20 de novembro de 2013

Crítica | Crô - O Filme

Alexandre Nero e Marcelo Serrado em CRÔ - O FILME


Crô - O Filme, Brasil, 2013 | Duração: 1h26m23s | Lançado no Brasil em 29 de Novembro de 2013, nos cinemas | Roteiro de Aguinaldo Silva | Dirigido por Bruno Barreto | Com Marcelo Serrado, Alexandre Nero, Carolina Ferraz, Kátia Moraes, Milhem Cortaz, Urzula Canaviri, Carlos Machado, Ivete Sangalo, Ana Maria Braga, Gaby Amarantos.

Pôster/capa/cartaz de CRÔ - O FILME
Algum tempo antes do desfecho da novela Fina Estampa, a imprensa especializada em spoilers televisivos (vulgo revistas de fofoca) levantou a hipótese de que o violento e homofóbico motorista Baltazar (Alexandre Nero) seria o amante misterioso do mordomo Crô (Marcelo Serrado) – o que justificaria de forma curiosa o comportamento agressivo do primeiro em relação ao colega de trabalho e à esposa, além de abrir espaço para discussões sociais pertinentes, atuais e, acima de tudo, bastante ousadas para os padrões conservadores da emissora. Infelizmente, após estender o mistério por meses, o autor Aguinaldo Silva decidiu, por falta de criatividade, de culhões ou simplesmente por birra em decorrência da revelação precoce de seus planos, não só manter a identidade do tal amante em segredo, como também riscar exclusivamente Baltazar da lista de suspeitos, em uma decisão desnecessária, despropositada e desonesta.

Não sei exatamente por que alimentei alguma esperança de que, inseridos em uma mídia menos limitante que a televisão brasileira, os personagens receberiam um tratamento mais sofisticado. Na realidade, o desperdício do potencial contido na relação da dupla seria perfeitamente perdoável caso o longa não fracassasse em absolutamente todos os seus incompatíveis e intragáveis esforços cômicos e dramáticos. Roteirizado pelo próprio Aguinaldo Silva e dirigido por Bruno Barreto (que já esteve à frente de produções tão variadas quanto o recente Flores Raras, Voando Alto, O Casamento de Romeu e Julieta e O Que é Isso, Companheiro?), Crô tem início com o personagem-título transitando de maneira desastrosa entre as carreiras de cantor, estilista e cabeleireiro após herdar a fortuna da ex-patroa vivida por Christiane Torloni no folhetim global e, consequentemente, ascender ao posto de patrão milionário. Sem conseguir definir um rumo satisfatório para sua agora luxuosa existência, Crô decide regressar ao posto de mordomo após ter alucinações com sua falecida mãe, uma sociopata vivida por Ivete Sangalo que convencera o filho, ainda muito jovem, que servir a deusas era sua razão de existir. Dessa forma, o protagonista abre um processo de seleção para encontrar uma candidata a patroa que se enquadre nos níveis desejados de sofisticação e crueldade – o que desperta o interesse da aspirante a socialite Vanusa (Carolina Ferraz), que comanda uma confecção clandestina onde mantém imigrantes ilegais sob condições escravas.

Carolina Ferraz em CRÔ - O FILME

Nessas estúpidas circunstâncias, uma narrativa com suposta predominância de comédia acaba abrindo espaço para intermináveis e deslocadas sequências que reiteram insistentemente a perversidade da vilã e acompanham o drama e as tentativas de uma jovem criança de fugir daquele ambiente opressivo, o que resulta em gravíssimos e inevitáveis problemas de tom e praticamente transformam o filme em um drama policial com eventuais intervenções cômicas. Como se não bastasse, Crô também possui sua parcela de problemas técnicos (marca registrada da recente leva de comédias nacionais enlatadas): relevando a falta de personalidade dos cenários ou a estranheza da inserção digital da cabeça de Serrado em um corpo de criança (que até pode ser perdoada, considerando que ocorre em uma cena de sonho), vale apontar o péssimo uso de sonoplastia para tentar gerar humor, o product placement invasivo (em determinada cena, o protagonista alivia um ataque de pânico ventilando um saco de papel que ostenta a marca de certa loja do ramo alimentício) e também a falta de cuidado com determinados objetos de cena (em certo momento, a supostamente robusta estátua da mãe de Crô balança visivelmente com um simples toque de algum dos atores, denunciando a leveza do material de que é feita).

E nem o talentoso Marcelo Serrado consegue se salvar: retornando ao papel cujo sucesso consagrou seu retorno à Rede Globo após anos trabalhando na concorrência, o ator é sabotado por um roteiro pedestre que transforma o razoavelmente simpático personagem em uma figura absolutamente desinteressante (e até um pouco abominável, em alguns momentos), cujas tiradas jamais despertam o riso e mais parecem endereçadas ao público herdado da novela, que já conhece os bordões que a atração levou meses para estabelecer na base da repetição. Enquanto isso, Carolina Ferraz opta pelo piloto automático para dar vida a uma personagem maquiavélica cuja crueldade é expressa de modos normalmente aborrecidos, como no momento em que a vilã decide cortar o cabelo da jovem Paloma (Urzula Canaviri), apenas pelo caráter invasivo e violento do ato. Para completar, ainda não sei dizer se a ausência de Milhem Cortaz no cartaz do filme é fruto de um pedido do ator para evitar o embaraço do envolvimento com o projeto ou se os produtores realmente acreditam que as participações da apresentadora Ana Maria Braga e da cantora Gaby Amarantos – interpretando versões ironicamente artificiais de si mesmas – possuem mais apelo que a presença do experiente ator.

Por fim, Alexandre Nero merece reconhecimento pela proeza de sugerir sutilmente o suposto interesse afetivo de Baltazar pelo protagonista através do nervosismo e da hesitação que constantemente afetam o comportamento agressivo do personagem. Infelizmente, os realizadores parecem acreditar que exibir seres humanos sendo psicologicamente violentados por uma mulher inescrupulosa é mais apropriado que trazer duas pessoas do mesmo sexo trocando carícias – e quando, próximo ao final da projeção, o filme se depara com a única chance de marcar pontos a seu favor (e, quem sabe, até mesmo consertar o equívoco citado no primeiro parágrafo deste texto), o conservadorismo do projeto vem à tona, conduz a narrativa a um desfecho ridículo e desperta no espectador a vontade furiosa de que figuras como Crô e Giovanni Improtta (outra criação de Aguinaldo Silva que migrou desastrosamente das telinhas para as telonas em 2013) retornem para a História da televisão, de onde nunca deveriam ter saído.

Marcelo Serrado e Carlos Machado em CRÔ - O FILME

22 de agosto de 2013

O maior inimigo dos blogueiros


Se você possui um blog, dedicado a qualquer assunto que seja, e realiza um bom trabalho, acredite: é apenas uma questão de tempo até que seu conteúdo seja plagiado - se é que já não foi, considerando que ocorrências como essa são difíceis de identificar e serviços como o Copyscape ou o Plagium, além de imprecisos e limitados, são pouco disseminados entre os colegas do meio. Movidos pela ideia errônea de que a internet é uma terra sem lei e estimulados pela impunidade, milhares de indivíduos se apropriam diariamente da propriedade intelectual alheia em busca de cliques, acessos e reconhecimento indignos - e quando eventualmente acabam sendo expostos, são capazes de assumir comportamentos impensáveis na tentativa de fintar as acusações e justificar seus atos.

Foi o caso, por exemplo, do plágio que identifiquei e expus em maio do ano passado, cometido por um sujeito que, responsável por mais de meia dúzia de apropriações indevidas de conteúdo, tentou, numa reação absurdamente esquizofrênica, transformar este que vos fala em uma espécie de psicopata, no intuito de desviar o foco da grave transgressão que vinha cometendo: fui acusado pelo dito cujo de ameaçá-lo de morte, uma inverdade óbvia, grave e que dispensa maiores comentários. Como se não bastasse, fui surpreendido pela inércia de vários colegas blogueiros, que só manifestaram abertamente o repúdio à atitude do plagiador depois que o caso foi amplamente divulgado, com a ajuda do crítico Pablo Villaça.

De lá pra cá, devo ter sido plagiado dezenas de vezes - e, provavelmente, jamais serei capaz de identificar todos os casos, embora dois deles tenham chamado particularmente minha atenção: no primeiro, minha crítica de Tudo Por um Sonho foi inteiramente reproduzida, pouco mais de seis horas após a publicação original, por um portal habituado a se apropriar de conteúdo sem autorização. Após dias tentando entrar em contato com os responsáveis sem obter qualquer tipo de resposta, optei por assumir uma postura extrema: passei a publicar comentários deselegantes (mas verdadeiros) a respeito da transgressão na fanpage do portal no Facebook. Resultado: em questão de minutos, fui contatado por um dos editores, que demonstrou uma dificuldade alarmante de compreender minha queixa, até que finalmente removeu a publicação. No segundo caso, um parágrafo inteiro do meu texto sobre Faroeste Caboclo foi indevidamente usado pelo jornal goiano Diário da Manhã - e, embora o editor da publicação tenha sido moderadamente atencioso em um primeiro momento, logo passei a ser ignorado e - o que é pior - a receber spam da empresa, que aparentemente enxergou em mim um potencial anunciante.

Todavia, o que me impulsionou a escrever novamente sobre o assunto foi um caso mais recente, cuja repercussão em uma fatia bastante representativa da chamada blogosfera me deixou particularmente espantado. Por circunstâncias que não vêm ao caso, descobri que o texto sobre A Estranha Vida de Timothy Green - um dos mais repercutidos do respectivo blog -, escrito pela colega e amiga Ana Clara Matta, do Ovo de Fantasma, havia servido de "inspiração" para algum blogueiro preguiçoso e picareta - em outras palavras, várias frases haviam sido inteiramente copiadas pelo autor e encaixadas em um texto supostamente original, sem qualquer tipo de discriminação, autorização ou crédito.

