13 de maio de 2012

Assassino do Bom Senso

Mesmo ciente da necessidade iminente de estudo intenso para uma prova de Equações Diferenciais A, realizada na manhã do último sábado, estive presente essa semana nas cabines dos filmes Piratas Pirados! e Battleship - A Batalha dos Mares, aos quais dediquei boas doses de atenção e dedicação até que conseguisse publicar a crítica deste último, às 11h30 de sexta-feira. Graças a um argumento surpreendentemente ponderado de minha mãe, deixei de comparecer à sessão para a imprensa de O Exótico Hotel Marigold, o que, ainda assim, não foi suficiente para que eu chegasse ao campus na manhã de sábado suficientemente preparado para o tal exame matemático.

Evitando aprofundar em minhas risíveis habilidades de administração de tempo e estabelecimento de prioridades, resumi o pequeno dilema envolvendo faculdade e blog na última semana para ratificar que, por mais irregulares, deficientes e defasados que meus textos possam ser, eles são fruto de minha paixão por Cinema e da vontade de falar algo relevante. Desde que comecei essa atividade há uma penca de meses, produzir um conteúdo original interessante, mesmo sem um mísero centavo em troca, é um objetivo que levo bastante a sério, mesmo que - repito - o resultado não alcance necessariamente a qualidade desejável (sou obrigado a confiar nas opiniões tendenciosas de amigos). Por isso mesmo, confesso que ficaria extremamente frustrado caso alguém se apropriasse indevidamente de trechos ou da íntegra de meus textos, especialmente caso o indivíduo excluísse minha participação na produção daquele conteúdo, colocando-se como o verdadeiro autor de minhas ideias.

Aliás, permitam-me fazer uma retificação: "ficaria extremamente frustrado" não é a expressão correta para o caso. Já pude experimentar pessoalmente essa sensação de impotência quando tive um texto copiado integralmente por determinado blog - e manter os créditos não altera o fato de que, enquanto o cidadão gasta 15 segundos acionando as funções copiar e colar em seu sistema operacional, meu desempenho ruim nas Equações Diferenciais Ordinárias de Segunda Ordem se mantém intacto.


Dito isso, há pouco mais de dois meses, lia um texto de um blogueiro (cujo desconhecimento alarmante sobre Cinema e português já havia chamado minha atenção) quando, de supetão, o texto se tornou inteligente e bem escrito. Mais adiante, os problemas adolescentes de pontuação, concordância e frases mal formuladas voltaram a surgir, sendo em seguida novamente interrompidos por frases bem elaboradas e coesas, destoando completamente de todo o trabalho já publicado anteriormente pelo autor. Intrigado, dei um rápido e descompromissado pulo no Copyscape e, utilizando o serviço gratuito de rastreamento de cópias oferecido pelo site, descobri a razão de meu espanto: frases inteiras - não uma ou duas, mas várias - haviam sido extraídas de um texto publicado em um dos grandes portais de cinema do Brasil. Alguns minutos e algumas buscas depois, conclui não só que aquele não era um caso isolado, como também que a apropriação indevida era quase um padrão daquela coluna do blog. Munido de um pequeno dossiê sobre o caso, criei um tópico em um grupo de discussão no Facebook (do qual o blogueiro fazia parte) para expor os plágios (com o apoio do amigo João Marcos Flores), confiando que um grupo formado basicamente por blogueiros cinéfilos se chocaria com a atitude.

A recepção, para minha surpresa, foi morna. Alguns manifestaram um espanto contido, como se expor o comportamento reprovável de um dos participantes fosse, de certa forma, extrapolar certos limites do bom senso. O "autor" calou-se; jamais voltou a dar as caras no tal grupo de discussão. Os textos apontados na denúncia foram rapidamente apagados, e o responsável jamais se manifestou sobre o caso. Sou levado a crer que, caso minhas colocações estivessem equivocadas, essa omissão de provas não seria necessária. A velha máxima "quem não deve, não teme" encaixa-se nesse caso como uma luva.

