29 de março de 2013

Crítica | Jack - O Caçador de Gigantes

Nicholas Hoult em JACK - O CAÇADOR DE GIGANTES (Jack the Giant Slayer)

por Eduardo Monteiro

Jack the Giant Slayer, EUA, 2013 | Duração: 1h53m56s | Lançado no Brasil em 29 de Março de 2013, nos cinemas | História de Darren Lemke & David Dobkin. Roteiro de Darren Lemke e Christopher McQuarrie e Dan Studney | Dirigido por Bryan Singer | Com Nicholas Hoult, Eleanor Tomlinson, Ewan McGregor, Bill Nighy, Stanley Tucci, Ian McShane, Eddie Marsan, Ewen Bremner, Christopher Fairbank, Simon Lowe, Mingus Johnston, Ralph Brown e Warwick Davis.

Pôster nacional e crítica de JACK - O CAÇADOR DE GIGANTES (Jack the Giant Slayer)
Não me parece absurda, a ideia de contos clássicos serem desprovidos de grandes ações. Não creio que lutas, disputas e embates favoreçam a concisão desse tipo de narrativa, as lições e mensagens pretendidas pelos autores ou mesmo a transmissão oral dessas histórias. No Cinema, entretanto, a situação é outra: transformar um conto trivial em uma narrativa audiovisual de duas horas demanda diversas adaptações de linguagem e conteúdo - e o Cinema de entretenimento, nos últimos anos, tem apostado pesado em superproduções que reimaginem contos clássicos e os insiram em uma embalagem de ação.

Mas longas como Branca de Neve e o Caçador ou João e Maria - Caçadores de Bruxas (notem a recorrência da figura do Caçador) provam que não tem dado muito certo. E Jack - O Caçador de Gigantes parecia seguir pelo mesmo caminho: adiamentos severos, críticas desfavoráveis e um orçamento infladíssimo sendo descompensado por bilheterias medíocres sugeriam um completo fracasso, comercial e artístico - mas o produto final prova, mais uma vez, que expetativas anteriores à sessão devem ser deixadas na porta de entrada da sala de cinema.

Dirigido por Bryan Singer (Operação Valquíria, Superman - O Retorno) a partir de um roteiro escrito e reescrito por Darren Lemke, David Dobkin, Dan Studney e Christophe McQuarrie (Jack Reacher - O Último Tiro) com base no conto de João e o Pé de Feijão, o filme introduz uma antiga rivalidade entre humanos do reino de Cloister e gigantes que habitam um espaço localizado entre o céu e a Terra, cuja trégua é garantida por uma coroa com poderes especiais e pela preservação, em local seguro, de um punhado de feijões mágicos capazes de criar uma ponte entre os dois mundos. Tratado pelo povo como uma lenda fantasiosa, o conflito vem à tona quando os tais feijões caem nas mãos (e mais tarde, caem das mãos) do camponês Jack (Nicholas Hoult) e a tal coroa cai nas graças do ambicioso e inescrupuloso Rodrerick (Stanley Tucci), que pretende usá-la para ascender ao poder. Em um dia chuvoso, um dos grãos de feijão é germinado e rapidamente dá origem a um enorme pé que, por acidente, acaba levando a princesa Isabelle (Eleanor Tomlinson) até a terra dos gigantes. Dessa forma, o Rei Brahmwell (Ian McShane, de Piratas do Caribe: Navegando em Águas Misteriosas) ordena que uma comitiva real, comandada por Elmont (Ewan McGregor, de O Impossível) e complementada por Jack, escale o pé de feijão para resgatar a garota.

Orçado em quase duzentos milhões de dólares, Jack - O Caçador de Gigantes possui uma enorme carga de efeitos visuais, que alcançam resultados diversos. Pra início de conversa, os gigantes não são dos mais convincentes - especialmente no que diz respeito às texturas, que jamais nos deixam esquecer que aqueles são personagens criados por computador. Por outro lado, a movimentação e a expressividade dos brutamontes são satisfatórias, não só graças ao uso da técnica de performance capture, como também pela decisão certeira de fazê-los agirem, na maior parte do tempo, em uma velocidade normal - uma predisposição rara (a maioria dos filmes opta por uma movimentação lenta, que visa equilibrar o conflito com os seres diminutos desfavorecidos) que Singer exalta no instante em que um gigante concede alguns segundos de vantagem em uma perseguição ao personagem de Eddie Marsan (Sherlock Holmes: O Jogo de Sombras), que assume uma dianteira vã.

Ewan McGregor, Eleanor Thomlinson e Nicholas Hoult em JACK - O CAÇADOR DE GIGANTES (Jack the Giant Slayer)

Aliás, o design de produção do longa também não faz feio e concebe paisagens e cenários curiosos e bastante convincentes - embora as grades perfeitamente transponíveis de uma gaiola gigante que aprisiona a princesa, por exemplo, surja como uma das falhas que diminuem os méritos da equipe. Por outro lado, o 3D raramente é usado com fins realmente interessantes - com destaque absoluto para os pontuais momentos em que a câmera assume o ponto de vista de algum gigante e enxergamos aquele mundo com uma profundidade irrepreensível, quase palpável.

Diferentemente do que ocorria na maioria das releituras anteriores, o roteiro de Jack - O Caçador de Gigantes não possui maiores amarras ou expectativas a cumprir em relação ao conto original e utiliza esta mobilidade para construir uma narrativa ligeiramente mais consistente, com uma evolução satisfatória e suficientemente bem amarrada. Infelizmente, aqui e ali o texto se rende a imbecilidades inexplicáveis, como a ótima relação dos personagens com o ar rarefeito, as flechas flamejantes cujas chamas sobrevivem ao contato com água, os múltiplos pés de feijão recém erguidos que desaparecem da paisagem em momento oportuno ou a demasiadamente longa e absurda disputa de cabo de guerra desenvolvida em torno dos portões de Cloister no terceiro ato. Por outro lado, o roteiro possui alguns acertos bobinhos que valem menção - como a determinação, a coragem e, sobretudo, a fragilidade do grupo de humanos diante de seus enormes oponentes sendo projetadas em um pequeno punhal, repassado entre personagens (nesse caso, desconsiderando completamente a cena em que o personagem de McGregor apanha a arma debaixo da água com os dentes e de ponta cabeça).

Com um bom elenco sabotado por subtramas aborrecidas e personagens desinteressantes (basta apontar que, como o morto-vivo de Meu Namorado é um Zumbi, Nicholas Hoult conseguia expressar muito melhor seus sentimentos amorosos), Jack - O Caçador de Gigantes é uma rara releitura eficiente de um conto clássico que, graças aos insatisfatórios resultados comerciais, ironicamente, pode representar um passo gigante rumo ao encerramento desse segmento.

JACK - O CAÇADOR DE GIGANTES (Jack the Giant Slayer)