Seria apenas mais um caso desagradável caso o tal blog não integrasse a SBBC (Sociedade Brasileira de Blogueiros Cinéfilos), grupo que, como o próprio nome sugere, busca unir e, consequentemente, fortalecer e impulsionar autores brasileiros de blogs voltados para a sétima arte. Nessas circunstâncias, o colega Márcio Sallem, membro da tal SBBC, autor do Em Cartaz, vítima frequente de plágios e ferrenho defensor da propriedade intelectual, tomou a iniciativa de comunicar o ocorrido à direção da organização.

A resposta veio algum tempo depois - e foi justamente aí que o caso se tornou particularmente intrigante. Em comunicado emitido nos mecanismos internos do tal grupo, os líderes, como esperado, reconheceram a gravidade do ocorrido, mas preferiram preservar a identidade do transgressor, sugeriram que confiam na boa fé de seus integrantes e declararam que "(...) de agora em diante, na existência de provas concretas, o membro infrator será banido". Em resumo: para evitar constrangimentos tidos como desnecessários (algo de que discordo veementemente), a direção da Sociedade preferiu botar panos quentes no ocorrido, legitimando a atitude do sujeito ao desconsiderar punições imediatas e omitir sua identidade.

Antes de prosseguir, preciso enfatizar que, pessoalmente, não enxergo má fé maior que surrupiar deliberadamente frases inteiras de textos de terceiros e se colocar como autor delas - e compreendo perfeitamente a raiva e a impotência que Ana Clara expressou ao descobrir que seu trabalho havia sido afrontado. Além disso, é de se esperar que um indivíduo capaz de cometer este ato já o tenha feito anteriormente - algo que pude confirmar explorando brevemente o arquivo do tal blog, que inclui, por exemplo, um texto repleto de trechos extraídos de uma crítica do filme Lincoln publicada pelo Omelete, que aparentemente passou batido pelo controle rigoroso de conteúdo defendido sistematicamente pela direção da SBBC.

Nenhum comunicado público foi emitido pela organização até o momento - e, pra piorar, a posição firme de Márcio vem sendo encarada como exagerada, desnecessária e desrespeitosa por outros membros, incluindo, vejam só, o próprio infrator. Nos bastidores, a alegada tempestade em copo d'água criada por Sallem é defendida com exemplos grandiosos (como o suposto plágio sofrido pelo escritor brasileiro Moacyr Scliar, cujo Max e os Felinos teria servido de inspiração para o livro que deu origem ao longa As Aventuras de Pi), na expectativa de que as destoantes ordens de grandeza diminuam a gravidade do caso corrente.

A triste realidade é que, quando um grupo supostamente criado para unir e defender os blogueiros legitima um ataque deliberado e comprovado ao trabalho de uma colega, eu, Ana, Márcio e todos os companheiros mais esclarecidos nos deparamos com motivos mais que suficientes para ficarmos severamente preocupados.


UPDATE (25/08/2013 - 15:00):

A maior alegria de escrever um blog sobre Cinema não vem das estatísticas de acesso, da possibilidade de me aproximar de uma arte que amo ou da comodidade de assistir aos últimos lançamentos gratuita e antecipadamente. O que há de mais compensador nessa atividade, na realidade, é o privilégio que tenho de me rodear de pessoas extraordinárias: em maior ou menor grau, tive a chance de conhecer e interagir com pessoas como Pablo Villaça, Tullio Dias, Ana Clara Matta, Virgílio Souza, Marcelo Seabra, João Marcos Flores, Márcio Sallem, Andrey Lehnemann, Ana Lúcia Andrade, Arthur Melo e Elton Telles - e, se tudo der certo, ainda terei o prazer de ser apresentado a outros tantos.

Naturalmente, fui induzido a criar a ilusão de que a gama de características que admiro nesses indivíduos fosse compartilhada pelo montante dos colegas - e, justamente por essa razão, foi particularmente frustrante ler uma série de mensagens deselegantes de alguns deles ao longo dos últimos dias, cujo conteúdo não se encaixa no padrão de excelência estabelecido pelo grupo de pessoas citado acima. Desde a publicação dessa postagem, há exatas 72 horas, li diversos ataques ao conteúdo desse texto, homogeneamente pobres na contra-argumentação.

De modo resumido, alguns dos nomes ligados à produção e à divulgação desse texto foram associados a barbáries das mais diversas, que vão de defasagens éticas ao excesso de pelos nas nádegas. No que diz respeito ao caso propriamente dito, algumas novidades foram lançadas em meio a diálogos truncados - como, por exemplo, que a punição à transgressão envolveu a retirada do conteúdo indevido do ar, decisão instintiva que pouco altera o teor do tratamento recebido pelo plagiador por parte da direção da SBBC. (Abro aqui um parêntese para apontar que, como um ser minimamente pensante, compreendo que uma decisão da SBBC possui peso meramente simbólico. As satisfações em relação ao ocorrido deveriam ser dadas pelo infrator à justiça, caso a(s) vítima(s) - respaldada(s) pela lei - se sentisse(m) impelida(s) a levar o caso adiante).

O texto acima foi redigido justamente porque, pessoalmente, discordo energicamente da decisão e senti vontade de tornar pública minha preocupação com relação à mentalidade assumida pelos responsáveis (e aproveito a oportunidade para desfazer uma colocação infeliz: no último parágrafo, deixei subentendido que a SBBC como um todo havia legitimado a ação do plagiador, enquanto gostaria de ter me referido apenas à direção e àqueles que concordaram com a decisão. Não foi intencional. Perdoem-me). Outro texto semelhante poderia ser redigido por uma pessoa que concorda com o veredito da SBBC, e, com os dois pontos de vista expostos, teríamos algo conhecido como discussão. Entretanto, continuamos sem um posicionamento oficial da liderança do grupo (a rigor, nem mesmo a resolução do caso foi oficialmente divulgada); as poucas manifestações ponderadas - contrárias ou não - feitas por alguns de seus membros podem ser lidas nos comentários dessa postagem.

Os canais de comunicação do Cinema Sem Erros continuam abertos à exposição de quaisquer pontos de vista.

UPDATE FINAL: Julguei prudente remover os registros de algumas das grosserias citadas nos últimos parágrafos. Além disso, em comunicado publicado em 7 de Outubro, a SBBC finalmente se pronunciou sobre o ocorrido. Para ler o texto, clique aqui.

14 de julho de 2013

O Recomeço

Brian Presley em O RECOMEÇO (Touchback)

O mesmo touchdown que garantiu ao time de futebol americano colegial da pequena cidade de Coldwater uma importante vitória no campeonato estadual também rendeu a seu capitão e quarterback, o atleta Scott Murphy (Brian Presley), uma grave fratura em uma das pernas, sepultando instantaneamente seu sonho de seguir a carreira esportiva. Vinte anos mais tarde, Scott é um homem barrigudo de meia idade que vive com a esposa Macy (Melanie Lynskey) e suas duas filhas em uma propriedade rural e enfrenta uma crise financeira que se transforma em um verdadeiro inferno astral: ao mesmo tempo em que o banco anuncia que irá leiloar as terras para quitar dívidas da família, uma fina camada de geada ameaça todo um lote de feijão, principal fonte de renda do sujeito - e quando ele finalmente consegue alugar uma colheitadeira e caminhar rumo à solução dos problemas, uma tora perdida na plantação empena o equipamento, exponenciando os prejuízos. Desesperado, o personagem decide tirar a própria vida, tendo em mente a quantia em dinheiro que seria encaminhado à mulher e às garotas por seu seguro de vida.

Nessas circunstâncias, Scott é misteriosamente transportado de volta à juventude e recebe a chance de reviver os momentos de glória anteriores ao fatídico jogo que encerrou sua carreira esportiva. Escrito e dirigido por Don Handfield, O Recomeço se estabelece como uma espécie de releitura moderna do clássico A Felicidade Não Se Compra que, entretanto, concentra-se principalmente na etapa em que o protagonista tem a chance de reavaliar as atitudes pretéritas que influenciaram de forma decisiva seu presente. Assim, o texto de Handfield cria uma interessante área de manobra que expande os horizontes dramáticos do longa de forma curiosa: além do óbvio contentamento de Scott por voltar à ativa no esporte que ama, o roteiro exalta a imaturidade inerente ao ambiente escolar ao trazer uma mente madura assumindo o controle de sua versão jovem, criando um choque imediato entre o caráter do adulto e a presunção do adolescente.

Para completar, O Recomeço também é hábil ao estabelecer a importância de pequenos eventos na trajetória pessoal de um indivíduo: embora Scott não perceba em um primeiro momento, a consciência de que Macy viria a se tornar o grande amor da sua vida não só é insuficiente para que os então jovens desconhecidos se aproximem, como também pode comprometer o futuro de ambos como casal. Assim, o drama se aprofunda na importância das escolhas diárias na vida de qualquer pessoa, transformando este pouco conhecido e por vezes problemático drama em uma obra que merece alguma atenção.

★★★

Touchback, EUA, 2011 | Roteiro de Don Handfield | Dirigido por Don Handfield | Com Brian Presley, Melanie Lynskey, Kurt Russell, Marc Blucas, Sarah Wright, Christine Lahti, Kevin Covais, Sianoa Smit-McPhee, Drew Powell.

23 de junho de 2013

Curta | The Big Shave

Peter Bernuth em THE BIG SHAVE

Que atire a primeira pedra o homem que nunca cortou o rosto no ato de barbear. Escrito e dirigido pelo jovem Martin Scorsese em 1967, The Big Shave é uma divertida crônica sobre os contratempos de um dos mais emblemáticos hábitos do universo masculino.

