razoável Click e do detestável O Zelador Animal), o filme é consideravelmente menos ofensivo do que o esperado de uma produção da Happy Madison – o que talvez explique por que as tentativas de humor são mais esparsas e extremamente desajeitadas e ineficazes, a seu próprio modo. Embora encarne sua persona adolescente e imatura de sempre, Sandler parece enxergar o peso da idade e surge mais contido que o habitual, preterindo grosserias sexuais e escatológicas (que estão lá, claro, mas em menor quantidade) a favor da ênfase na importância dos vínculos familiares (o que culmina em uma canção que, executada nos créditos finais, é interpretada por Sandler e suas filhas da vida real e conta com comentários engraçadinhos sobre a rotina da família, numa decisão surpreendentemente simpática do comediante).

Como também era de se esperar, Juntos e Misturados é repleto de personagens secundários excêntricos que, surpreendentemente, conseguem divertir em uma ou outra oportunidade – com destaque para o grupo musical Thathoo, que, liderado pelo sempre exaltado personagem de Terry Crews, surge inesperadamente em ocasiões das mais inoportunas. Por outro lado, o conflito que é criado e desenvolvido no terceiro ato revela-se uma indiscutível afronta à inteligência do público – que, curiosamente, tem comparecido menos aos cinemas para conferir a produção; Juntos e Misturados já é uma das bilheterias menos expressivas da carreira de Sandler.

Parece que nem mesmo apostar em fórmulas já testadas – sejam as diversas convenções abraçadas pelo roteiro ou mesmo o resgate da parceria com Drew Barrymore – está sendo suficiente para sustentar a manufatura de bobagens do comediante.

Terry Crews em JUNTOS E MISTURADOS (Blended)

7 de julho de 2014

Crítica | O Céu é de Verdade

Connor Corum em O CÉU É DE VERDADE (Heaven is for Real)


Heaven is for Real, EUA, 2014 | Duração: 1h39 | Lançado no Brasil em 3 de Julho de 2014, nos cinemas | Baseado no livro de Todd Burpo e Lynn Vincent. Roteiro de Randall Wallace e Christopher Parker | Dirigido por Randall Wallace | Com Greg Kinnear, Kelly Reilly, Connor Corum, Thomas Haden Church, Lane Styles e Margo Martindale.

Pôster/capa/cartaz nacional de O CÉU É DE VERDADE (Heaven is for Real)
A vinheta da TriStar Pictures nunca foi tão metalinguística quanto em O Céu é de Verdade: embora sirva para informar o público do envolvimento do estúdio na produção, a famosa e breve imagem de um feixe de luz quase etéreo surgindo entre nuvens e sendo interceptado por um gracioso cavalo alado pode ser encarada como uma cena já da própria narrativa, considerando que, após viver uma experiência de quase-morte, o garoto Colton Burpo (Connor Corum) alega ter dado um giro pelo Céu e constatado que Jesus, além de bom anfitrião e guia turístico, possui um cavalo.

Esta, claro, não é a mais incisiva das estratégias utilizada pelo filme para tentar provar seu ponto. Dirigido por Randall Wallace, O Céu é de Verdade faz questão de reforçar desde o início que a narrativa é baseada em uma história verídica – e acreditar no Céu com base nisso equivale a admitir que fantasmas existem após ter visto A Invocação do Mal, outro que alega se inspirar em eventos reais. Da mesma forma, a presença de indivíduos céticos sendo gradualmente convencidos por evidências supostamente irrefutáveis apresentadas pelo jovem Colton não é nenhuma novidade; na verdade, esta é a estratégia central do longa, já que o aparente clímax dramático da narrativa (extremamente frustrante, vale apontar) ocorre quando a mais incrédula das personagens finalmente é convencida pelo garoto.

Connor Corum e Greg Kinnear em O CÉU É DE VERDADE (Heaven is for Real)

Aliás, diferentemente de lixos repugnantes como o dramalhão religioso Corajosos, O Céu é de Verdade não traz qualquer pregação mais explícita e não comete o equívoco de demonizar descrentes ou ateus; ao invés disso, o filme chega até mesmo a articular um discurso de tolerância com adversidades e crenças (ou descrenças) alheias, o que é bastante positivo. Para completar, a produção chega bem perto de se desvincilhar de rótulos religiosos definitivos ao admitir, a certa altura, que acreditar ou não no Céu está vinculado à própria ideia que cada um possui a respeito do tema: em um discurso próximo ao desfecho, o pastor vivido por Greg Kinnear sugere que o Céu pode estar (breguice alert!) "no sorriso de uma criança", por exemplo.

Infelizmente, o filme peca por contrariar esta postura mais libertária ao tentar, até o último segundo, convencer o público da existência de um espaço metafísico transcendental para onde todas as boas almas vão após a morte. Além disso, o roteiro falha ao abandonar repentinamente certos conflitos (como as crescentes dificuldades financeiras da família Burpo foram superadas?) e por desperdiçar oportunidades de explorar temas interessantes e pertinentes, como a crueldade do sistema de saúde norte-americano.

Assim, O Céu é de Verdade se estabelece como um drama familiar aborrecido, monótomo e segregador de público, devendo funcionar apenas como reafirmação de crenças para aqueles que já as possuem – e se o interesse por um acaso for conferir Greg Kinnear em uma produção com temática religiosa, o mordaz e pouco conhecido E… Que Deus Nos Ajude!!! pode ser uma alternativa muito mais interessante e proveitosa.

Kelly Reilly e Connor Corum em O CÉU É DE VERDADE (Heaven is for Real)