
por Eduardo Monteiro


Oz: The Great and Powerful, EUA, 2013 | Duração: 2h10m17s | Lançado no Brasil em 8 de Março de 2013, nos cinemas | Baseado no romance "O Maravilhoso Mágico de Oz", de L. Frank Baum. Roteiro de Mitchell Kapner e David Lindsay-Abaire | Dirigido por Sam Raimi | Com James Franco, Michelle Williams, Mila Kunis, Rachel Weisz, Zach Braff, Joey King, Tony Cox, Abigail Spencer e Bruce Campbell.
Graças a Batman Begins, lançado em 2005, a produção de filmes sobre gênese de personagens famosos ou prequels de histórias conhecidas ganhou uma força considerável. Produzido mais de sete décadas após o lançamento do clássico O Mágico de Oz, Oz: Mágico e Poderoso está inserido nessa tendência e é o resultado de um projeto obviamente impulsionado pelo sucesso surpreendente (até mesmo para os produtores, podemos supor) de Alice no País das Maravilhas - e basta resgatar notícias da produção de meados do primeiro semestre de 2010 para comprovar esta influência. E de fato, o novo filme de Sam Raimi (Homem-Aranha) divide uma série de características com o de Tim Burton - incluindo, infelizmente, a carência de êxitos narrativos.
Escrito por Mitchell Kapner (Meu Vizinho Mafioso) e David Lindsay-Abaire (Coração de Tinta, A Origem dos Guardiões) com base no romance O Maravilhoso Mágico de Oz, de L. Frank Braum, o filme é iniciado no circo itinerante em que o ilusionista Oscar (James Franco), ou simplesmente Oz, apresenta seu pouco badalado espetáculo em troca de pagamentos miseráveis. Mulherengo e paquerador, Oz se torna alvo da explosão de ciúmes de um brutamontes da trupe circense e se vê obrigado a fugir do local em um balão que, sugado por um tornado, acaba precipitando na fantasiosa Terra de Oz. Enxergando em uma antiga profecia a possibilidade de poder e riqueza, o protagonista faz todos acreditarem em suas irreais habilidades mágicas e acaba envolvido no conflito das bruxas daquele terra.
Adotando uma lógica visual que remete ao clássico de 1939, Oz: Mágico e Poderoso reserva a profusão de cores para a etapa ambientada no universo fantasioso e adota, nos momentos iniciais da projeção, uma fotografia monocromática com a janela reduzida (1.33:1) que, embora recrie com certa competência a atmosfera de filmes antigos (de modos distintos, Abigail Spencer e Michelle Williams contribuem nesse aspecto com expressividades apropriadíssimas), está também sujeita a distrações, graças ao uso das tarjas pretas laterais para realçar o efeito tridimensional de objetos saindo da tela (algo que Ang Lee também fez em uma cena específica de As Aventuras de Pi). Trabalhando pela primeira vez com 3D, Sam Raimi demonstra certa imaturidade ao se render a clichês típicos da técnica, como os objetos que frequentemente despontam na direção da câmera (em determinado momento, acompanhamos uma revoada de lanças pela menos favorecida perspectiva: a dos alvos) ou a câmera subjetiva que segue Oz despencando desenfreado por uma correnteza.
Investindo novamente em cenários predominantemente digitais, o design de produção de Robert Stromberg (responsável por Avatar e Alice no País das Maravilhas - e premiado com o Oscar por ambos) cria paisagens e cenários deslumbrantes que, eventualmente, pecam pelo excesso de CGI (repare a perceptível substituição dos atores por modelos digitais bem menos desenvoltos quando a câmera se afasta da ação), cuja qualidade encontra-se em um meio termo indefinido entre a estilização exacerbada de Speed Racer e o realismo de Avatar - chegando a algo bem próximo de Alice no País das Maravilhas. Por outro lado, as criaturas digitais são bastante satisfatórias, desde o expressivo macaco alado Finley (Zach Braff) até a frágil e melancólica Boneca de Porcelana (Joey King), dona de uma textura impecável e uma doçura tocante. Por fim, a maquiagem e os figurinos deixam sutilezas de lado e não se intimidam em exaltar a personalidade dos personagens: as roupas de Theodora (Mila Kunis), por exemplo, dificultam que o espectador a enxergue com bons olhos, enquanto a maquiagem da Bruxa Má do Oeste, embora dotada do preciosismo técnico atual, mantém-se fiel à essência daquela concebida para o filme da década de 30 - isto é, marcada por feições caricatas e um tom de verde uniforme e indiscreto.

Aliás, discrição e verossimilhança não são palavras de ordem na abordagem de Sam Raimi - o que, claro, é compreensível e compatível com o tom fabulesco e fantasioso adotado. O problema, entretanto, é utilizar essa liberdade como pretexto para um desenvolvimento preguiçoso e personagens pouco cativantes: embora confira a Glinda serenidade e sabedoria irrepreensíveis, a bela Michelle Williams (Namorados Para Sempre) é prejudicada pela falta de evolução e pelo papel de mocinha indefesa que é obrigada a assumir no terceiro ato do longa, enquanto Mila Kunis (Ted), responsável pela figura submetida às transformações mais extremas, é sabotada por sua própria voz (inapropriada para as duas fases de sua personagem) e pelo feitiço da unidimensionalidade, que transforma Theodora em uma vilã definida unicamente por sua vilania. Felizmente, sobra alguma sobriedade para o personagem-título: vivido com algum carisma e pouca vivacidade por James Franco, Oz é um garanhão egoísta cujo sincero desejo de ser um grande homem encontra, na terra que leva seu nome, possibilidades palpáveis de ser realizado - e, obviamente, há enormes lições de moral por trás da bravura, do altruísmo e das relações que o personagem desenvolve com os companheiros ao longo da trama. Surpreendentemente, o diretor alcança imensa sensibilidade na abordagem da Boneca de Porcelana (dublada pela jovem e promissora Joey King, de Ramona e Beezus), cuja pequenez e inerente fragilidade física reflete sua condição emocional e conquista, de imediato, a compaixão do público.
Retornando à função quatro anos após seu último trabalho, o diretor tenta sem grande sucesso evocar grandiosidade através de planos gerais e travellings desinteressantes pelos cenários digitais e peca também pelas variações bruscas de tom: momentos de extrema leveza e do mais absoluto (e até vergonhoso) pastelão (como a gag envolvendo o quase afogamento de Oz em um curso d'água raso, que já deveria estar sepultada desde os episódios de Chaves ambientados em Acapulco) dividem espaço com passagens em que Raimi sente necessidade de regressar às suas origens de terror e faz o espectador saltar da cadeira com sustos repentinos, ao invés de criar uma atmosfera eficaz que leve o espectador a temer pelo destino dos personagens (isso sem mencionar, claro, as soluções fáceis encontradas para determinadas enrascadas, como o encurralamento à beira de um precipício). E mesmo que o extremamente batido discurso motivacional de Oz para seu "exército" aborreça profundamente, os confrontos transcorridos no terceiro ato se destacam por dar fim às tentativas de conferir relevância à trama e partir pra ação, cujo espetáculo de ilusões reflete e homenageia a própria arte de se fazer Cinema.
Perdendo incomensuráveis pontos pela trilha de Danny Elfman, compositor que, com raras exceções, tem se repetido cada vez mais ao longo dos anos, Oz: Mágico e Poderoso é uma decepcionante e potencial mina de ouro - e diferentemente de certo personagem do filme, os produtores sim deverão partir em seus balões com os bolsos cheios de moedas de ouro, deixando-nos imersos em desapontamento.