Aberto com planos-detalhes que ressaltam a assepsia de um banheiro, o curta exibe um jovem rapaz se barbeando sem maiores ocorrências (a espuma que quase entra no ouvido talvez seja o maior aborrecimento enfrentado pelo personagem). Entretanto, quando o homem resolve repetir o processo para deixar a barba mais rente, a coisa muda de figura - e Scorsese é hábil ao revelar a gravidade dos ferimentos gradativamente, valendo-se de ângulos, movimentos de câmera e zooms estratégicos. O mais divertido, porém, é a indiferença do homem diante da feridas - uma óbvia hipérbole da banalização dos cortes, que parecem algo extremamente inerente e comum para muitos homens.

The Big Shave, EUA, 1967 | Escrito por Martin Scorsese | Dirigido por Martin Scorsese | Com Peter Bernuth.

22 de junho de 2013

A Filha do Meu Melhor Amigo

Hugh Laurie e Leighton Meester em A FILHA DO MEU MELHOR AMIGO (The Oranges)

Não me recordo de ter assistido no cinema a algum filme cujos erros de continuísmo chamaram tanto minha atenção quanto os de A Filha do Meu Melhor Amigo. De Hugh Laurie fechando uma mesma garrafa duas vezes, passando pelas incontáveis variações de preenchimento ou posição de pratos e copos até o balde de gelo que surge fechado em um plano e aberto no contra-plano, as falhas talvez tenham despertado minha atenção não necessariamente pela quantidade ou pelo caráter explícito das aparições; é bem possível que a mediocridade da narrativa tenha perdido minha concentração para esses problemas técnicos da produção.

Escrito pelos estreantes Ian Helfer e Jay Reiss, A Filha do Meu Melhor Amigo já começa a decepcionar graças à dificuldade de estabelecer seu protagonista. A princípio, a narração de Alia Shawkat dá a entender que iremos acompanhar a história pela ótica de Vanessa, filha de David (Hugh Laurie) e Paige (Catherine Keener) - o que jamais se confirma. Já para a distribuidora brasileira do filme, a história gira em torno do personagem de Hugh Laurie - algo explicitado pelo uso do pronome possessivo "meu" na tradução genérica do título. Entretanto, é a tal garota vivida por Leighton Meester que influencia um maior número de personagens, embora a impressão de que ela é apenas mais uma peça daquela trama também seja deixada no ar. Assim, a história de duas famílias vizinhas e amigas que se desentendem depois que o patriarca de uma se envolve com a herdeira da outra torna-se bastante enfadonha e dispersiva.

Além disso, o relacionamento que sustenta a premissa jamais convence: a química entre Hugh Laurie e Leighton Meester é extremamente problemática, especialmente porque a garota não consegue se desvencilhar de uma aura de imaturidade que a assombra. Assim, a comédia dramática acaba desperdiçando a chance de estudar os desdobramentos de relacionamentos delicados como aquele, apostando em resoluções preguiçosas que apenas diminuem os méritos da produção e aumentam a visibilidade dos erros de continuísmo.

★★

The Oranges, EUA, 2012 | Roteiro de Ian Helfer e Jay Reiss | Dirigido por Julian Farino | Com Hugh Laurie, Leighton Meester, Alia Shawkat, Oliver Platt, Allison Janney, Catherine Keener, Adam Brody, Sam Rosen.

21 de junho de 2013

Crítica | O Lugar Onde Tudo Termina


★★★

The Place Beyond the Pines, EUA, 2012 | Duração: 2h20m10s | Lançado no Brasil em 21 de Junho de 2013, nos cinemas | História de Derek Cianfrance e Ben Coccio. Roteiro de Derek Cianfrance e Ben Coccio e Darius Marder | Dirigido por Derek Cianfrance | Com Ryan Gosling, Bradley Cooper, Eva Mendes, Dane DeHaan, Ben Mendelsohn, Mahershala Ali, Ray Liotta, Emory Cohen, Rose Byrne, Bruce Greenwood, Robert Clohessy.

Pôster/cartaz/capa nacional e crítica de O LUGAR ONDE TUDO TERMINA (The Place Beyond the Pines)
Nem todo mundo está preparado para assistir a um filme como, por exemplo, A Garota Morta: fugindo de estruturas convencionais, o ótimo drama de Karen Moncrieff propunha um belo estudo de personagens a partir de cinco pequenas narrativas que, embora relacionadas em diferentes graus à fatalidade sugerida pelo título, funcionavam bem de forma independente. Da mesma forma, muitos estarão despreparados para a proposta de O Lugar Onde Tudo Termina, um longo drama cuja narrativa, embora linear e centrada em uma mesma cadeia de eventos, tem o foco drasticamente alterado em duas ocasiões - o que, infelizmente, não é completamente bem sucedido.

Escrito por Ben Coccio, Darius Marder e pelo diretor Derek Cianfrance (Namorados Para Sempre), o filme nos apresenta a Handsome Luke (Ryan Gosling, de Tudo Pelo Poder), um habilidoso motoqueiro que decide se estabelecer em Schenectady, no estado de Nova York, depois de descobrir a existência de um filho bastardo, fruto do envolvimento com a garçonete Romina (Eva Mendes) em uma passagem anterior pela cidade do parque itinerante em que o homem trabalha. Na tentativa imediatista de se tornar um pai provedor e, com isso, convencer a mulher a largar o atual parceiro, o personagem lança mão de suas habilidades com motocicletas para assaltar bancos da região. Entretanto, a história muda de rumo quando o policial Avery (Bradley Cooper, de Se Beber, Não Case! Parte II) cerca Luke durante uma de suas fugas.

Uma mudança de rumo, vale ressaltar, bastante drástica e literal - e não leia o restante do texto caso rejeite revelações aprofundadas sobre certas escolhas dos realizadores. Por um lado, a decisão ousada de Cianfrance, Coccio e Marder funciona bem: a frustração que alimentamos com a saída de cena precoce do personagem de Ryan Gosling e a obrigação de seguir adiante, deixando para trás todas as expectativas que criamos em torno daquela trama, refletem a natureza abrupta da própria morte e resultam em uma descompensação curiosa, que pode ser sentida quando somos levados a acompanhar de perto um personagem que acabamos de conhecer e sobre quem nada sabemos. Com isso, os realizadores criam para si mesmos um enorme desafio: despertar no espectador o interesse pela nova trama e comprovar a relevância daquela quebra para o conjunto da obra.

Bradley Cooper em O LUGAR ONDE TUDO TERMINA (The Place Beyond the Pines)

E é aí que O Lugar Onde Tudo Termina começa a decair. Os conflitos morais do jovem e inexperiente policial vivido por Bradley Cooper possuem um enorme potencial que o roteiro falha em explorar de forma mais ampla - e nem mesmo recorrer novamente à quebra de expectativas em seu desfecho consegue elevar o segundo terço a um patamar que faça jus à etapa anterior da narrativa. Assim, o impasse entre Avery e policiais corruptos é resolvido em um piscar de olhos e, quando nos damos conta, estamos quinze anos no futuro acompanhando o então adolescente filho de Luke, Jason (Dane DeHaan, de Poder Sem Limites), às vésperas de um absurdo e improvável encontro com o filho de Avery, AJ (Emory Cohen).

Aliás, esta última fase da narrativa chama atenção pelo abuso de alegorias - como as rimas entre os comportamentos de Luke e Jason (repare como a fuga do garoto depois de furtar uma farmácia remete ao método de assalto do pai), estupidamente profetizadas pelo personagem de Ryan Gosling no primeiro terço da projeção (ora, relacionar as transgressões do rapaz à falta de uma figura paterna é um grande equívoco, já que Jason fora criado desde o nascimento pelo padrasto). Além disso, essa terceira parte também falha em resgatar novamente a atenção e o interesse do público: os prejuízos do avanço de quinze anos para o ritmo do filme e a relação aborrecida e esquemática entre AJ e Jason comprometem até mesmo a amarração de certos temas, sabotados pela diluição das discussões (como a cena no tal local sugerido pelo título).

Trazendo ainda Ryan Gosling interpretando um homem durão e problemático com a competência habitual, Eva Mendes abraçando com talento a angústia de Romina, Bradley Cooper correto como um policial imaturo que ingressa na política e Rose Byrne (Missão Madrinha de Casamento) surpreendente como uma mulher sutilmente torturada pelo casamento, O Lugar Onde Tudo Termina é um drama que, embora disponha de aproximadamente três quartos de hora para desenvolver cada uma de suas tramas, parece resolvê-las de forma apressada e falha em relacioná-las de modo a estabelecer uma unidade narrativa e temática.

Dane DeHaan e Emory Cohen em O LUGAR ONDE TUDO TERMINA (The Place Beyond the Pines)

20 de junho de 2013

Chimpanzé

CHIMPANZÉ (Chimpanzee)

Lançado pela DisneyNature - selo da empresa do Mickey Mouse dedicado a documentários sobre a natureza -, Chimpanzé se debruça sobre as peculiaridades da espécie de primatas a partir da rotina do pequeno Oscar, que precisa aprender todos os hábitos dos mais experientes e conviver com as adversidades que eventualmente atingem o bando. Narrado por Tim Allen, o filme tenta transformar o material captado na selva em uma narrativa demasiadamente bem demarcada, apostando na relevância dramática de um conflito com um bando rival que estoura no clímax.

Assim, os documentaristas estabelecem, por exemplo, que este segundo grupo de chimpanzés encontra-se à direita do território do bando que acompanhamos, de modo que a movimentação dos inimigos é muitas vezes vista com certo distanciamento e pouca clareza (pela dramaticidade da composição, que sugere que os chimpanzés estão espreitando o grupo principal) e da direita para a esquerda - e é impossível afirmar que todas as imagens respeitam a lógica de tempo e espaço (as chances de a montagem ter orquestrado várias das situações são enormes), ou mesmo que separem rigorosamente os animais de bandos rivais, já que, para o espectador comum, todos os espécimes são praticamente idênticos. Para completar, o fatídico confronto entre os chimpanzés irrita não só pela narração agitada, como também pela trilha sonora idem.