Dias depois, uma nova postagem no blog trazia um novo plágio. Voltei ao tópico de discussão para expor a reincidência, que foi ainda menos repercutida. Para minha surpresa, passei a ser tachado de chato e por uma misteriosa obra do destino, o plagiador se tornou a vítima da situação. Vítima de perseguição por minha parte, aparentemente. Fui informado que o correto seria me dirigir ao "autor", em particular. Ora, se os únicos resultados da exposição pública da transgressão, mesmo que diminuta (o grupo era formado por pouco mais de 100 usuários, inativos em sua maioria), haviam sido a estratégica exclusão dos rastros e uma inacreditável reincidência, que efeito uma conversa em particular poderia ter?

Nenhum - é a resposta que, assim como eu, vocês devem imaginar. Afinal, antes de publicar essa postagem nessa tarde de domingo, visitei o fatídico blog e meia dúzia desses textos ainda persistem. Para mim, a explicação é óbvia: a existência desse tipo de conteúdo no blog não é algo que incomoda o "autor", desde que os leitores não tenham conhecimento de sua nefasta origem. O objetivo primordial do cidadão é aumentar o número de acessos a qualquer custo - e um texto, como todos sabem, é uma fonte natural de palavras-chave para buscadores. A obsessão em aumentar as estatísticas do blog é tamanha que o tal "autor" conseguiu algo, na minha opinião, impensável: levar um dos maiores defensores dos direitos autorais de textos na internet a conseguir-lhe um punhado de visitas.

Refiro-me, claro, a um dos mais importantes e respeitados críticos de cinema do Brasil que, inocentemente, foi induzido a convocar seus seguidores no Twitter a acessar o tal blog. A razão: o portal de cinema do qual é dono, bem como um site criado por alguns de seus ex-alunos, concorriam a uma premiação organizada pelo plagiador. O crítico, que possivelmente repudiaria a atitude do blogueiro caso tivesse conhecimento de suas ações, não tem culpa da própria inocência; afinal, como uma pessoa em sã consciência poderia suspeitar de um blog que, através de uma premiação, aparenta valorizar o esforço, a originalidade e a seriedade de outros blogueiros ou dos grandes portais, enquanto desfere-lhes apunhaladas pelas costas ao apropriar-se indevidamente de seus conteúdos?

Entretanto, por mais revoltantes que sejam a cara-de-pau do "autor", os mimos que ele recebe das distribuidoras ou a estupidez de seus leitores, o real motivo que me levou a escrever esse texto foi um comunicado impagável que recebi dele ontem, através de uma rede social de filmes. A pérola:

"Só quero informar que se mais alguma vez eu ler algum comentário negativo a meu respeito ou ao meu blog, vou dar andamento no pedido que meu advogado começou a mover contra isso".

Exatamente. Antes que eu consiga parar de gargalhar após ter lido este comunicado, estarei sendo processado, em pleno século XXI, por ter exercido meu direito constitucional de livre expressão. Um sujeito que violou direitos autorais de forma consciente e reincidente processará seu denunciante. Quando exaltei minha incredulidade quanto a essa possibilidade, recebi uma resposta ainda mais incrível, que compartilho com vocês:

"Cara até você falar o que bem entender de mim ou de quem você quiser, realmente é um direito de livre expressão, agora ameaça de morte, as coisas mudam de figura. Não sei se lembra, mas por 2 vezes eu recebi ameças de morte de sua parte, enfim foi só um recado, como você mesmo disse é de sua escolha continuar ou viver sua vida".

Aqui, a tentativa desesperada de impedir a divulgação de seus plágios atinge um nível psicótico. A invenção de uma mentira tão absurda e descabida - na forma de uma acusação gravíssima - é algo que foge da minha compreensão, como estudante de Engenharia.

Quanto a mim, aproveito a oportunidade para reafirmar minha promessa, como blogueiro cinéfilo amador, de tentar oferecer sempre um conteúdo interessante e, sobretudo, original. Terei muito mais orgulho dos meus poucos leitores do que outras pessoas por aí, com seus números expressivos alcançados por meios duvidosos - afinal, os leitores serão meus de fato.

Atualização: Pablo Villaça, um dos mais importantes e respeitados críticos de cinema do Brasil, escreveu um texto sobre o assunto, que pode ser lido aqui. Enquanto isso, alguns dos novos rastros expostos nesse texto já foram apagados. Tire suas próprias conclusões.

