
★★★
The Fault in Our Stars, EUA, 2014 | Duração: 2h06 | Lançado no Brasil em 5 de junho de 2014, nos cinemas | Baseado no livro de John Green. Roteiro de Scott Neustadter & Michael H. Weber | Dirigido por Josh Boone | Com Shailene Woodley, Ansel Elgort, Laura Dern, Nat Wolff, Sam Trammell e Willem Dafoe.
Baseado no romance homônimo de John Green, A Culpa é das Estrelas é iniciado com uma atmosfera levemente cômica (semelhante à de 50%, com Joseph Gordon-Levitt e Seth Rogen) e logo nos apresenta à jovem Hazel Grace Lancaster (Shailene Woodley), uma garota de 16 anos que lida diariamente com a proximidade da morte desde que fora diagnosticada com câncer na tireoide (posteriormente evoluído para uma metástase nos pulmões) aos 13 anos e deu início a um tratamento experimental que, até então, nunca havia dado resultados particularmente animadores. Dona de um olhar ácido e melancólico em relação à própria existência, Hazel é pressionada pela mãe (Laura Dern) a frequentar um grupo de apoio a jovens com câncer – e é em uma dessas reuniões que ela conhece Augustus, cuja experiência pessoal com um tumor ósseo – agora controlado – lhe custou uma porção de uma das pernas. Aparentemente imune a qualquer fagulha de negativismo e visivelmente interessado na bela garota, o rapaz tenta uma aproximação e a investida rapidamente evolui para uma amizade que, a certa altura, acaba se convertendo em um romance – envolvimento este que jamais consegue caminhar livre do fantasma da imprevisibilidade da doença.
Investindo quase dois terços da projeção na pouco inspirada construção da relação do casal principal, o longa consegue evitar a monotonia não só através de intervenções mais dramáticas (quando, normalmente, a veterana Laura Dern rouba a cena), mas também ao lançar luz sobre a forma como os novos e inesperados sentimentos despertados na protagonista são assimilados por ela (já que o amor do rapaz, aparentemente grandioso e determinado desde o princípio, não parece evoluir significativamente ao longo da narrativa): repare, por exemplo, a insegurança e a hesitação de Hazel ao quase ser pega lançando um olhar encantado para Augustus durante um passeio do casal, como se tentasse adiar a tarefa de lidar com os próprios sentimentos. Como esperado, Shailene Woodley faz um trabalho irrepreensível: com feições ainda bastante joviais, a atriz de 22 anos surge levemente abatida (mérito compartilhado com o discreto e eficiente trabalho de maquiagem), imprime com competência a vulnerabilidade e o desgaste físico da personagem e consegue conquistar o espectador com os lentos e incontidos sorrisos de uma garota que, em meio a um turbilhão de emoções e conflitos internos, está redescobrindo os prazeres da vida e reaprendendo a sorrir.

Do ponto de vista técnico, A Culpa é das Estrelas não possui grandes problemas: com exceção da seleção musical, que apela para o batidíssimo indie-folk, e da tendência ao melodrama da trilha sonora de Mike Mogis e Nate Walcott (embora os compositores acertem, por exemplo, ao pontuar suficientemente bem a atmosfera de apreensão da ocasião em que Hazel se desafia a enfrentar as escadarias de um museu), a produção comete tropeços pouco relevantes aqui ou ali, como o descuido com a perna mecânica de Augustus (as calças skinny evidenciam a panturrilha do ator em diversas situações) ou a obviedade do figurino de um personagem particularmente perturbador em um enterro, que destoa gritante e propositalmente dos demais presentes. Já a direção de Josh Boone (Ligados Pelo Amor), discreta na maior parte do tempo, acaba comprometida pela necessidade de recorrer a alguns clichês irritantes, como ocorre na previsível cena em que Hazel, normalmente negligente com o próprio visual, é vagarosamente admirada pela mãe e pelo companheiro ao surgir usando um belo vestido antes de sair para um jantar romântico.
Porém, A Culpa é das Estrelas se juntaria aos irregulares ou péssimos Um Amor Para Recordar, Agora e Para Sempre e Inquietos como apenas mais um romance centrado em jovens portadores de câncer terminal caso o texto não trouxesse consigo dois grandes diferenciais. É surpreendente e curioso que uma produção cuja divulgação ganhou força viral graças ao rótulo de "filme para chorar" levante reflexões bastante pertinentes sobre a natureza do vínculo estreito que o público normalmente estabelece com personagens e narrativas ficcionais: quando Hazel transforma em obsessão a necessidade de descobrir o futuro dos personagens de um livro com final propositalmente aberto, além de compreender um pouco mais a respeito da inquietação da protagonista diante do imprevisível e abrupto encerramento de sua própria trajetória, não consegui deixar de pensar que, pessoalmente, eu teria sido uma pessoa ligeiramente mais feliz caso, por exemplo, o decepcionante epílogo de Harry Potter nunca tivesse sido escrito, já que o futuro apresentado naquele capítulo soa arbitrário, irrelevante e parece interessado em responder perguntas que sequer precisavam ser levantadas. Para completar, o segundo e maior acerto do projeto consiste em (não leia o restante do parágrafo caso se incomode com spoilers) sua grande virada: a inversão de papéis ocorrida no terceiro ato abre espaço para novas e importantes reflexões e desestabiliza tanto os personagens quanto o espectador, que se juntam na lamentação ainda mais intensa quanto à natureza arrebatadora do câncer – ou, em um panorama mais amplo, à efemeridade da própria vida, já que estamos todos sujeitos a enfermidades e incidentes repentinos.
Ligeiramente mais extenso que o ideal, A Culpa é das Estrelas é um romance que consegue atiçar as glândulas lacrimais dos espectadores não só através do esforço deliberado (e pouco legítimo) de arrancar lágrimas a qualquer custo, mas também graças à sensibilidade espalhada pelos mais diversos cantos da narrativa. E não precisa se intimidar: o choro é livre.