CHIMPANZÉ (Chimpanzee)

Além disso, a antropomorfização excessiva dos animais causa grande incômodo: embora várias descrições dos comportamentos do grupo pareçam de fato refletir seus instintos naturais, a especificidade de muitos sentimentos descritos extrapolam o limite do bom senso. Entretanto, este problema tem sua proporção reduzida pelo fato de que chimpanzés parecem animais realmente bastante inteligentes: as técnicas de recolhimento de alimentos, lavagem e ruminação de frutas, quebra de nozes e montagem de leitos nas copas das árvores a partir da contorção de galhos e folhas são fascinantes.

Exibindo pontualmente time lapses ou câmeras lentas de elementos naturais que em nada se relacionam aos objetos de estudo, mas impressionam pela beleza, Chimpanzé é um documentário cujas diversas falhas são compensadas pela fascinação que os primatas são capazes de despertar.

★★★★

Chimpanzee, Tanzânia/EUA, 2012 | Conceito original de Alastair Fothergill & Mark Linfield. Escrito por Mark Linfield & Alastair Fothergill & Don Hahn | Dirigido por Alastair Fothergill & Mark Linfield | Narrado por Tim Allen.

19 de junho de 2013

Crítica | Minha Mãe é uma Peça - O Filme

Rodrigo Pandolfo, Paulo Gustavo e Mariana Xavier em MINHA MÃE É UMA PEÇA - O FILME

★★★

Minha Mãe é Uma Peça - O Filme, Brasil, 2013 | Duração: 1h24m14s | Lançado no Brasil em 21 de junho de 2013, nos cinemas | Baseado na peça de Paulo Gustavo. Roteiro de Paulo Gustavo e Fil Braz, com a colaboração de Rafael Dragaud | Digirido por André Pellenz | Com Paulo Gustavo, Mariana Xavier, Rodrigo Pandolfo, Suelly Franco, Herson Capri, Ingrid Guimarães, Alexandra Richter, Bruno Bebianno, Samatha Schmütz, Guida Vianna, Jefferson Shroerder, Mônica Martelli, Malu Valle.

Pôster/cartaz/capa nacional de MINHA MÃE É UMA PEÇA - O FILME
Na abertura de Minha Mãe é uma Peça - O Filme, somos informados por uma narração em off que estamos prestes a acompanhar a história de uma família como outra qualquer. Oitenta minutos mais tarde, quando um vídeo amador de Dona Déa (mãe e inspiração de Paulo Gustavo) surge no início dos créditos finais e as semelhanças com a caricata protagonista ficam evidentes, a fala inicial do narrador ganha novos contornos: embora a família de Dona Hermínia (Paulo Gustavo) não seja nada convencional, o espírito materno absolutamente legítimo da personagem e sua surpreendente semelhança com uma figura real conferem aos altos e baixos do relacionamento entre mãe e filhos um caráter universal, que torna a divertidíssima comédia menos problemática.

Escrito por Fil Braz, Rafael Dragaud e Paulo Gustavo com base no monólogo teatral criado por este último, Minha Mãe é uma Peça apresenta Dona Hermínia como uma mulher de meia idade divorciada, falante e debochada que, depois de ser insultada pelos filhos, os jovens adultos Marcelina (Mariana Xavier) e Juliano (Rodrigo Pandolfo), decide sair de casa sem avisos e se instalar na casa da Tia Zélia (Suelly Franco) por alguns dias. Enquanto os irmãos tentam descobrir o paradeiro da mãe e sobreviver sem o seu auxílio, a mulher desabafa suas dores com a tia, evocando casos do passado.

E é justamente aí que reside o maior problema de Minha Mãe é uma Peça: oriundo de um espetáculo teatral centrado unicamente na personagem de Paulo Gustavo, o roteiro se prende a um esboço miserável de história para exibir recortes isolados e independentes da vida daquela família, o que faz os vários flashbacks soarem como meras esquetes. Assim, os prováveis comentários do texto original de Gustavo sobre temas do cotidiano são inseridos ou transformados em pequenos eventos - como a reunião de condomínio, que destaca e brinca com os males e as dificuldades de se viver em comunidade sem avançar um milímetro sequer no arco geral da narrativa. Além disso, o roteiro raramente aborda os contratempos domésticos enfrentados por Marcelina e Juliano na ausência da mãe, o que praticamente anula o impacto de seu afastamento.

Nesse sentido, é no mínimo curioso que o roteiro pareça exibir uma estranha autoconsciência da precariedade da própria estrutura, especificamente no momento em que Tia Zélia aponta que, enquanto contava os casos, a sobrinha "abriu uma porção de parênteses e não fechou nenhum". Como se não bastasse, vários personagens revelam-se completamente dispensáveis (como a vizinha com problemas intestinais ou o casal viciado em karaokê), protagonizando gags descartáveis que denunciam a falta de cuidado dos roteiristas com a construção da trama - sem mencionar, é claro, os clichês que promovem as pequenas viradas da narrativa, como o telefone que não desliga ao final de uma ligação e expõe os comentários maldosos de um dos interlocutores ou a transmissão ao vivo de um programa de TV, que acaba promovendo um encontro entre personagens. Para completar, o filme exibe notáveis problemas de ritmo no terceiro ato: mesmo depois que o conflito central já foi resolvido, subsequentes passagens de tempos abrem espaço para esquetes despropositadas e relativamente demoradas (como a discussão entre as personagens de Ingrid Guimarães e Samantha Schmütz) que conseguem a proeza de fazer um filme de pouco mais de oitenta minutos se alongar além do necessário.

Paulo Gustavo em MINHA MÃE É UMA PEÇA - O FILME

Estreando na direção de longas, André Pellenz faz o que pode para contornar o formato teatral da obra e transformá-la em uma produção cinematográfica decente - e é incômodo apontar como demérito da direção, por exemplo, a péssima construção da morte de determinado personagem, já que o evento foge completamente do tom da narrativa, exibe importância ínfima para o arco dramático do longa e dificilmente seria melhor trabalhado por outro diretor. Enquanto isso, os departamentos de maquiagem e o figurino merecem nota pelos esforços de omitir os traços mais notáveis da anatomia masculina de Paulo Gustavo sem, contudo, ignorar a natureza caricata da personagem.

O que naturalmente nos leva àquele que, certamente, é o maior responsável pelo pequenos sucessos da comédia. Investindo em um tom de voz histérico e muitas vezes pouco agradável aos ouvidos, Paulo Gustavo transforma a protagonista em uma mulher dramática, agitada e mandona que chama a atenção pelo humor debochado e depreciativo - e grande parte da graça do longa reside justamente nas constantes trocas de alfinetadas entre todos os personagens. Entretanto, o trabalho do ator seria gravemente comprometido caso os intérpretes de Juliano e Marcelina não estivem em perfeita sintonia - e o entrosamento de Gustavo com Rodrigo Pandolfo e, especialmente, Mariana Xavier é digno de aplausos e contribui ativamente para a graça do filme. Finalmente, Dona Hermínia seria apenas mais uma caricatura louca caso não fosse perfeitamente possível identificar, por trás de sua impetuosidade, a preocupação com a felicidade dos filhos e um genuíno amor maternal - e além dos acertos mais marcantes do roteiro (como a cena em que Marcelina é insultada por uma desconhecida no supermercado e Hermínia defende vigorosamente a filha, segundos depois de insultá-la pelos mesmos motivos), o mérito recai sob Paulo Gustavo e sua capacidade admirável de evocar a natureza emotiva da personagem.

Exibindo um inexplicável conservadorismo ao desviar descaradamente o foco de um beijo gay e exagerando na carga de humor extraída de estereótipos (grande parte das piadas derivam da obesidade da filha e da homossexualidade do filho), Minha Mãe é uma Peça - O Filme é uma produção cujos poucos esmeros cinematográficos são compensados pelo válido pretexto de levar o maravilhoso, afiado e hilário trabalho de Paulo Gustavo ao conhecimento do maior número possível de pessoas.

Paulo Gustavo em MINHA MÃE É UMA PEÇA - O FILME

18 de junho de 2013

Crítica | Universidade Monstros

UNIVERSIDADE MONSTROS (Monsters University)

★★★

Monsters University, EUA, 2013 | Duração: 1h43m35s | Lançado no Brasil em 21 de Junho de 2013, nos cinemas | Escrito por Robert L. Baird, Daniel Gerson e Dan Scanlon | Dirigido por Dan Scanlon | Com as vozes de Billy Crystal, John Goodman, Steve Buscemi, Helen Mirren, Peter Sohn, Joel Murray, Charlie Day, Sean Hayes, Dave Foley, Alfred Molina, Nathan Fillion, Aubrey Plaza, Tyler Labine, Julia Sweeney e John Ratzenberger.

Pôster/cartaz/capa nacional e crítica de UNIVERSIDADE MONSTROS (Monsters University)
A Universidade Monstros não é muito diferente das demais instituições de ensino superior estadunidenses que costumamos ver por aí. Em um campus amplo e arejado, centenas de jovens (e alguns poucos indivíduos com mais idade) se reúnem para aprender profissões das mais variadas, dividem quartos em dormitórios, tentam ingressar em fraternidades, se divertem em festas, descolam trabalhos paralelos aos estudos, participam de competições esportivas, abraçam outras atividades extracurriculares e se sujeitam às mais diversas tradições típicas daquele ambiente. O que realmente diferencia a UM das demais universidades, porém, é a natureza de seus frequentadores e dos cursos oferecidos: ao invés de humanos, os corpos docente e discente são formados por monstros, lecionando ou matriculados em cursos que, em sua maioria, preparam os formandos para seguir carreira no ramo energético - como o cobiçado curso de Assustador, que habilita o aluno a assumir uma das mais importantes funções na Monstros S.A.