Atualização 2 (e, espero, última): Em publicação recente, o plagiador usou um questionável pedido de desculpas para tentar justificar suas injustificáveis ações e, novamente, colocar-se como vítima da situação. A retratação por suas ações, propriamente, foi colocada em segundo plano.

(...) fui acusado de plágio e sem saber de nada começou uma campanha contra minha pessoa e meu blog, só algum tempo depois alguns amigos me disseram que isso estava acontecendo e ai começou uma serie e ameaças e intimidação para que eu tirasse o blog do ar, o interessante é que nunca alguém chegou oficialmente ou mesmo informalmente e disse que eu estava plagiando textos (...)

De cara, evitarei detalhar meu desprezo pelo desrespeito ao português, pelas falsas acusações de ameaças e intimidações ou pela zombaria do uso da expressão "o interessante é que", focando naquilo que tenta ameaçar a reputação das minhas colocações. Repare como "sem saber de nada", "só algum tempo depois" e "nunca alguém chegou oficialmente ou mesmo informalmente e disse que eu estava plagiando" são uma afronta à verdade dos fatos, já que, como bem observei no decorrer deste texto, a primeira denúncia foi feita em um fórum que tinha o acusado como participante ativo - e como também apontei, ele imediatamente o deixou de ser, optando por adiar em meses as satisfações. E lendo suas explicações, confesso que acharia melhor se ele nunca tivesse se manifestado.

(...) as vezes a insegurança sobre alguma opinião é grande e por isso eu realmente peguei trechos para pouco menos de 15 críticas de filmes antigos mais clássicos e analises mais difíceis, sem intenção de me aproveitar do intelecto de ninguém ou mesmo querendo levar vantagem sobre isso (...)

Traduzindo: "Ciente da minha própria incapacidade de escrever sobre determinados filmes (antigos, clássicos ou de análises mais difíceis - e ainda não me decidi em qual categoria a trilogia Missão: Impossível se enquadra), ao invés de desistir de publicar posts sobre eles, optei por roubar trechos do trabalho de pessoas capazes sem pedir autorização, informá-las ou ao menos creditá-las. Fingir que ideias ou frases inteiras dos outros são de minha autoria não é um modo de levar vantagem ou de se aproveitar do intelecto alheio".

Mais do que nunca, sou levado a crer que a tal "humilhação pública" mencionada no pedido de desculpas merece o prefixo "auto", à medida que o autor do processo fica cada vez mais claro.

11 de maio de 2012

Crítica | Battleship - A Batalha dos Mares

BATTLESHIP - A BATALHA DOS MARES (Battleship)

★★

Battleship, EUA, 2012 | Duração: 2h11m10s | Lançado no Brasil em 11 de maio de 2012, nos cinemas | Escrito por Erich Hoeber e Jon Hoeber | Dirigido por Peter Berg | Com Taylor Kitsch, Alexander Skarsgård, Rihanna, Liam Neeson, Brooklyn Decker, Gregory D. Gadson, Tadanobu Asano, Jesse Plemons, Peter MacNicol e Adam Godley.

Pôster/capa/cartaz nacional de BATTLESHIP - A BATALHA DOS MARES (Battleship)- Quem assume o comando, agora? - pergunta Alex Hopper (Taylor Kitsch), quando o comandante em exercício é impedido de dar continuidade a seu trabalho durante certo confronto naval.
- A pessoa com a mais alta patente - responde um marujo.
- E quem seria essa pessoa? - retruca Hopper.
(pausa dramática)
- ...Você!

É com esse diálogo que, a certa altura de Battleship - A Batalha dos Mares, finalmente nos certificamos de algo que o longa de Peter Berg (Hancock) vinha sugerindo até então: a posição privilegiada do protagonista na hierarquia da marinha. Ainda que esse fato seja bastante esperado, é quase inevitável que o espectador compartilhe o espanto do personagem de Taylor Kitsch naquele instante, mas por outras razões: apresentado como um homem fracassado, imaturo e irresponsável, capaz de cometer um delito e causar um enorme prejuízo apenas para conquistar uma garota (e o pior: ele consegue), Alex é praticamente forçado pelo irmão, o comandante Stone Hopper (Alexander Skarsgård), a ingressar na marinha - processo este omitido por uma elipse, que nos transporta diretamente para as vésperas dos eventos centrais do longa. Porém, as circunstâncias que viabilizam a ascensão meteórica do protagonista - um homem, repito e acrescento, fracassado, imaturo, irresponsável, indisciplinado, orgulhoso e impulsivo - na carreira naval é algo que o filme jamais consegue explicar, embora seu novo corte de cabelo (a única mudança notável entre as duas fases do personagem) seja um bom ponto de partida para espectadores desocupados que quiserem bolar explicações mirabolantes para o caso.

