



Lo Imposible, Espanha, 2012 | Duração: 1h51m11s | Lançado no Brasil em 21 de Dezembro de 2012, nos cinemas | Escrito por Sergio G. Sánchez | Dirigido por Juan Antonio Bayona | Com Naomi Watts, Tom Holland, Ewan McGregor, Samuel Joslin, Oaklee Pendergast, Ploy Jindachote, Sönke Möhring, Marta Etura e Geraldine Chaplin.

Obviamente, minha reação particular não constitui um argumento que possa ser usado a favor do longa, mas é uma consequência de escolhas cujas eficácia e legitimidade serão discutidas ao longo do texto. Escrito por Sergio G. Sáchez com base em uma história verídica, o roteiro acompanha o desfecho trágico da viagem da família Bennett à Tailândia no Natal de 2004, depois que um tsunami mortal devastou a costa sudeste da Ásia. Pegos de surpresa pela fúria marítima, Maria (Watts) e o primogênito Lucas (Holland) são feridos pela imensidão de entulhos e arrastados pela correnteza para longe de Henry (McGregor) e dos dois caçulas, Thomas (Joslin) e Simon (Pendergast). Após serem socorridos por nativos e outros sobreviventes, mãe e filho são levados para um hospital caótico onde todas as dores da tragédia se manifestam, da angústia pela precariedade da comunicação com entes queridos até a falta de estrutura hospitalar para atender a todos os feridos.
O maior mérito do trabalho do diretor espanhol Juan Antonio Bayona (O Orfanato) é, sem dúvida, a visceralidade aterrorizante que confere à reconstituição da catástrofe. Deixando no chinelo a sequência que rendeu ao fraquíssimo Além da Vida uma indicação ao Oscar de Efeitos Especiais na última edição da premiação, o avanço do mar sobre o continente em O Impossível é filmado por Bayona de forma extremamente impactante e realista, em uma sequência longa e tensa beneficiada tanto pelos excelentes e imperceptíveis efeitos especiais quanto pelas performances apavoradas de Watts e Holland. Além disso, os momentos que antecedem a chegada da onda à área de lazer do resort também são conduzidos com maestria, imprimindo perfeitamente bem a impotência dos personagens diante da repentinidade com que são alcançados pela massa d'água (acho particularmente marcante o ângulo baixo subaquático que mostra um Lucas apavorado buscando instintiva e apressadamente refúgio na piscina do resort, décimos de segundo antes de ser atingida por lama e escombros).
Mas não é só a recriação do tsunami que surpreende pelo grafismo, já que Bayona também não poupa o espectador das consequências do arrastamento - e até a decisão de mostrar as mutilações sofridas por Maria de forma breve (ainda que sem trucagens que tentem suavizá-las) é acertada, por expressar o esforço empregado pela própria mulher para esquecer as feridas e conviver com aquela adversidade até que algo possa ser feito a respeito. Competente na criação dos ferimentos ou na representação do agravamento do estado de saúde de certa personagem, o departamento de maquiagem ainda merece reconhecimento pelo cuidado com pequenos detalhes, como o caminho aberto por lágrimas na lateral do rosto ensanguentado de Maria, simbolizando que o estancamento do sangramento não representa, nem de perto, o fim do sofrimento da mulher. E enquanto a trilha sonora revela-se irregular por apostar em melodias apelativas em algumas passagens, os trabalhos da direção de arte e design de produção impressionam pela competente reprodução das condições catastróficas e paisagens devastadas em locações da Espanha e da Tailândia.
Voltando a provar-se uma escolha inequívoca para papéis de mulheres sofridas (vide Violência Gratuita, 21 Gramas ou até mesmo O Chamado), a excelente Naomi Watts brilha mais uma vez com uma atuação poderosa e completa, conseguindo exprimir com talento e autenticidade ímpares, por exemplo, o pânico de Maria quando esta se encontra agarrada a uma palmeira logo no início do tsunami. Acompanhando a atriz na maior parte do tempo, o jovem estreante Tom Holland revela-se um verdadeiro achado e, apesar do olhar demasiadamente lúcido e de alguns comportamentos artificiais imediatamente após o desastre, transforma Lucas em um garoto corajoso e perseverante, mas também vulnerável e amedrontado quando as circunstâncias o obrigam a ser. Por fim, Ewan McGregor volta a demonstrar uma inaptidão aparentemente incontornável de simular choro em cena que quase compromete um dos momentos de maior carga emocional do personagem, mas, ator talentoso que é, faz o que pode para conferir peso a Henry no restante do tempo.
Porque infelizmente, é a partir do momento em que o personagem de McGregor passa a receber mais atenção do roteiro que O Impossível se torna menos interessante, ganhando uma injeção de positivismo que se choca com o que vinha sido trabalhado até então e plantando as sementes do que se tornará um terceiro ato cujas coincidências e pieguice comprometem significativamente o desfecho. Não que a primeira metade não tenha seus problemas: a recorrência de objetos como uma latinha de refrigerante ou uma bola de plástico forçam simbolismos tolos, ao passo que alguns obstáculos e desencontros vivenciados pelos personagens investem em truques que o público consegue antecipar com relativa facilidade - mas, em última instância, o senso de humanidade e compaixão entranhado nos clichês e na pieguice torna mais fácil a tarefa de perdoá-los.
Pecando por colocar os turistas como as grandes vítimas da catástrofe (quando Lucas percorre os corredores do hospital com o objetivo de promover o reencontro de familiares, se depara com uma variedade atípica de nacionalidades), O Impossível consegue evocar com vigor e competência a tragédia particular dos Bennett, mas sem ignorar a coletiva - e o melancólico olhar aéreo que encerra o longa reforça o efeito devastador não só da onda sobre aquela região, mas também do filme sobre todos nós.