Por tudo isso, a grande proposta de Universidade Monstros fica bastante clara e evidente: satirizar não só a dinâmica universitária em si, como também os diversos filmes adolescentes que se baseiam nela. Por um lado, a animação é bem sucedida na tarefa: além de várias gags divertidas, o espectador mais atento conseguirá identificar uma infinidade de elementos curiosos que tiram sarro da mescla inusitada daqueles dois mundos, espalhados pelos quatro cantos do filme. Entretanto, do ponto de vista narrativo, Universidade Monstros decepciona por não conseguir contornar as convenções e os clichês que supostamente tenta satirizar, investindo em uma trama que não faz jus ao alto padrão de qualidade estabelecido pela Pixar ao longo de sua trajetória.

Escrito por Robert L. Baird, Daniel Gerson (roteirista de Monstros S.A.) e Dan Scanlon e dirigido por este último, o filme regressa à infância de Mike Wazowski (Billy Crystal) e nos apresenta a um monstrinho miúdo que, menosprezado pelos colegas de classe, sonha em se tornar um Assustador - cargo atribuído aos monstros capazes de extrair gritos de alta qualidade de crianças humanas, que são armazenados em cilindros e fornecem energia àquele universo. Anos mais tarde, Wazowski tenta colocar seu plano de vida em prática ao ingressar na UM: ainda franzino, o personagem mergulha nos estudos e se torna o aluno com o melhor embasamento teórico da turma - o que gera uma indisposição com o relapso, corpulento e presunçoso James P. Sullivan (John  Goodman), ou apenas Sulley, cujos talento nato e histórico familiar no campo do susto garantem sua popularidade apoteótica entre os colegas. No entanto, depois de serem expulsos do curso para Assustadores por problemas de conduta, Mike e Sulley encontram em um torneio - os Jogos de Susto - a oportunidade de tentar convencer a austera diretora Hardscrabble (Helen Mirren) a reverter a expulsão.

UNIVERSIDADE MONSTROS (Monsters University)

Não bastasse a batida e preguiçosa estrutura de filme de competição, Universidade Monstros ainda se agarra ao conflito mais óbvio e previsível que poderia atingir a dupla central naquele contexto: inscritos tardiamente no torneio, Mike e Sulley, além de extremamente competitivos e discordantes, se veem obrigados a ingressar na Oozma Kappa, fraternidade formada por monstros excluídos e desajustados. Dessa forma, além de tornar a narrativa razoavelmente previsível, a inserção do grupo abre espaço para que os realizadores martelem séries de mensagens educativas, irritantes em sua pieguice - como, por exemplo, a passagem que derruba o complexo de inferioridade dos integrantes da Oozma Kappa e os exibe aprendendo a importância de descobrir e aperfeiçoar suas habilidades natas, bem como identificar as demandas por elas. Além disso, o protagonista também atravessa um conflito de natureza semelhante ao insistir em uma carreira claramente além de suas capacidades, caminhando de encontro ao provável massacre de seu sonho no possível desfecho desfavorável do torneio - o que resulta em uma cena embaraçosa em que comentários negativos rodeiam a mente de Mike em voice over instantes antes de um evento decisivo e acaba conduzindo a narrativa a um clímax tremendamente aborrecido do ponto de vista dramático.

Impedindo que o terceiro ato seja um desastre completo, uma inspirada e divertidíssima homenagem ao gênero terror surge como a possível última grande sacada da projeção, uma vez que as fotos que amarram os dois filmes da franquia, assim como a cena extra após os créditos finais (cuja piada pode ser antecipada um milissegundo após seu início), são significativamente tolas. Por outro lado, os realizadores conseguem aproveitar bem o claramente expositivo tour de Mike no primeiro dia de faculdade tanto para apresentar alguns cenários importantes para momentos posteriores da narrativa quanto para enriquecer alguns conceitos daquele mundo. Aliás, mesmo enfrentando óbvias dificuldades de ampliar aquele universo (afinal, a fragilidade de certos conceitos é fundamental para o desfecho de Monstros S.A.), o filme consegue extrair bons frutos da inserção inusitada de monstros em um ambiente universitário: do visual rejuvenescido de personagens conhecidos (com destaque para o topete de Sulley e o visual simpático e inseguro do futuro vilão Randy) até a arquitetura peculiar do campus, repleta de pontas que naturalmente remetem a chifres e presas, os artistas da Pixar concebem cenários e personagens favoráveis a gags inspiradas - e gosto particularmente da forma como os vários membros, olhos ou cabeças de alguns monstros figurantes são empregados em funções que tentam minimizar os contratempos acadêmicos (como aqueles que surgem lendo vários livros ao mesmo tempo a caminho de uma aula ou segurando vários copos de café).

Repleto de personagens secundários que, embora engraçadinhos, jamais têm seus dramas particulares satisfatoriamente desenvolvidos, Universidade Monstros volta a trazer nomes desconhecidos da equipe da Pixar assumindo o comando criativo da produção, algo que Valente já havia feito no ano passado - e, aparentemente, Scanlon, Baird e Gerson entraram no projeto com o pé esquerdo e ignoraram os significados distintos que o ato possui nos universos monstro e humano.

UNIVERSIDADE MONSTROS (Monsters University)

17 de junho de 2013

30 Noites de Atividade Paranormal Com a Filha dos Homens Que Não Amavam as Mulheres


A obsessão de Craig Moss por títulos extensos e ilógicos reflete perfeitamente bem suas ambições artísticas. Responsável pelas atrocidades Um Virgem de 41 Anos Ligeiramente em Apuros (do original The 41-Years-Old Virgin Who Knocked Up Sarah Marshall and Felt Superbad About It), A Saga Molusco - Anoitecer e Bad Ass - Acima da Lei, o cineasta dá sequência à sua deplorável carreira com este 30 Noites de Atividade Paranormal Com a Filha dos Homens Que Não Amavam as Mulheres, "comédia" satírica cuja falta de graça e lógica atinge níveis catastróficos e patológicos.

Também pudera, tendo em vista que falo de um projeto que pretende mesclar, de forma supostamente orgânica, produções tão distintas e diversas quanto Atividade Paranormal 1, 2 e 3, Filha do Mal, Millennium - Os Homens Que Não Amavam as Mulheres, Cisne Negro, Missão Madrinha de Casamento, Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge, Jogos Vorazes, Os Caça-Fantasmas, Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros, Projeto X - Uma Festa Fora de Controle, O ArtistaUm Show de Vizinha e outras que felizmente não consegui identificar. Assim, logo descobrimos que o conceito de referência defendido por Moss é muitíssimo diferente daquele com o qual estamos acostumados: em determinada cena, por exemplo, Bane, Effie Trinket, Lisbeth Salander e as madrinhas de casamento dividem cena sem qualquer propósito evidente (eu não saberia sequer afirmar como cada um apareceu naquele ambiente) e são abduzidos por versões genéricas e irritantes dos Caça-Fantasmas. Além disso, Moss também não parece enxergar barreiras entre o politicamente incorreto e a absoluta imbecilidade - e além de uma versão grosseira da festa de Projeto X protagonizada por um bebê, o diretor ainda inclui uma aparição de extremo mal gosto do cadáver de Steve Jobs, em uma menção completamente desncessária à Apple.

Muito disso provavelmente não seria problema caso o filme fosse minimamente engraçado - e os montes de piadas aborrecidas, machistas, escatológicas ou a absoluta falta de nexo daquilo que o diretor chama de narrativa apenas confirmam que Craig Moss é um nome a ser permanentemente observado e temido.


30 Nights of Paranormal Activity With the Devil Inside the Girl With the Dragon Tattoo, EUA, 2013 | Escrito por Craig Moss | Dirigido por Craig Moss | Com Flip Schultz, Kathryn Fiore, Olivia Alexander, Arturo del Puerto, Peter Gilroy, Tyler Stephen Phillips, Danny Woodburn.

16 de junho de 2013

Curta | O Guarda-Chuva Azul

O GUARDA-CHUVA AZUL

O Guarda-Chuva Azul é um filme lindo. Desde os primeiros segundos, quando paisagens urbanas noturnas são registradas pelas câmeras virtuais ligeiramente instáveis dos estúdios Pixar com uma profundidade de campo reduzida, que compromete o efeito 3D e ressalta as texturas dos cenários, é possível notar o enorme apuro técnico e estético do estúdio de animação - e, em vários momentos, suspeitei que apenas alguns poucos elementos de cena eram criados com computação gráfica, inseridos em cenários reais. Por tudo isso, é extremamente decepcionante que o curta seja tão medíocre do ponto de vista narrativo.

Dirigido por Saschka Unseld e exibido antes das cópias de Universidade Monstros nos cinemas, O Guarda-Chuva Azul exibe a alegria discreta de vários componentes de uma paisagem urbana com a chegada de uma pancada de chuva - o que, rápida e naturalmente, induz os transeuntes a abrirem seus guarda-chuvas. Em meio a um oceano de lonas pretas, dois guarda-chuvas se destacam: um azul e um vermelho, que demonstram curiosidade e atração mútuas apenas para, instantes mais tardes, serem separados pelas trajetórias divergentes de seus donos.

A partir daí, uma espiral de adversidades vai de encontro ao personagem-título, que, inerte, fica sujeito à sorte e à ajuda de alguns outros componentes vivos daquele cenário, que compadecem pelo infortunado guarda-chuva e resolvem intervir para evitar que este seja massacrado por carros ou pedestres. A trama preguiçosa e os personagens vazios, porém, dificultam o envolvimento do espectador, que se vê obrigado a admirar um enorme preciosismo técnico a serviço de um projeto risível.