Todavia, é fácil perceber que, caso esse prólogo nunca tivesse existido, seria muitíssimo mais fácil aceitar o cargo de tenente de Alex, bem como seu relacionamento com a fisioterapeuta Sam (Brooklyn Decker), cujo princípio abrupto em nada acrescenta à narrativa - e a importância conferida a um pênalti a ser cobrado em uma partida de futebol pelo protagonista, por exemplo, é algo que torna a introdução ainda mais embaraçosa. Dessa forma, é em meio a estas e várias outras perguntas sem boas respostas que o roteiro de Erich e Jon Hoeber nos informa que, em 2005, cientistas descobriram em algum lugar do universo um planeta com condições climáticas próximas às da Terra e, portanto, passível de abrigar formas de vida semelhantes às terráqueas. A subsequente tentativa de contato com o remoto planeta, entretanto, acaba atraindo a atenção dos alienígenas e induzindo-os a enviar um comboio de naves à Terra, que acaba precipitando em um ponto do mar próximo de onde os irmãos Hopper e outros marinheiros desempenham um treinamento naval. Porém, em pouco tempo, os marujos descobrem que a missão dos extraterrestres não é exatamente pacífica, o que desencadeia um confronto armado explosivo e barulhento.

Aliás, para início de conversa, a tal missão dos invasores jamais fica clara - e isso não seria um grande problema caso o roteiro não tentasse dar explicações supostamente definitivas. Vista pelos humanos como uma versão em nível interplanetário da chegada de Colombo às Américas, a invasão e seus consequentes conflitos parecem, na verdade, um misto nocivo de mal-entendido com estupidez: colocando-nos repetidas vezes no ponto de vista dos alienígenas e de suas máquinas, o filme deixa bem claro o zelo da raça visitante com a espécie humana, o que fatalmente contradiz sua decisão de destruir impiedosamente navios tripulados ou causar certos danos à infraestrutura de cidades que, indiretamente, poderiam resultar em acidentes fatais para seus habitantes. Por outro lado, a hostilidade dos invasores é relativizada quando a interface alienígena nos adverte que o arsenal terráqueo só faz parte de seus alvos caso lhes ofereça um perigo evidente - isto é, esteja apontado na direção deles -, mas a regra não é mantida em tempo integral e vai contra o discurso de "aproximação da extinção humana" que o filme tenta martelar como uma verdade indiscutível na cabeça do espectador. Dessa forma, pela incoerência e falta de diálogo entre as partes (apesar, claro, das tentativas dos humanos), Battleship acaba parecendo uma versão de Marte Ataca! que se leva a sério demais.

Taylor Kitsch BATTLESHIP - A BATALHA DOS MARES (Battleship)

Claro que, no fundo, há uma explicação muito boa para a estupidez dos alienígenas superar a dos humanos: criar um equilíbrio de forças na batalha, já que os visitantes possuem uma clara dianteira. Assim, somos obrigados a aceitar que habitantes de um planeta com atmosfera e distância solar equivalentes às da Terra deparem-se com condições físicas adversas por aqui ou que lutem de igual para igual com seres humanos mesmo munidos de robustas armaduras metálicas, bem como a facilidade com que são derrotados por um sujeito que interpreta erroneamente os ensinamentos de A Arte da Guerra. No quesito inteligência, todavia, os humanos não ficam muito atrás - e os maiores ofendidos pelos roteiristas provavelmente são as forças armadas dos Estados Unidos, que parecem incapazes de notar a intensa e suspeita movimentação alienígena em certo terreno, cabendo, portanto, a três cidadãos indefesos a tarefa de se desdobrarem para alertar Hopper sobre a situação - o que coloca nas mãos de uma tripulação presa em alto-mar por uma barreira de energia a única esperança de salvação do mundo. Os atores, claro, se esforçam para transmitir uma sensação de relevância e urgência: enquanto o veterano Liam Neeson surge sempre sisudo e deferindo ordens em suas poucas aparições como o Almirante Shane, o azarão Taylor Kitsch confere a Alex a mesma energia e intensidade que o fez ao personagem-título de John Carter: Entre Dois Mundos, ao passo que qualquer suposição sobre o futuro da carreira da cantora Rihanna no Cinema é absolutamente tola, já que a atriz coadjuvante é tão pau-mandado quanto sua personagem (que, evidentemente, foi construída em torno da persona cinematográfica estabelecida por Michelle Rodriguez ao longo dos anos).

