
Enquanto assistia a O Mundo dos Pequeninos, pela primeira vez na vida me dei conta de que o uso da expressão "perder o fôlego" como elogio a obras belas possui um berço literal: ao longo deste novo e belíssimo trabalho do Studio Ghibli, fui pego de surpresa por pontuais faltas de ar com a estonteante direção de arte do filme, cujas concepções macroscópica e microscópica de uma casa de campo e seus jardins impressionam pela riqueza de detalhes e sua perfeição técnica. Somando-se ainda a eficiência tradicional do estúdio de animação japonês na abordagem de histórias com elementos fantásticos, o filme se estabelece com facilidade como uma obra no mínimo admirável.
No roteiro, escrito por Keiko Niwa e pelo veterano Hayao Miyazaki (que deixa a direção a cargo de Hiromasa Yonebayashi) com base no tradicional livro Os Pequeninos Borrowers, de Mary Norton, Sho (Ryûnosuke Kamiki) é um garoto que se muda para a casa da tia Sadako (Keiko Takeshita) para repousar antes de se submeter a uma delicada cirurgia cardíaca. Durante a estadia no local, o rapaz descobre que uma família de colhedores - pessoas pequeninas que se sustentam surrupiando suprimentos dos humanos - vive acuada debaixo do assoalho da casa, temendo as consequências que o contato com os grandões pode acarretar para seu povo. Garoto de bom coração (não, claro, no sentido literal), Sho consegue amolecer aos poucos a postura defensiva da colhedora adolescente Arrietty (Mirai Shida) e acaba ajudando a família da garota a se esquivar da xereta governanta Haru (Kirin Kiki).
Como já mencionado, o apelo visual e o preciosismo técnico de O Mundo dos Pequeninos são arrebatadores: a animação em tradicional 2D (recorrendo pontualmente ao 3D, como em travellings) dos estúdios Ghibli evoca com maestria a tridimensionalidade daquele universo e abraça várias das técnicas cinematográficas comuns ao live action, como mudanças de iluminação (repare a cena em que Arrietty e seu pai caminham por um ambiente escuro com um lampião) ou profundidades de campo distintas. Além disso, a fluidez e a expressividade da animação ainda impressionam - e Yonebayashi acerta ao manter-se predominantemente na altura dos pequeninos, registrando aquele mundo pela perspectiva de sua protagonista, Arrietty (o que vale também para o desenho de som, que amplia ruídos menos perceptíveis para humanos). E a direção de arte impressiona pela concepção do mundo dos colhedores a partir de uma série de soluções interessantes e criativas: relógios de pulso, alfinetes e fitas dupla-face, por exemplo, ganham novas funções nas mãos dos pequeninos - e cada cômodo da casinha é repleto de informações visuais curiosas, do quarto selvagem de Arrietty à oficina de seu pai.
Transmitindo uma eficaz mensagem sobre respeito ao próximo, O Mundo dos Pequeninos peca pela falta de sincronia inexplicável entre, especificamente, a boca da governanta e a voz de sua dubladora e pela evolução relativamente lenta e acomodada da narrativa, que não parece ter muita história a contar. Nada disso, entretanto, é capaz de comprometer mais um grande trabalho com o selo Ghibli de qualidade.



Kari-gurashi no Arietti, Japão, 2010 | Baseado no livro Os Pequeninos Borrowers, de Mary Norton. Roteiro de Hayao Miyazaki & Keiko Niwa | Dirigido por Hiromasa Yonebayashi | Com as vozes de Mirai Shida, Ryûnosuke Kamiki, Tomokazu Miura, Shinobu Ohtake, Kirin Kiki, Keiko Takeshita e Tatsuya Fujiwara.
No roteiro, escrito por Keiko Niwa e pelo veterano Hayao Miyazaki (que deixa a direção a cargo de Hiromasa Yonebayashi) com base no tradicional livro Os Pequeninos Borrowers, de Mary Norton, Sho (Ryûnosuke Kamiki) é um garoto que se muda para a casa da tia Sadako (Keiko Takeshita) para repousar antes de se submeter a uma delicada cirurgia cardíaca. Durante a estadia no local, o rapaz descobre que uma família de colhedores - pessoas pequeninas que se sustentam surrupiando suprimentos dos humanos - vive acuada debaixo do assoalho da casa, temendo as consequências que o contato com os grandões pode acarretar para seu povo. Garoto de bom coração (não, claro, no sentido literal), Sho consegue amolecer aos poucos a postura defensiva da colhedora adolescente Arrietty (Mirai Shida) e acaba ajudando a família da garota a se esquivar da xereta governanta Haru (Kirin Kiki).
Como já mencionado, o apelo visual e o preciosismo técnico de O Mundo dos Pequeninos são arrebatadores: a animação em tradicional 2D (recorrendo pontualmente ao 3D, como em travellings) dos estúdios Ghibli evoca com maestria a tridimensionalidade daquele universo e abraça várias das técnicas cinematográficas comuns ao live action, como mudanças de iluminação (repare a cena em que Arrietty e seu pai caminham por um ambiente escuro com um lampião) ou profundidades de campo distintas. Além disso, a fluidez e a expressividade da animação ainda impressionam - e Yonebayashi acerta ao manter-se predominantemente na altura dos pequeninos, registrando aquele mundo pela perspectiva de sua protagonista, Arrietty (o que vale também para o desenho de som, que amplia ruídos menos perceptíveis para humanos). E a direção de arte impressiona pela concepção do mundo dos colhedores a partir de uma série de soluções interessantes e criativas: relógios de pulso, alfinetes e fitas dupla-face, por exemplo, ganham novas funções nas mãos dos pequeninos - e cada cômodo da casinha é repleto de informações visuais curiosas, do quarto selvagem de Arrietty à oficina de seu pai.
Transmitindo uma eficaz mensagem sobre respeito ao próximo, O Mundo dos Pequeninos peca pela falta de sincronia inexplicável entre, especificamente, a boca da governanta e a voz de sua dubladora e pela evolução relativamente lenta e acomodada da narrativa, que não parece ter muita história a contar. Nada disso, entretanto, é capaz de comprometer mais um grande trabalho com o selo Ghibli de qualidade.




Kari-gurashi no Arietti, Japão, 2010 | Baseado no livro Os Pequeninos Borrowers, de Mary Norton. Roteiro de Hayao Miyazaki & Keiko Niwa | Dirigido por Hiromasa Yonebayashi | Com as vozes de Mirai Shida, Ryûnosuke Kamiki, Tomokazu Miura, Shinobu Ohtake, Kirin Kiki, Keiko Takeshita e Tatsuya Fujiwara.