
por Eduardo Monteiro


Identity Thief, EUA, 2013 | Duração: 1h51m27s | Lançado no Brasil em 10 de Maio de 2013, nos cinemas | História de Jerry Eeten e Craig Mazin. Roteiro de Craig Mazin | Dirigido por Seth Gordon | Com Jason Bateman, Melissa McCarthy, Amanda Peet, John Cho, Robert Patrick, Genesis Rodriguez, Tip 'T.I'. Harris, Morris Chestnut, Jon Favreau, Eric Stonestreet, Mary-Charles Jones, Maggie Elizabeth Jones, Ben Falcone e Ellie Kemper.
Dirigido por Seth Gordon (Quero Matar Meu Chefe) a partir do roteiro de Craig Mazin (Se Beber, Não Case! Parte II), o filme já começa com Sandy Patterson (Jason Bateman) caindo no golpe que, mais adiante, o levaria ao encontro de Diana - cena introdutória que diverte graças ao tom exageradamente solícito da mulher do outro lado da linha telefônica. Depois que a ladra de identidades vivida por McCarthy estoura o limite do cartão de crédito de Sandy, o homem passa a ser acusado de fraude e, em decorrência das burocracias em torno da jurisdição de forças policias sediadas em localidades diferentes, se vê obrigado a partir rumo à Flórida, capturar a criminosa, entregá-la à polícia do Denver e limpar o próprio nome para salvar seu emprego. Porém, Diana não é uma mulher fácil de ser detida e, pra piorar, passa a ser seguida pelos perigosos Julian (Tip 'T.I.' Harris) e Marisol (Genesis Rodrigues, de O Último Desafio), que pretendem fazer um acerto de contas com a fraudadora em função de serviços mal executados.
Com isso, Sandy e Diana se veem compelidos a unir forças para escapar dos bandidos - e é nesse ínterim que o roteiro de Mazin apresenta sua completa falta de confiança na inteligência do público. Antes de mais nada, o roteirista tenta de forma trôpega justificar a frágil e preguiçosa estrutura de road movie que o filme assume: a dupla conclui que não poderia embarcar em um avião porque ambos possuem o mesmo nome - e caso não estivéssemos falando de uma ladra de identidades (observe bem: identidades, no plural) e sua vítima, a justificativa até faria algum sentido. Isso sem mencionar, é claro, a inconsistência do acordo entre os personagens: embora Diana explique a certa altura que foi atraída pela possibilidade de fazer uma viagem sem custos, não há qualquer razão plausível para que a mulher aceite de bom grado ter que assumir sua bandidagem em uma cidade onde é procurada pela justiça - e Patterson chega até mesmo a encostar o carro na beira da estrada a pedido da mulher no início da viagem, o que não faz sentido e serve apenas para gerar uma cena engraçadinha no acostamento. Para completar, o caçador de recompensas vivido por Robert Patrick entra no rastro da dupla a partir de uma informação ilógica: como Diana passou o cartão de Sandy no salão de beleza se este já havia sido bloqueado?

Mas a fragilidade do texto de Mazin não para por aí - e qualquer um que tente justificar estes problemas com base nas baixas exigências do gênero está automaticamente subestimando a capacidade intelectual do público de comédias. Da mesma forma que a montagem da sede do novo emprego de Sandy merece nota pela agilidade descomunal (entre o surgimento da proposta de criar uma empresa do zero e sua realização, parece se passar no máximo alguns dias), a permanência de Julian, Marisol e do caçador de recompensas no encalço da dupla central é sustentado por coincidências ofensivas: depois que Sandy e Diana capotam um furgão na estrada, os capangas passam pelo local do acidente justamente no instante em que uma testemunha dá o exato depoimento que os criminosos precisavam ouvir. Além disso, o roteirista abusa das liberdades oferecidas pela estrutura de road movie para inserir episódios que prolongam desnecessariamente a narrativa, como a passagem dos personagens por uma mata - que, aliás, ressalta outro problema do roteiro, que é o hábito de propor soluções demasiadamente fáceis para certos eventos: um atropelamento impactante, um capotamento cinematográfico e uma picada de cobra no pescoço são superados sem maiores complicações.
Entretanto, a grande surpresa de Uma Ladra Sem Limites é o trabalho razoavelmente competente de McCarthy, Gordon e Mazin na composição da ladra de identidade. Embora precise atravessar uma infinidade de convenções do gênero, Diana torna-se uma personagem suficientemente interessante na reta final: deixando para trás o trabalho vocal propositalmente irritante, McCarthy se desvencilha da persona odiosa do começo do filme e consegue conferir profundidade à personagem ao expor seu passado ingrato - e, nesse momento, a opção de roubar identidades torna-se bastante emblemática, bem como o impulso (quase patológico) de adquirir itens repetidos e empilhá-los em sua casa, que parecem tentar preencher o vazio emocional de sua existência. E a atriz faz um bom trabalho: a caricatura exagerada e autoconfiante do início é aos poucos despida, deixando sua verdadeira face à mostra na cena em que sofre bullying em um salão de beleza ou, momentos mais tarde, quando caminha com certo acanhamento por um restaurante.
Com um elenco dominado por nomes oriundos de séries cômicas da TV (Jason Bateman, de Arrested Development, Melissa McCarthy, de Mike & Molly, John Cho, de Go On, Eric Stonestreet, de Modern Family, e Ellie Kemper, de The Office), Uma Ladra Sem Limites parece acertar no aspecto mencionado no parágrafo anterior quase que por acidente - e a forma melodramática, óbvia e pouco sutil como os eventos do desfecho são construídos (repare o vácuo emocional do diálogo entre as personagens de Melissa McCarthy e Amanda Peet) comprovam que muito refinamento seria necessário para que a comédia se tornasse digna de atenção.