Enquanto isso, os efeitos especiais se adequam bem ao investimento de produção, mas revelam-se irregulares, por exemplo, na movimentação frenética dos discos destruidores, na concepção dos alienígenas (que, não à toa, dão as caras em poucas ocasiões) ou sempre que muitas camadas de informações visual se sobrepõem na tela. Já o design das naves e o desempenho de seus mecanismos surgem como uma distração desnecessária que constantemente despertam más recordações de Transformers, ao passo que as cenas de ação, mesmo com toda a intensidade e destruição, mostram-se mais aborrecidas do que o ideal - com exceção, talvez, daquela envolvendo um encouraçado, que se destaca por exigir uma dinâmica maior e mais interessante da tripulação. Ademais, a forma encontrada pelos produtores para relacionar o filme com o jogo de Batalha Naval no qual é vagamente inspirado é até curiosa, mas acaba sabotada pela construção falha da sequência que a acolhe graças ao emprego abusivo de arbitrariedade para alcançar o sucesso do ataque remoto do Capitão Yugi Nagata (Tadanobu Asano) ao inimigo.

Juntando-se à trilogia Transformers no homogêneo grupo de produções descerebradas oriundas de produtos da Hasbro (que, agora, tem até sua própria vinheta no início do filme), Battleship - A Batalha dos Mares é um desanimador indício da inabilidade da empresa de brinquedos em contribuir artisticamente para o Cinema - e digo isso com base não só na risível cena pós-créditos, que deixa um gancho terrivelmente óbvio para uma possível continuação, mas também em temores sobre o que poderia ser realizado caso a Hasbro estendesse sua obsessão por alienígenas para a adaptação de outros de seus produtos. Já consigo até imaginar a quebradeira entre corretores terráqueos e banqueiros intergaláticos robotizados em Monopoly - O Filme.

BATTLESHIP - A BATALHA DOS MARES (Battleship)

10 de maio de 2012

Crítica | Piratas Pirados!

PIRATAS PIRADOS! (The Pirates! Band of Misfits)

★★★★

The Pirates! Band of Misfits, Reino Unido/EUA, 2012 | Duração: 1h28m56s | Lançado no Brasil em 11 de maio de 2012, nos cinemas | Baseado no livro de Gideon Defoe. Escrito por Gideon Defoe | Dirigido por Peter Lord | Com as vozes de Hugh Grant, Martin Freeman, David Tennant, Imelda Staunton, Russell Tovey, Brendan Gleeson, Ashley Jensen, Lenny Henry, Jeremy Piven, Salma Hayek e Brian Blessed.

Pôster/capa/cartaz nacional de PIRATAS PIRADOS! (The Pirates! Band of Misfits)
Após lançar dois ótimos e bem sucedidos longas estrelados por bonecos de plasticina (nome técnico para massa de modelar, ou simplesmente massinha) com um intervalo de cinco anos entre eles, o tradicional estúdio britânico Aardman Animations voltou seus esforços criativos para a animação computadorizada e lançou, em 2006, o bom Por Água Abaixo e, mais recentemente, o ótimo Operação Presente. O elevado padrão de qualidade mantido nesses últimos lançamentos, porém, não foi suficiente para evitar que o afastamento do estúdio da técnica que o consagrou (o stop-motion) fosse acompanhado por um comportamento semelhante do público em relação aos filmes e, assim, ambos amarguraram resultados insatisfatórios nas bilheterias mundiais. Agora, sete anos após nos presentear com Wallace & Gromit - A Batalha dos Vegetais, seu segundo e até então último longa em stop-motion, a Aardman retorna às suas raízes com Piratas Pirados!, uma produção que cumpre muitíssimo bem a promessa de divertir e impressiona pela riqueza e pelo preciosismo do design de produção.

