22 de agosto de 2013

O maior inimigo dos blogueiros


Se você possui um blog, dedicado a qualquer assunto que seja, e realiza um bom trabalho, acredite: é apenas uma questão de tempo até que seu conteúdo seja plagiado - se é que já não foi, considerando que ocorrências como essa são difíceis de identificar e serviços como o Copyscape ou o Plagium, além de imprecisos e limitados, são pouco disseminados entre os colegas do meio. Movidos pela ideia errônea de que a internet é uma terra sem lei e estimulados pela impunidade, milhares de indivíduos se apropriam diariamente da propriedade intelectual alheia em busca de cliques, acessos e reconhecimento indignos - e quando eventualmente acabam sendo expostos, são capazes de assumir comportamentos impensáveis na tentativa de fintar as acusações e justificar seus atos.

Foi o caso, por exemplo, do plágio que identifiquei e expus em maio do ano passado, cometido por um sujeito que, responsável por mais de meia dúzia de apropriações indevidas de conteúdo, tentou, numa reação absurdamente esquizofrênica, transformar este que vos fala em uma espécie de psicopata, no intuito de desviar o foco da grave transgressão que vinha cometendo: fui acusado pelo dito cujo de ameaçá-lo de morte, uma inverdade óbvia, grave e que dispensa maiores comentários. Como se não bastasse, fui surpreendido pela inércia de vários colegas blogueiros, que só manifestaram abertamente o repúdio à atitude do plagiador depois que o caso foi amplamente divulgado, com a ajuda do crítico Pablo Villaça.

De lá pra cá, devo ter sido plagiado dezenas de vezes - e, provavelmente, jamais serei capaz de identificar todos os casos, embora dois deles tenham chamado particularmente minha atenção: no primeiro, minha crítica de Tudo Por um Sonho foi inteiramente reproduzida, pouco mais de seis horas após a publicação original, por um portal habituado a se apropriar de conteúdo sem autorização. Após dias tentando entrar em contato com os responsáveis sem obter qualquer tipo de resposta, optei por assumir uma postura extrema: passei a publicar comentários deselegantes (mas verdadeiros) a respeito da transgressão na fanpage do portal no Facebook. Resultado: em questão de minutos, fui contatado por um dos editores, que demonstrou uma dificuldade alarmante de compreender minha queixa, até que finalmente removeu a publicação. No segundo caso, um parágrafo inteiro do meu texto sobre Faroeste Caboclo foi indevidamente usado pelo jornal goiano Diário da Manhã - e, embora o editor da publicação tenha sido moderadamente atencioso em um primeiro momento, logo passei a ser ignorado e - o que é pior - a receber spam da empresa, que aparentemente enxergou em mim um potencial anunciante.

Todavia, o que me impulsionou a escrever novamente sobre o assunto foi um caso mais recente, cuja repercussão em uma fatia bastante representativa da chamada blogosfera me deixou particularmente espantado. Por circunstâncias que não vêm ao caso, descobri que o texto sobre A Estranha Vida de Timothy Green - um dos mais repercutidos do respectivo blog -, escrito pela colega e amiga Ana Clara Matta, do Ovo de Fantasma, havia servido de "inspiração" para algum blogueiro preguiçoso e picareta - em outras palavras, várias frases haviam sido inteiramente copiadas pelo autor e encaixadas em um texto supostamente original, sem qualquer tipo de discriminação, autorização ou crédito.

Seria apenas mais um caso desagradável caso o tal blog não integrasse a SBBC (Sociedade Brasileira de Blogueiros Cinéfilos), grupo que, como o próprio nome sugere, busca unir e, consequentemente, fortalecer e impulsionar autores brasileiros de blogs voltados para a sétima arte. Nessas circunstâncias, o colega Márcio Sallem, membro da tal SBBC, autor do Em Cartaz, vítima frequente de plágios e ferrenho defensor da propriedade intelectual, tomou a iniciativa de comunicar o ocorrido à direção da organização.

A resposta veio algum tempo depois - e foi justamente aí que o caso se tornou particularmente intrigante. Em comunicado emitido nos mecanismos internos do tal grupo, os líderes, como esperado, reconheceram a gravidade do ocorrido, mas preferiram preservar a identidade do transgressor, sugeriram que confiam na boa fé de seus integrantes e declararam que "(...) de agora em diante, na existência de provas concretas, o membro infrator será banido". Em resumo: para evitar constrangimentos tidos como desnecessários (algo de que discordo veementemente), a direção da Sociedade preferiu botar panos quentes no ocorrido, legitimando a atitude do sujeito ao desconsiderar punições imediatas e omitir sua identidade.