The Blue Umbrella, EUA, 2013 | Dirigido por Saschka Unseld.

13 de junho de 2013

Crítica | Antes da Meia-Noite

Julie Delpy e Ethan Hawke em ANTES DA MEIA-NOITE (Before Midnight)

por Eduardo Monteiro

Before Midnight, EUA, 2013 | Duração: 1h48m34s | Lançado no Brasil em 14 de Junho de 2013, nos cinemas | Baseado nos personagens de Richard Linklater & Kim Krizan. Escrito por Richard Linklater & Julie Delpy & Ethan Hawke | Dirigido por Richard Linklater | Com Ethan Hawke, Julie Delpy, Seamus Davey-Fitzpatrick, Jennifer Prior, Charlotte Prior, Walter Lassally, Xenia Kalogeropoulou, Athina Rachel Tsangari, Panos Koronis, Ariane Labed, Yiannis Papadopoulos.

Pôster nacional e crítica de ANTES DA MEIA-NOITE (Before Midnight)
Não cabe a Antes do Amanhecer esclarecer se, seis meses depois de se conhecerem em um trem em Viena e passarem uma noite juntos na cidade, Jesse (Ethan Hawke) e Celine (Julie Delpy) se reencontraram naquele mesmo local, conforme combinado às vésperas do desfecho; a incerteza que se instaura na mente do espectador é um claro reflexo do sentimento dos próprios personagens, que são obrigados a seguir em direções opostas sem qualquer conhecimento das surpresas que o futuro lhes reserva. Nove anos mais tarde, Richard Linklater e Kim Krizan se propuseram a reunir os personagens em Antes do Pôr-do-Sol e, não só tiveram que fornecer respostas para as lacunas deixadas pelo filme anterior, como também as transformaram na base para reflexões sobre frustração amorosa, além de se aprofundarem na natureza da fagulha acesa no longínquo primeiro encontro dos personagens. Naturalmente, também não cabia ao filme de 2004 deixar claro se aquela tarde em Paris terminaria ou não com Jesse embarcando no avião que o afastaria novamente de Celine, o que abria espaço para que o público pudesse exercitar a imaginação e tirar suas próprias conclusões.

Mais nove anos se passaram e, por baixo dos panos (a produção do filme só foi confirmada após o encerramento da filmagens), Linklater, Hawke e Delpy uniram forças novamente para produzir este maravilhoso Antes da Meia-Noite, cuja obrigação de amarrar as pontas soltas do antecessor conduz o casal principal a um contexto que fomenta toda uma gama de novos temas (e encerre a leitura por aqui caso uma grande carga de revelações te incomode). Escrito em conjunto pelo diretor e pela dupla de atores, o filme traz Jesse como um pai coruja que, durante um veraneio na Grécia, precisa despachar o filho pré-adolescente Hank (Seamus Davey-Fitzpatrick) de volta para os cuidados de sua então ex-esposa - e, logo em seguida, o longa mostra de forma extremamente elegante que o encontro de 2004 gerou bons frutos: agora, Jesse e Celine são oficialmente um casal, além de pais das jovens gêmeas Ella e Nina (Jennifer e Charlotte Prior). Dessa forma, a tradicionalmente rica conversação entre os personagens agora passa a refletir os vários anos de relacionamento, suas diversas implicações e o peso da idade de ambos.

Mais uma vez, a riqueza e a naturalidade dos diálogos concebidos pelos roteiristas chamam a atenção, embora eventuais, inesperadas e inéditas artificialidades surjam em determinadas ocasiões: as circunstâncias posteriores ao desfecho do encontro em Paris, a motivação para estarem na Grécia e até mesmo um resumo dos fatos determinantes da trajetória do casal são expressos em falas que nem sempre parecem necessárias em seus contextos - como, por exemplo, na ocasião em que o casal parece entrar em uma pequena e antiga igreja apenas para ter a chance de contar ao público alguns detalhes de seu próprio casamento. Da mesma forma, a dinâmica de um diálogo entre vários personagens em torno de uma mesa é levemente falha: as constantes alterações do foco da conversa e as necessárias mudanças de posicionamento da câmera (resultando, naturalmente, em erros de continuísmo - perdoáveis, é claro) despertam a recordação de que toda aquela cena foi rigorosamente ensaiada, comprometendo em pequeno grau sua eficácia.

Julie Delpy e Ethan Hawke em ANTES DA MEIA-NOITE (Before Midnight)

Esse pequenos tropeços, entretanto, são facilmente superados pelo excelente trabalho de Ethan Hawke, Julie Delpy e Richard Linklater no restante do tempo. O impecável e longuíssimo plano que acompanha o casal e as filhas voltando do aeroporto, por exemplo, é um espetáculo à parte: obviamente repleto de improvisos, o diálogo consegue não só apresentar ao público a dinâmica de Jesse e Celine como um casal, através da contagem de casos corriqueiros ou da forma como lidam com as gêmeas, como também plantar a semente da discórdia que germinará no terceiro ato - e repare ainda como Delpy confere constantemente o sono das filhas (especialmente quando estas se mexem), mesmo sabendo que as atrizes mirins foram orientadas a não acordar antes de determinada altura da cena. Além disso, Antes da Meia-Noite é também o mais divertido da trilogia, fruto tanto da química invejável da dupla de atores quanto do texto inspirado (a cena em que Julie Delpy encarna uma "vadia burra" é absolutamente hilária).

No entanto, as melhores reflexões propostas por Antes da Meia-Noite são aquelas relacionadas ao momento particular das vidas de Jesse e Celine, que certamente se diferem das questões levantadas nove ou dezoito anos antes. Antes de mais nada, é curioso testemunhar os personagens reféns de novas tecnologias - e a simples menção da importância do Skype no relacionamento do jovem casal vivido por Ariane Labed e Yiannis Papadopoulos inevitavelmente nos leva a imaginar como a trajetória do casal principal teria sido afetada caso ferramentas como essa fossem comuns em meados da década de 90. Além disso, os quarenta e poucos anos que os personagens carregam nas costas transformam a velhice e a efemeridade da vida em assuntos recorrentes nos diálogos - e pouco depois de discutirem a imprevisibilidade dos anos que ainda os aguardam, Jesse e Celine são vistos observando o pôr-do-sol, evento emblemático em sua inevitabilidade.

Para completar, os personagens de Ethan Hawke e Julie Delpy se estabelecem de vez como figurais absolutamente reais e tridimensionais quando um leve desentendimento evolui para uma discussão fervorosa: repletos de opiniões próprias, frustrações e sentimentos que até então ocultavam pelo bem da relação, Jesse e Celine se veem rodeados por dilemas cuja complexidade demanda séries e mais séries de ponderações e concessões por ambas as partes - e em um embate em que posicionamentos fortes e distintos estão sujeitos a toda a sorte de aspectos subjetivos, o percurso rumo ao consenso é invariavelmente árduo, senão impraticável.

E é a crueza de momentos como este que faz de Antes da Meia-Noite o encerramento fascinante de uma trilogia idem - e a julgar pela competência de Linklater, Hawke e Delpy de readaptar o formato da série para cada nova etapa da vida de Jesse e Celine, mal posso esperar para reencontrá-los na próxima década.

ANTES DA MEIA-NOITE (Before Midnight)

9 de junho de 2013

Curta | Alma

ALMA

Graças à trilha sonora gostosa, ao visual alegre de Alma e a sua curiosidade infantil, é perfeitamente natural assistir aos primeiros segundos do curta de animação Alma e esperar que, independente dos eventos do desenvolvimento, a história termine bem. Este é um dos grandes acertos do filme escrito e dirigido por Rodrigo Blaas, animador com passagem pela Blue Sky, pela Pixar e que, segundo informações imprecisas, estaria desenvolvendo para a DreamWorks uma versão em longa-metragem deste curta.

No filme, Alma é uma garota que, durante um tranquilo passeio por uma rua deserta e gelada, vislumbra na vitrine de uma loja uma boneca com quem divide impressionantes semelhanças. Curiosa, a menina entra no local e se depara com elementos fantásticos inesperados.

Rodrigo Blaas acerta ao utilizar pontualmente "câmeras" ligeiramente inquietas, conferindo um ar de estranheza aos eventos - além, é claro, de inserir gradualmente elementos levemente assustadores que nos levam a temer pelo destino da personagem, como a boneca com um sorriso largo e enigmático ou o comportamento de um boneco montado em um triciclo. Por fim, o final corajoso certamente desperta interesse e boas expectativas pelo material que Blaas estaria desenvolvendo para a versão mais longa. Aguardemos.

Alma, EUA/Espanha, 2009 | Escrito por Rodrigo Blaas | Dirigido por Rodrigo Blaas.

8 de junho de 2013

Crítica | Depois da Terra

Jaden Smith e Will Smith em DEPOIS DA TERRA (After Earth)

por Eduardo Monteiro

After Earth, EUA, 2013 | Duração: 1h39m54s | Lançado no Brasil em 7 de Junho de 2013, nos cinemas | História de Will Smith. Roteiro de Gary Whitta e M. Night Shyamalan | Dirigido por M. Night Shyamalan | Com Jaden Smith, Will Smith, Sophie Okonedo, Zoe Isabella Kravitz, Glenn Morshower.

