9 de janeiro de 2014

Crítica | Resgate em Alta Velocidade

RESGATE EM ALTA VELOCIDADE (Getaway)


Getaway, EUA/Bulgária, 2013 | Duração: 1h30 | Lançado no Brasil em 9 de Janeiro de 2014, em DVD e Blu-ray | Escrito por Sean Finegan e Gregg Maxwell Parker | Dirigido por Courtney Solomon | Com Ethan Hawke, Selena Gomez, Rebecca Budig e Jon Voight.

Capa/pôster/cartaz nacional de RESGATE EM ALTA VELOCIDADE (Getaway)
Graças ao Whatsapp, você consegue trocar mensagens entre aparelhos de celular com serviço de internet sem custos adicionais. Com o Tinder, você pode descolar encontros românticos, sexuais e quiçá conhecer o amor da sua vida. Procurando uma rede social para fotos, com suporte para vídeos de até 15 segundos e uma variedade de filtros para aplicar em suas imagens? O Instagram é a resposta para sua demanda. Se estiver com excesso de tempo ocioso, o Candy Crush pode resolver seu problema. Interessado em descobrir qual o tamanho ideal de camisinha para o seu pênis? Pois jogue as dimensões do seu membro no Condom Size e obtenha a resposta prontamente. Agora, se você estiver preso em um carro repleto de câmeras instaladas por um criminoso alegadamente astuto, que supostamente te vigia atentamente para impedir que os planos megalomaníacos dele sejam comprometidos por suas ações, você precisa ter o Image Looper X, que grava um pequeno trecho da filmagem sem muita ação e o repete indefinidamente, levando o bandidão a acreditar que você está quietinho no veículo. Tipo no ônibus em Velocidade Máxima, lembra?

Sim, vivemos a era dos aplicativos. Muitos dos pequenos problemas mundanos da humanidade são resolvidos instantaneamente com o auxílio desses programetes. Muitos, mas não todos. Como vocês devem ser capazes de deduzir, um dos aplicativos citados no primeiro parágrafo é absurdo demais para existir – pelo menos no mundo real.

Resgate em Alta Velocidade, portanto, não pode ser ambientado em um universo real. Escrito pelos estreantes Sean Finegan e Gregg Maxwell Parker, o filme acompanha o motorista de corrida aposentado Brent Magna (Ethan Hawke) enfurnado em um carro possante e repleto de câmeras de vigilância, instaladas por bandidos que sequestraram e ameaçam matar sua mulher (Rebecca Budig) e transmitem periodicamente novas tarefas ao sujeito. A certa altura, junta-se a Brent a atrevida dona anterior do veículo, que, não coincidentemente, é também filha do diretor de um grande banco de investimentos local. Juntos, Brent e a garota (Selena Gomez) precisam correr contra o tempo para assumir o controle da situação e frustrar os planos da boca falante de Jon Voight (que recebe possivelmente o cachê mais fácil de toda sua carreira).

Selena Gomez e Ethan Hawke em RESGATE EM ALTA VELOCIDADE (Getaway)

Seria uma tarefa extremamente desafiadora caso o vilão fosse tão inteligente e perspicaz quanto julga ser – e "imbecil" é a primeira palavra que vem à minha mente quando penso em um sujeito que rouba um carro e modifica seu interior para transformá-lo em um pequeno cárcere sobre rodas, mas esquece de recolher os pertences da dona anterior guardados no porta-luvas – incluindo um tablet com o já citado e providencial Image Looper X instalado. Da mesma forma, qual o propósito de instalar microfones no veículo se estes não são utilizados pelo vilão quando o mocinho e a mocinha estão matutando modos de se salvar? Comportamentos incoerentes e irreais, porém, não são características exclusivas dos antagonistas de Resgate em Alta Velocidade (e não leia o restante do parágrafo caso se incomode com spoilers que poderiam ser facilmente deduzidos a partir da premissa): a esposa de Brent, Leanne, precisa ser uma mulher extremamente perturbada para, instantes após ser libertada, incentivar que o marido – um cidadão comum – se envolva em novas situações de riscos para salvar uma garota que ela sequer conhece.

Ou talvez a mulher tenha conhecimento sobre a incompetência da polícia da cidade búlgara de Sofia, que, embora possua uma das maiores frotas de viaturas já vistas (basta contar o número alarmante de carros que são descartados nas incontáveis sequências de perseguição), parece formar menos uma equipe que combate o crime a serviço da população e mais o elenco de um daqueles espetáculos de destruição de carros. Além disso, Courtney Solomon também peca por adotar uma lógica visual confusa: o mesmo estilo de filmagem das câmeras instaladas no carro também é visto frequentemente em imagens captadas por fontes externas ao veículo, embora em pouquíssimas ocasiões trate-se de câmeras de vigilância de fato. Para completar, o diretor jamais consegue justificar a duração da narrativa para um roteiro tão tolo e frouxo: com exceção de um longo e moderadamente interessante plano que acompanha uma perseguição atravessando um extenso trecho da locação (e cujo resultado parece uma conquista muito mais logística da produção do que artística), as sequências de ação pecam pela montagem por vezes confusa e, sobretudo, por se distinguirem pouquíssimo umas das outras; a impressão que fica é que, a cada dez minutos, a narrativa é interrompida para testemunharmos o protagonista tendo que se esquivar novamente de mais meia dúzia de viaturas policiais.