Antes de prosseguir, preciso enfatizar que, pessoalmente, não enxergo má fé maior que surrupiar deliberadamente frases inteiras de textos de terceiros e se colocar como autor delas - e compreendo perfeitamente a raiva e a impotência que Ana Clara expressou ao descobrir que seu trabalho havia sido afrontado. Além disso, é de se esperar que um indivíduo capaz de cometer este ato já o tenha feito anteriormente - algo que pude confirmar explorando brevemente o arquivo do tal blog, que inclui, por exemplo, um texto repleto de trechos extraídos de uma crítica do filme Lincoln publicada pelo Omelete, que aparentemente passou batido pelo controle rigoroso de conteúdo defendido sistematicamente pela direção da SBBC.

Nenhum comunicado público foi emitido pela organização até o momento - e, pra piorar, a posição firme de Márcio vem sendo encarada como exagerada, desnecessária e desrespeitosa por outros membros, incluindo, vejam só, o próprio infrator. Nos bastidores, a alegada tempestade em copo d'água criada por Sallem é defendida com exemplos grandiosos (como o suposto plágio sofrido pelo escritor brasileiro Moacyr Scliar, cujo Max e os Felinos teria servido de inspiração para o livro que deu origem ao longa As Aventuras de Pi), na expectativa de que as destoantes ordens de grandeza diminuam a gravidade do caso corrente.

A triste realidade é que, quando um grupo supostamente criado para unir e defender os blogueiros legitima um ataque deliberado e comprovado ao trabalho de uma colega, eu, Ana, Márcio e todos os companheiros mais esclarecidos nos deparamos com motivos mais que suficientes para ficarmos severamente preocupados.


UPDATE (25/08/2013 - 15:00):

A maior alegria de escrever um blog sobre Cinema não vem das estatísticas de acesso, da possibilidade de me aproximar de uma arte que amo ou da comodidade de assistir aos últimos lançamentos gratuita e antecipadamente. O que há de mais compensador nessa atividade, na realidade, é o privilégio que tenho de me rodear de pessoas extraordinárias: em maior ou menor grau, tive a chance de conhecer e interagir com pessoas como Pablo Villaça, Tullio Dias, Ana Clara Matta, Virgílio Souza, Marcelo Seabra, João Marcos Flores, Márcio Sallem, Andrey Lehnemann, Ana Lúcia Andrade, Arthur Melo e Elton Telles - e, se tudo der certo, ainda terei o prazer de ser apresentado a outros tantos.

Naturalmente, fui induzido a criar a ilusão de que a gama de características que admiro nesses indivíduos fosse compartilhada pelo montante dos colegas - e, justamente por essa razão, foi particularmente frustrante ler uma série de mensagens deselegantes de alguns deles ao longo dos últimos dias, cujo conteúdo não se encaixa no padrão de excelência estabelecido pelo grupo de pessoas citado acima. Desde a publicação dessa postagem, há exatas 72 horas, li diversos ataques ao conteúdo desse texto, homogeneamente pobres na contra-argumentação.

De modo resumido, alguns dos nomes ligados à produção e à divulgação desse texto foram associados a barbáries das mais diversas, que vão de defasagens éticas ao excesso de pelos nas nádegas. No que diz respeito ao caso propriamente dito, algumas novidades foram lançadas em meio a diálogos truncados - como, por exemplo, que a punição à transgressão envolveu a retirada do conteúdo indevido do ar, decisão instintiva que pouco altera o teor do tratamento recebido pelo plagiador por parte da direção da SBBC. (Abro aqui um parêntese para apontar que, como um ser minimamente pensante, compreendo que uma decisão da SBBC possui peso meramente simbólico. As satisfações em relação ao ocorrido deveriam ser dadas pelo infrator à justiça, caso a(s) vítima(s) - respaldada(s) pela lei - se sentisse(m) impelida(s) a levar o caso adiante).

O texto acima foi redigido justamente porque, pessoalmente, discordo energicamente da decisão e senti vontade de tornar pública minha preocupação com relação à mentalidade assumida pelos responsáveis (e aproveito a oportunidade para desfazer uma colocação infeliz: no último parágrafo, deixei subentendido que a SBBC como um todo havia legitimado a ação do plagiador, enquanto gostaria de ter me referido apenas à direção e àqueles que concordaram com a decisão. Não foi intencional. Perdoem-me). Outro texto semelhante poderia ser redigido por uma pessoa que concorda com o veredito da SBBC, e, com os dois pontos de vista expostos, teríamos algo conhecido como discussão. Entretanto, continuamos sem um posicionamento oficial da liderança do grupo (a rigor, nem mesmo a resolução do caso foi oficialmente divulgada); as poucas manifestações ponderadas - contrárias ou não - feitas por alguns de seus membros podem ser lidas nos comentários dessa postagem.

Os canais de comunicação do Cinema Sem Erros continuam abertos à exposição de quaisquer pontos de vista.

UPDATE FINAL: Julguei prudente remover os registros de algumas das grosserias citadas nos últimos parágrafos. Além disso, em comunicado publicado em 7 de Outubro, a SBBC finalmente se pronunciou sobre o ocorrido. Para ler o texto, clique aqui.