Pôster nacional e crítica de DEPOIS DA TERRA (After Earth)
Depois da Terra é um filme de família. Não exatamente um filme voltado para toda a família, mas oferecido por uma família: a Pinkett-Smith. Partindo de um argumento do patriarca Will Smith, o longa é produzido pelo próprio, pela esposa Jada Pinkett-Smith e pelo cunhado Caleeb Pinkett - e embora o ator surpreenda ao abrir mão do posto de protagonista (uma raridade em seus vinte e poucos anos de carreira, especialmente na última década), há uma razão bastante especial para que essa decisão tenha sido tomada: impulsionar a carreira cinematográfica de seu filho Jaden, que volta a contracenar com o pai sete anos após estrear no Cinema em À Procura da Felicidade.

Além disso, Depois da Terra também é um filme sobre família - ou ao menos é o que parece tentar ser. Dirigida e co-roteirizada pelo antes promissor M. Night Shyamalan, a ficção científica se passa em um futuro distópico repleto de abobrinhas, dentre as quais apenas algumas realmente importam: a Terra se tornou inabitável e, por isso, teve que ser evacuada; Will Smith é um general renomado de uma força militar interestelar, enquanto seu filho, ainda inexperiente, tenta seguir os passos do pai (sugestivo, não?); e, a certa altura, a humanidade passou a ser ameaçada por uma besta alienígena que fareja medo, conhecida como ursa. Nesse contexto, Cypher Raige (Will Smith) e Kitai (Jaden Smith) se transformam nos únicos sobreviventes de uma nave espacial que, coincidentemente, se parte ao meio nas redondezas da Terra. O pedido de socorro, porém, está vinculado a um equipamento armazenado na outra metade da nave, e, como Cypher fraturou a perna no acidente, é Kitai quem precisa percorrer a longa distância até a parte traseira, enfrentando desafios estupidamente peculiares.

Antes de mais nada, é preciso reconhecer que a humanidade projetada por Will Smith, M. Night Shyamalan e pelo co-roteirista Gary Whitta (O Livro de Eli) não parece tão evoluída quanto poderíamos esperar e deveríamos supor: o único equipamento de toda a nave que precisaria manter-se invariavelmente intacto em um acidente é o tal emissor de sinal de emergência - e, no entanto, o objeto mais parece um daqueles telefones celulares cujo trincamento da tela o torna inútil. Ainda nesse sentido, é ridículo que as cápsulas que armazenam doses diárias dos líquidos respiratórios que garantem a sobrevida de Kitai na atmosfera terrestre sejam tão frágeis, além de estarem armazenados em um estojo ofensivamente inseguro. Para completar, o general Raige demonstra inteligência ímpar ao acionar uma câmera na mochila do filho e mencionar que, assim, poderá ter a mesma visão que o rapaz, enquanto o equipamento obviamente encontra-se apontado para o sentido contrário ao percurso de Kitai (algo que Shyamalan categoricamente ignora em grande parte da projeção).

Will Smith e Jaden Smith em DEPOIS DA TERRA (After Earth)

Como se não bastasse, os desafios enfrentados por Kitai não fazem jus à sugestão do ambiente hostil em que a Terra teria se transformado (a aterrissagem no planeta não só é proibida, como também passível de multa). Pra início de conversa, o protagonista é constantemente sabotado pela própria estupidez: quando Cypher ordena que o garoto não reaja à intimidação de um bando de símios, Kitai prefere ignorar o pai e acaba multiplicando seus obstáculos. Além disso, embora os tais pontos quentes (que mantém temperaturas amenas durante o congelamento noturno do planeta) sejam elementos dificultosos plausíveis, o conceito é mal trabalhado pelos realizadores: diferentemente da caverna aquecida por rios subterrâneos de lava, por exemplo, a pequena área de floresta em que o protagonista passa a primeira noite não apresenta qualquer evidência física intuitiva para o isolamento térmico, enfraquecendo sensivelmente o conceito.

Liderando o elenco, Jaden Smith até se empenha para carregar o filme sozinho, mas acaba deixando evidente sua falta de carisma e talento: o instante em que o protagonista precisa demonstrar ausência de medo, por exemplo, é sensivelmente comprometido pela inexpressividade do jovem ator. Já Will Smith, em um papel sem maiores propósitos, acaba responsável por algumas das piores falas do roteiro: o discurso em que Cypher tenta desenvolver um raciocínio a respeito da natureza do medo é absolutamente embaraçoso, provando que mil anos não foram suficientes para aperfeiçoar o intelecto do ser humano. Para completar, Depois da Terra peca pelo absoluto vácuo emocional: através de flashbacks irrelevantes, crises familiares tolas e toda a sorte de eventos melodramáticos, os realizadores tentam conferir peso dramático à iminente destruição daquele núcleo familiar - mas a realidade é que, por todos os problemas já relatados,  jamais chegamos a temer pela vida de qualquer um dos personagens vistos em cena.

Com efeitos especiais regulares, figurinos assustadoramente pobres (os trajes dos personagens jamais exprimem o apuro tecnológico que possuem e acabam soando como macacões baratos e desfuncionais) e um design de produção que concebe uma sociedade futurística que aposta em soluções econômicas (como o uso recorrente de lonas para separar ambientes), Depois da Terra é uma distração aborrecida e esquecível que dá continuidade à sequência de erros de um diretor que, em um passado que agora parece muito distante, já conseguiu lançar o espectador para fora da sala de cinema com impressões muitíssimo diferentes dessas.

Jaden Smith em DEPOIS DA TERRA (After Earth)

2 de junho de 2013

Curta | Ataque do Zezé

ATAQUE DO ZEZÉ (Jack-Jack Attack)

Zezé não é um personagem muito importante em Os Incríveis: os poderes do mais jovem integrante da família de super-heróis são, a princípio, desconhecidos e, além disso, só mesmo uma mãe insana e desnaturada levaria um bebê de colo para uma aventura perigosa como aquela em que o Sr. Incrível, a Mulher-Elástica, o Flecha e Violeta se envolvem em boa parte da trama. No terceiro ato, entretanto, Zezé desempenha uma função essencial para o desfecho do longa - e as circunstâncias que levaram o personagem a se tornar fundamental tão repentinamente são o cerne de Ataque do Zezé.

Não que Os Incríveis falhe ao omitir os eventos do curta, muito pelo contrário: o suspense criado no longa é fundamental e certeiro, de modo que Ataque do Zezé surge como apenas um adendo divertido e curioso. Dirigido pelo próprio Brad Bird, o filme retrata as horas que a babá Kari passou na companhia do caçula da família Pera, enquanto seus familiares tentam salvar o mundo. Entretanto, Zezé passa a apresentar comportamentos estranhos à medida que seus superpoderes finalmente afloram.

Lançado como material bônus do DVD de Os Incríveis, o curta é aberto com letreiros que remetem a filmes clássicos de monstros e tem início com a babá em uma sombria sala de interrogatório - elementos que conferem uma divertida e falsa atmosfera de importância aos eventos que serão apresentados. O horror de Kari com o ataque de Zezé, naturalmente, diverte justamente pelo fato de sabemos que nada de grave irá acontecer com nenhum dos personagens - e o uso de uma composição de Mozart torna a situação ainda mais hilária. Para completar, o curta é muitíssimo bem amarrado ao longa (especialmente no que diz respeito às ligações telefônicas), conseguindo complementá-lo sem comprometê-lo.

Jack-Jack Attack, EUA, 2005 | História de Teddy Newton & Mark Andrews & Rob Gibbs & Bosco Ng. Escrito por Brad Bird | Dirigido por Brad Bird | Com as vozes de Bret Parker, Bud Luckey, Eli Fucile e Jason Lee.

1 de junho de 2013

Crítica | Odeio o Dia dos Namorados

Heloisa Périssé e Marcelo Saback em ODEIO O DIA DOS NAMORADOS

por Eduardo Monteiro

Odeio o Dia dos Namorados, Brasil, 2013 | Duração: 1h40m40s | Lançado no Brasil em 7 de Junho de 2013, nos cinemas | Roteiro de Paulo Cursino | Dirigido por Roberto Santucci | Com Heloisa Périssé, Marcelo Saback, Daniel Boaventura, André Mattos, Danielle Winits, Daniele Valente, Fernando Caruso, Henri Pagnocelli, Marcela Barrozo, Malu Valle, Lucas Salles, Charles Paraventi, MV Bill.

Pôster e crítica de ODEIO O DIA DOS NAMORADOS
Odeio o Dia dos Namorados é o terceiro filme escrito por Paulo Cursino e dirigido por Roberto Santucci a estrear no Brasil em um período de pouco mais de oito meses - e, como se não bastasse a frequência atípica, os dois anteriores (os pavorosos Até Que a Sorte Nos Separe e De Pernas Pro Ar 2) se tornaram, respectivamente, as maiores bilheterias de filmes nacionais em 2012 e 2013 (neste último caso, considerando o período anterior à publicação desse texto). A julgar pelo ritmo acelerado de produção e pela qualidade duvidosa dos trabalhos prévios (o que abrange desde deméritos técnicos até a repetição de fórmulas ou a falta de refinamento dos roteiros e do humor), esta nova comédia despontava como mais um desastre em potencial - e é surpreendente que, embora repita diversos erros dos antecessores, o longa surja como o mais coeso e arrojado da dupla, conseguindo invocar o riso sem despertar no espectador a sensação de estar sentado no sofá de casa diante de um humorístico da TV de sábado à noite.