Ou talvez eu seja ingênuo e não tenha percebido que Solomon e o montador Ryan Dufrene também são usuários assíduos do Image Looper X – o que naturalmente me coloca na posição de vítima do crime que cometeram.

RESGATE EM ALTA VELOCIDADE (Getaway)

8 de janeiro de 2014

Crítica | Confissões de Adolescente

Malu Rodrigues, Bella Camero, Cassio Gabus Mendes, Clara Tiezzi e Sophia Abrahão em CONFISSÕES DE ADOLESCENTE

★★★

Confissões de Adolescente, Brasil, 2014 | Duração: 1h36 | Lançado no Brasil em 10 de Janeiro de 2014, nos cinemas | Baseado no livro de Maria Mariana. Roteiro de Matheus Souza e Sylvio Gonçalves | Dirigido por Daniel Filho e Cris D'amato | Com Sophia Abrahão, Malu Rodrigues, Bella Camero, Clara Tiezzi, Cassio Gabus Mendes, Olivia Torres, Christian Monassa, Hugo Bonemer, Tammy di Calafiori, Guilherme Prates, João Fernandes, Bruno Jablonski, Anna Rita Cerqueira, Eduardo Melo, Dieter Fuhrich, Cintia Rosa, Gabriel Totoro, Maria Mariana, Daniele Valente, Deborah Secco, Georgiana Góes, Thiago Lacerda, Caio Castro.

Pôster/capa/cartaz de CONFISSÕES DE ADOLESCENTE
O formidável As Vantagens de Ser Invisível, lançado nos cinemas em 2012, é baseado em um livro publicado em 1999 e conta uma história ambientada no início da década de 1990 – e mesmo que não haja grandes intervalos de tempo separando os três períodos, é admirável como o texto de Stephen Chbosky permanece pertinente para as gerações de jovens que viveram nas três épocas (e provavelmente continuará atingindo muitas das futuras), conseguindo, por exemplo, dialogar fortemente com a juventude dos tempos atuais mesmo sem recorrer às modernidades que definem as relações interpessoais de hoje (como celulares, internet e redes sociais). No extremo oposto do espectro, podemos colocar O Diário de Tati, longa nacional centrado em uma adolescente aborrecida e estereotipada que, quando filmado em 2006, já soava datado (considerando que o "humor" parecia menos sedimentado em situações do cotidiano adolescente e mais nas expressões e gírias engraçadinhas da personagem, importadas da época em que esta fazia sucesso em algum humorístico na TV) – e o embaraço se tornou ainda maior quando o filme permaneceu longos anos engavetado, transformando-se em um dos mais anacrônicos lançamentos de 2012.

Minha curiosidade ao entrar na sessão de Confissões de Adolescente dizia respeito justamente à discussão levantada no parágrafo anterior: teria o texto de Maria Mariana, originalmente lançado como peça teatral em 1992, chegado a 2014 em boa forma? Adaptado pelo jovem Matheus Souza (que, além de diretor e roteirista de Apenas o Fim e Eu Não Faço a Menor Ideia do Que Eu Tô Fazendo Com a Minha Vida e sensação cult do cinema brasileiro, já havia cuidado de uma versão teatral contemporânea da criação de Maria Mariana ao lado de Clarice Falcão) com a colaboração de Sylvio Gonçalves, o roteiro acompanha quatro irmãs que, em fases diferentes da juventude, enfrentam dilemas igualmente distintos depois que o pai, Paulo (Cassio Gabus Mendes), anuncia que a família precisará mudar de apartamento por questões financeiras. Já na faculdade e morando fora de casa, a primogênita Tina (Sophia Abrahão) está correndo atrás do primeiro emprego enquanto vê seu longínquo namoro enfrentar uma aparentemente inevitável crise; prestes a prestar vestibular, Bianca (Bella Camero) sofre com a dificuldade de escolher um curso superior que concilie a ambição do pai e suas próprias vontades, ao mesmo tempo que parece estranhamente empenhada em esconder seu misterioso namorado dos amigos e familiares; já a mente de Alice (Malu Rodrigues) está ocupada com a famigerada primeira transa, incluindo não só as expectativas e os preparativos, como também as consequências do ato; por fim, a caçula Karina (Clara Tiezzi) se vê sendo cortejada por um garoto que, em função do sucesso de Crepúsculo, passa a acreditar que garotas sentem atração por vampiros e começa a tentar se passar por um.

