18 de dezembro de 2012

Crítica | O Impossível

por Eduardo Monteiro

Lo Imposible, Espanha, 2012 | Duração: 1h51m11s | Lançado no Brasil em 21 de Dezembro de 2012, nos cinemas | Escrito por Sergio G. Sánchez | Dirigido por Juan Antonio Bayona | Com Naomi Watts, Tom Holland, Ewan McGregor, Samuel Joslin, Oaklee Pendergast, Ploy Jindachote, Sönke Möhring, Marta Etura e Geraldine Chaplin.

Embora eu me emocione frequentemente com filmes, é raro que algum deles me arranque lágrimas, não só em função do bloqueio causado pela consciência de estar assistindo a algo encenado (referindo-me, é claro, a produções não documentais), mas também porque, pessoalmente, tendo a reagir a temas ou fatos potencialmente emotivos de forma ligeiramente racional, permanecendo em um estado controlado de comoção. Por essa razão, qual não foi minha surpresa ao constatar que, com apenas 15 minutos de projeção de O Impossível, minha mente estava tomada pelo esforço sem precedentes de evitar o vexame de chorar descontroladamente durante a sessão realizada para a imprensa.

Obviamente, minha reação particular não constitui um argumento que possa ser usado a favor do longa, mas é uma consequência de escolhas cujas eficácia e legitimidade serão discutidas ao longo do texto. Escrito por Sergio G. Sáchez com base em uma história verídica, o roteiro acompanha o desfecho trágico da viagem da família Bennett à Tailândia no Natal de 2004, depois que um tsunami mortal devastou a costa sudeste da Ásia. Pegos de surpresa pela fúria marítima, Maria (Watts) e o primogênito Lucas (Holland) são feridos pela imensidão de entulhos e arrastados pela correnteza para longe de Henry (McGregor) e dos dois caçulas, Thomas (Joslin) e Simon (Pendergast). Após serem socorridos por nativos e outros sobreviventes, mãe e filho são levados para um hospital caótico onde todas as dores da tragédia se manifestam, da angústia pela precariedade da comunicação com entes queridos até a falta de estrutura hospitalar para atender a todos os feridos.

O maior mérito do trabalho do diretor espanhol Juan Antonio Bayona (O Orfanato) é, sem dúvida, a visceralidade aterrorizante que confere à reconstituição da catástrofe. Deixando no chinelo a sequência que rendeu ao fraquíssimo Além da Vida uma indicação ao Oscar de Efeitos Especiais na última edição da premiação, o avanço do mar sobre o continente em O Impossível é filmado por Bayona de forma extremamente impactante e realista, em uma sequência longa e tensa beneficiada tanto pelos excelentes e imperceptíveis efeitos especiais quanto pelas performances apavoradas de Watts e Holland. Além disso, os momentos que antecedem a chegada da onda à área de lazer do resort também são conduzidos com maestria, imprimindo perfeitamente bem a impotência dos personagens diante da repentinidade com que são alcançados pela massa d'água (acho particularmente marcante o ângulo baixo subaquático que mostra um Lucas apavorado buscando instintiva e apressadamente refúgio na piscina do resort, décimos de segundo antes de ser atingida por lama e escombros).

Mas não é só a recriação do tsunami que surpreende pelo grafismo, já que Bayona também não poupa o espectador das consequências do arrastamento - e até a decisão de mostrar as mutilações sofridas por Maria de forma breve (ainda que sem trucagens que tentem suavizá-las) é acertada, por expressar o esforço empregado pela própria mulher para esquecer as feridas e conviver com aquela adversidade até que algo possa ser feito a respeito. Competente na criação dos ferimentos ou na representação do agravamento do estado de saúde de certa personagem, o departamento de maquiagem ainda merece reconhecimento pelo cuidado com pequenos detalhes, como o caminho aberto por lágrimas na lateral do rosto ensanguentado de Maria, simbolizando que o estancamento do sangramento não representa, nem de perto, o fim do sofrimento da mulher. E enquanto a trilha sonora revela-se irregular por apostar em melodias apelativas em algumas passagens, os trabalhos da direção de arte e design de produção impressionam pela competente reprodução das condições catastróficas e paisagens devastadas em locações da Espanha e da Tailândia.

Voltando a provar-se uma escolha inequívoca para papéis de mulheres sofridas (vide Violência Gratuita, 21 Gramas ou até mesmo O Chamado), a excelente Naomi Watts brilha mais uma vez com uma atuação poderosa e completa, conseguindo exprimir com talento e autenticidade ímpares, por exemplo, o pânico de Maria quando esta se encontra agarrada a uma palmeira logo no início do tsunami. Acompanhando a atriz na maior parte do tempo, o jovem estreante Tom Holland revela-se um verdadeiro achado e, apesar do olhar demasiadamente lúcido e de alguns comportamentos artificiais imediatamente após o desastre, transforma Lucas em um garoto corajoso e perseverante, mas também vulnerável e amedrontado quando as circunstâncias o obrigam a ser. Por fim, Ewan McGregor volta a demonstrar uma inaptidão aparentemente incontornável de simular choro em cena que quase compromete um dos momentos de maior carga emocional do personagem, mas, ator talentoso que é, faz o que pode para conferir peso a Henry no restante do tempo.

Porque infelizmente, é a partir do momento em que o personagem de McGregor passa a receber mais atenção do roteiro que O Impossível se torna menos interessante, ganhando uma injeção de positivismo que se choca com o que vinha sido trabalhado até então e plantando as sementes do que se tornará um terceiro ato cujas coincidências e pieguice comprometem significativamente o desfecho. Não que a primeira metade não tenha seus problemas: a recorrência de objetos como uma latinha de refrigerante ou uma bola de plástico forçam simbolismos tolos, ao passo que alguns obstáculos e desencontros vivenciados pelos personagens investem em truques que o público consegue antecipar com relativa facilidade - mas, em última instância, o senso de humanidade e compaixão entranhado nos clichês e na pieguice torna mais fácil a tarefa de perdoá-los.

Pecando por colocar os turistas como as grandes vítimas da catástrofe (quando Lucas percorre os corredores do hospital com o objetivo de promover o reencontro de familiares, se depara com uma variedade atípica de nacionalidades), O Impossível consegue evocar com vigor e competência a tragédia particular dos Bennett, mas sem ignorar a coletiva - e o melancólico olhar aéreo que encerra o longa reforça o efeito devastador não só da onda sobre aquela região, mas também do filme sobre todos nós.