Todavia, a premissa de Odeio o Dia dos Namorados já decepciona pela patente falta de originalidade: cimentando a obsessão de Paulo Cursino por mulheres workaholics que colocam o trabalho acima da vida pessoal, o filme recicla a Alice de De Pernas Pro Ar e nos apresenta a Débora (Heloisa Périssé), uma mulher que, da mesma forma que o personagem de Nicolas Cage em Um Homem de Família, sacrifica o casamento com o grande amor de sua vida por uma oportunidade de emprego irrecusável. Quinze anos mais tarde, Débora é uma mulher azeda, avessa a romantismos e que ocupa um cargo do alto escalão de uma empresa de publicidade - estratégia oportunista lançada por Se Eu Fosse Você para tornar o product placement do filme mais orgânico. Porém, em meio ao estresse de sua rotina, a mulher acaba envolvida em um acidente em que é lançada pelo para-brisa do carro - e durante os poucos e superdilatados segundos que lhe restam antes de atingir o pavimento de uma movimentada rodovia, Débora recebe a visita do fantasma de Gilberto (Marcelo Saback), um falecido colega de trabalho que a conduz por uma breve retrospectiva de sua vida (além de uma pequena perspectiva de seu futuro), nos moldes lançados por Charles Dickens no clássico A Christmas Carol e já explorados, de forma muitíssimo semelhante, em filmes como Minhas Adoráveis Ex-Namoradas e Click.

Pressupondo o baixo nível de exigência de seu público, Odeio o Dia dos Namorados é uma produção repleta de arestas, que surgem desde o primeiro minuto de projeção: embora curiosa, a ideia de abrir o filme com um flash mob (mais especificamente o formato que ficou conhecido como Live Lip-Dub Proposal) é comprometida pelo salto de quinze anos que traz a narrativa para os dias atuais - e todos sabemos que mobilizações como essa, bem como os equipamentos utilizados, eram coisas inexistentes ou raras no final da década de 90. Da mesma forma, quando se aventura no futuro, o filme revela uma falta de cuidado peculiar no uso de hologramas: como se não bastasse a projeção de Heitor (Daniel Boaventura) ser opaca e encobrir Débora em determinados instantes, o tablet hologramático de Gilberto permanece em uma página de destaques jornalísticos mesmo depois que o personagem acessa determinada reportagem e começa e declamá-la.

Além disso, a indisposição de Cursino e Santucci de confiar na inteligência do público frequentemente atinge níveis alarmantes. Após determinada discussão com a então namorada Marina (Danielle Winits), por exemplo, Heitor aponta que "todo mundo já amou alguém que não correspondia o sentimento com o mesmo vigor", referindo-se à sua relação com a protagonista - e, acreditando que somos incapazes de perceber que o raciocínio também se aplica à relação dos personagens de Boaventura e Winits, esta última é obrigada a exaltar: "Eu sei. E esse alguém pra mim é você". Ainda nesse sentido, os realizadores conseguem destruir até mesmo sacadas inspiradas, como na ocasião pretérita em que a compra de um Monza é colocada como sintoma de abundância e alguém em cena precisa reforçar que o modelo de carro era popular naquela época.

Danielle Winits e Daniel Boaventura em ODEIO O DIA DOS NAMORADOS

Também infeliz é a forma como alguns elementos fundamentais da trama são apresentados - e a melhor maneira encontrada pelo roteirista para introduzir o falecimento de Gilberto, por exemplo, é através da presença inexplicável da publicitária Carol (Daniele Valente) na antiga mesa de trabalho do sujeito, assistindo ao vídeo de sua morte fulminante, o que simplesmente não faz o menor sentido. Para completar, Cursino abusa das ocasiões em que os personagens de Périssé e Saback comentam algo instantes antes de o oposto ocorrer em cena, conferindo inapropriada artificialidade à evolução da narrativa.

E nem nos quesitos técnicos a comédia sai ilesa. Fora o uso além do ideal de cenários digitais, Odeio o Dia dos Namorados é particularmente infeliz no trabalho de maquiagem: enquanto o envelhecimento nulo de Débora ao longo de quase quarenta anos é parcial e estrategicamente justificado por tecnologias futurísticas, tolas e arbitrárias, sua versão mais jovem (vivida por Marcela Barrozo) conta com uma prótese nasal desnecessária e pavorosa, que se torna ligeiramente translúcida sempre que muita claridade atinge o rosto da atriz. No entanto, mesmo com esse problemas, o trabalho da equipe técnica de Odeio o Dia dos Namorados é muitíssimo superior ao visto nos filmes anteriores de Santucci: a câmera lentíssima que registra o voo de Débora é bem executada (os efeitos especiais nessa ocasião são irrepreensíveis), além de extremamente inventiva para os padrões do cineasta. Além disso, o diretor demonstra inesperada sutileza em certos momentos: quando a protagonista faz um escândalo no escritório e acaba atraindo a atenção de todos os presentes, ao invés de passear pelos rostos estarrecidos dos funcionários (que seria a opção mais óbvia), Santucci opta por inserir um ruído simples e distante de um objeto caindo, que sugere de imediato o silêncio sepulcral do ambiente e transmite a mensagem com excelência.

Por fim, é preciso reconhecer que Odeio o Dia dos Namorados é um bom divertimento, que consegue até mesmo contornar o caráter episódico que a estrutura adotada poderia implicar e se afastar dos amontoados repugnantes de esquetes em que Até Que a Sorte Nos Separe e De Pernas Pro Ar 2 se transformaram. Ainda que a dinâmica intensa entre Débora e Gilberto deixe transparecer os esforços excessivos para emplacar piadas, os atores conseguem fazer um bom trabalho: enquanto Marcelo Saback assume uma postura própria de alguém que, naturalmente, não tem nada a perder e mantém a afetação homossexual do personagem nos eixos, Heloísa Périssé confere uma antipatia calculada à protagonista e consegue revertê-la com segurança quando necessário. E se Daniel Boaventura (assim como Bruno Garcia em De Pernas Pro Ar) tem seu natural potencial cômico reprimido por um personagem essencialmente dramático e monotônico, uma de suas parceiras de cena surge como o grande destaque da produção: apresentando o tipo físico perfeito para a delegada perua e durona, Danielle Winits exibe um timing cômico irrepreensível apenas para, segundos mais tarde, assumir uma carga dramática com igual talento, contribuindo para tornar a cena do interrogatório uma das mais divertidas da comédia.

Contando ainda com um elenco de apoio bastante competente (com destaque para o normalmente aborrecido André Mattos em uma atuação bastante divertida), Odeio o Dia dos Namorados é um longa apenas mediano, que só consegue se destacar efetivamente diante do desastre que são os filmes anteriores da parceria entre o diretor e o roteirista. Pelo menos está comprovado que, com alguma boa vontade e maior comprometimento, Roberto Santucci e Paulo Cursino estão habilitados a produzir comédias melhores futuramente.

Marcelo Saback, Daniel Boaventura e Heloisa Périssé em ODEIO O DIA DOS NAMORADOS

31 de maio de 2013

Se Beber, Não Case! Parte III

Justin Bartha, Zach Galifianakis, Ed Helms e Bradley Cooper em SE BEBER, NÃO CASE! PARTE III (The Hangover Part III)

Certas premissas - como a do primeiro Se Beber, Não Case! - são limitantes e autosuficientes demais para que a ideia de dar segmento a elas surja de maneira instintiva - e o fato de Se Beber, Não Case! Parte II precisar repetir rigorosamente a estrutura do anterior e falhar em justificá-la apenas comprova a enorme preguiça dos produtores. Por outro lado, com bons personagens em mãos, bons roteiristas estão habilitados a se livrar de amarras da premissa original e expandir o universo em questão - e esta pífia Parte III das aventuras dos personagens que eu sequer lembrava dos nomes no início da sessão reforça que o longa de 2009 definitivamente não precisava se transformar em uma franquia.

Escrito novamente por Craig Mazin (Uma Ladra Sem Limites) e pelo diretor Todd Phillips com base nos personagens criados por Jon Lucas e Scott Moore (Finalmente 18), Se Beber, Não Case! Parte III deixa de lado as amnésias alcoólicas e investe em uma trama cujas sementes supostamente haviam sido plantadas nos longas anteriores, numa tentativa equivocada de conferir unidade à trilogia. Assim, enquanto levam Alan (Zach Galifianakis) para uma clínica psiquiátrica, Phil (Bradley Cooper) e Stu (Ed Helms) são raptados pelo traficante Marshall (John Goodman), que faz Doug (Justin Bartha) de refém e atribui ao grupo a tarefa de capturar um inimigo bastante peculiar: Sr. Chow (Ken Jeong).

Trata-se não só de uma trama desinteressante, como também extremamente pobre: o fio que conduz os personagens a Tijuana e, posteriormente, de volta a Las Vegas é frágil, absurdo e não propicia eventos instigantes o suficiente para prender a atenção do público - e a resolução final é igualmente decepcionante. Além disso, a tentativa de desenvolver o imprevisível Alan é falha e tola, tornando-se particularmente reprovável quando um comentário sexista de Phil ("Alan não precisa de tratamento. Ele precisa é encontrar uma mulher") é levado a sério pelos roteiristas. Para completar, os realizadores insistem em resgatar elementos supostamente emblemáticos dos longas passados mesmo sem uma função prática, como a inócua sequência em que Alan interage com o bebê (agora crescido) do primeiro filme - o que só não é pior que o resgate de planos dos longas anteriores no encerramento, que naturalmente não consegue evocar qualquer traço de nostalgia.

O que nos leva à campanha de marketing do filme, que insistiu em promover esta terceira parte como o encerramento épico da trilogia iniciada em 2009. Em uma comédia que enfrenta dificuldades até mesmo para arrancar o riso do público (a cena mais divertida é também a mais absurda e só surge nos créditos finais), a divulgação fajuta certamente surge como a maior piada - e é uma pena que seja de extremo mal gosto.


The Hangover Part III, EUA, 2013 | Baseado nos personagens de Jon Lucas & Scott Moore. Roteiro de Todd Phillips e Craig Mazin | Dirigido por Todd Phillips | Com Bradley Cooper, Ed Helms, Zach Galifianakis, Ken Jeong, Justin Bartha, John Goodman, Melissa McCarthy, Jeffrey Tambor, Heather Graham, Mike Epps, Sasha Barrese, Jamie Chung, Sondra Currie.