Infelizmente, a harmonia entre todas as subtramas (que não se resumem às descritas acima) não é completamente eficaz: a tarefa de acompanhar a ampla galeria de personagens torna-se ligeiramente mais desafiadora em função dos flashbacks que complementam apenas uma das historinhas (confesso que só notei que essa estratégia estava sendo usada quando um raccord colocou em posição de igualdade o jovem ator Eduardo Melo e o adulto Hugo Bonemer, já que para mim se tratavam de subtramas distintas) ou ainda graças a bruscas e inoportunas mudanças de tom, quando a narrativa salta de cenas engraçadinhas para outras dramaticamente carregadas sem qualquer cerimônia. Ainda nesse sentido, é perfeitamente possível compreender os propósitos cômicos pretendidos por Souza ao conceber a subtrama do rapaz que se inspira em Crepúsculo, mas a falta de vigor da direção faz com que as cenas apenas aborreçam o espectador e destoem do restante da narrativa (note como até a mãe do personagem de João Fernandes, vivida em uma pequena participação afetiva por Deborah Secco – integrante do elenco original da série de tevê -, surge como uma figura tremendamente absurda e incompatível com o universo do filme).

Clara Tiezzi e João Fernandes em CONFISSÕES DE ADOLESCENTE

Além disso, Confissões de Adolescente também acaba sofrendo com problemas de ritmo, quando muitas das pendências começam a ser rapidamente resolvidas sem, contudo, constituírem um clímax propriamente dito – e, quando nos damos conta, a maior parte dos dramas já foi superado e os créditos finais já estão pipocando na tela. E embora eu me sinta compelido a elogiar a decisão da produção de respeitar a importância de nudez, sexo e palavrões em tramas como essa, não há como ignorar que pelo menos uma das cenas marcadas por este conteúdo soa um tanto artificial: a exposição a que Juliana (Olivia Torres) se submete durante uma aula de Educação Física é radicalíssima e não parece condizente com a personalidade da garota. Ainda nesse sentido, a forma como os diretores Daniel Filho e Cris D’amato evocam o misto de sensações e inseguranças durante a primeira relação sexual de Alice e Marcelo (Christian Monassa) é até bastante interessante, pelo menos na teoria; na prática, efeitos especiais mais rebuscados teriam feito com que a cena deixasse menos a desejar.

Por outro lado, o belo e jovem elenco surge como uma agradável surpresa ao oferecer, na maior parte do tempo, desempenhos naturais e expressivos – fruto, talvez, da decisão dos realizadores de privar os atores da posse do roteiro, cujas linhas gerais dos diálogos eram fornecidas aos jovens pouco tempo antes do grito de “Ação!” em busca de uma maior espontaneidade, que é alcançada mesmo com os consideráveis índices de clichês do texto. Todavia, mesmo pecando ao tentar abraçar o mundo e tocar no maior número possível de questões pertinentes aos jovens das mais diversas idades, Confissões de Adolescente alcança o sucesso narrativo em diversas ocasiões: há uma inegável força, por exemplo, na forma como a crise do relacionamento de Tina e Lucas (Hugo Bonemer) é trabalhada, na tranquilidade e compreensão do personagem de Cássio Gabus Mendes ao saber de determinado problema que uma amiga de Tina estaria enfrentando (e a forma emblemática como essa reação está diretamente ligada ao fato de o dilema não estar sendo vivenciado por uma de suas filhas) ou por trás do desabafo patético de uma patricinha no terceiro ato. E, exatamente por tudo isso, fiquei particularmente espantado com a forma displicente como a questão do aborto é tratada pelo filme: embora claramente não se proponha a ir fundo na discussão, o roteiro tampouco se priva de trazer uma personagem sensata esbravejando que “Aborto é crime!”, sem considerar a ampla diversidade de variáveis que fundamentam a discussão.

Mas são os bons momentos citados anteriormente que, de certa forma, me levam a concluir que Confissões de Adolescente encontra-se em um meio termo entre os extremos citados no primeiro parágrafo: não só a base da obra de Maria Mariana parece ter resistido bem ao tempo, como também a reformulação parece ter méritos suficientes para não soar particularmente datada. As demais imperfeições, entretanto, podem vir a comprometer a longevidade da obra – mas isso é algo que só o tempo poderá confirmar.

Olivia Torres e Guilherme Prates em CONFISSÕES DE ADOLESCENTE

2 de janeiro de 2014

Mudança de ares

Antes de mais nada, peço perdão àqueles que acessaram o blog ao longo dos últimos meses e o encontraram às moscas - até mesmo depois de uma esperançosa mudança do layout. Com a perda do ritmo de atividade, fiquei algum tempo sem saber exatamente qual rumo essa atividade tomaria, daí a demora para fornecer alguma satisfação. De todo modo, já compreendi os vários fatores que convergiram para que as publicações por aqui cessassem, mas é irrelevante entrar em detalhes sobre eles.

Entretanto, não estou completamente inativo. Se por alguma razão você se interessou pelo trabalho que desenvolvi por aqui, saiba que estou atuando como colaborador do Cinema de Buteco, onde posso alcançar um público maior e cobro menos de mim mesmo. Para ir direto aos textos de minha autoria, clique aqui.

Nos vemos por lá.