Escrito por Gideon Defoe com base em seu próprio livro, o filme gira em torno dos esforços do desastrado Capitão Pirata (Hugh Grant) para vencer o concurso de Pirata do Ano, título concedido àquele comandante que obtiver um acúmulo de tesouros superior ao dos demais concorrentes. Azarados em suas sucessivas tentativas de surrupiar riquezas de outras embarcações, o Capitão e sua esforçada tripulação, formada por tipos curiosos como o ingênuo Pirata Albino (Russell Tovey) ou o esquivo Pirata Espantosamente Curvilíneo (Ashley Jensen), acabam trombando com Charles Darwin (David Tennant) que, em uma de suas primeiras expedições, não possui em seu navio nenhum objeto cujo valor supere o puramente científico. Entretanto, prestes a perder as esperanças, o Capitão Pirata vê uma luz no fim do túnel quando o cientista lhe informa que sua fiel e gorducha companheira Polly não é um papagaio, mas uma espécie rara e ameaçada de extinção cuja descoberta seria digna de uma grande riqueza como premiação em uma convenção de cientistas realizada em Londres. Com isso, toda a trupe desponta para a capital inglesa, onde seus interesses acabarão entrando em conflito com a obsessão por espécies raras e o ódio por piratas da Rainha Vitória (Imelda Staunton).

Repetindo o feito dos filmes anteriores, Piratas Pirados! consegue entreter crianças e adultos com sua vasta galeria de gags, que não deixa de incluir referências que só os mais velhos compreenderão - com o destaque óbvio para a participação de versões modificadas de figuras históricas, de Charles Darwin e Jane Austen a Joseph Merrick, o Homem Elefante (o fato de nem todos serem contemporâneos é uma liberdade artística que certamente será notada por um número ainda menor de espectadores). Além disso, o diretor Peter Lord e sua equipe voltam a brincar despretensiosamente com a metalinguagem, desde os vários momentos em que somos despertados para o fato de a trilha sonora estar sendo executada, na realidade, por um dos piratas da tripulação, até outras sacadas isoladas, mas não menos divertidas, como a ganância do Capitão Pirata sendo ressaltada por um típico som de máquina registradora, que descobrimos logo em seguida existir de fato no universo diegético do filme. Para completar, os realizadores são incrivelmente bem sucedidos nas gags envolvendo o chipanzé Sr. Bobo e suas plaquinhas de comunicação, que surpreendem por passar de forma bem humorada as mesmas emoções que seriam transmitidas caso o animal falasse: como exemplo, podemos citar a mudança de tom em um diálogo (ao acatar uma solicitação do dono e substituir um "MAS..." por um "mas..."), a dramaticidade de certa ocasião (como a ênfase dada a um "Tchan" em um momento de suspense teatral), ou até a representação da surpresa do próprio símio diante de circunstâncias inesperadas (como é o caso da interjeição formada pelos cartões caindo em um alçapão).

PIRATAS PIRADOS! (The Pirates! Band of Misfits)

Como não poderia deixar de ser, a expressividade do Sr. Bobo e de todos os demais personagens jamais decepciona, impressionando especialmente pela atenção voltada para os pequenos detalhes: repare, por exemplo, como Polly move suavemente as pálpebras quando é afagado por seu dono, ou a divertida apreensão do Pirata Curvilíneo sempre que sua verdadeira identidade parece prestes a ser revelada. Aliás, o próprio design dos personagens parece ter sofrido um grande avanço em relação aos demais filmes (ignorando, evidentemente, Operação Presente, que fugia completamente dos designs clássicos da Aardman), abrindo mão das bocas excessivamente largas e dos olhos grudados em prol de formas mais harmônicas e simpáticas, ainda que bastante estilizadas. Enquanto isso, a direção de arte se revela um espetáculo à parte, desde os exuberantes salões do palácio real até as elaboradas embarcações - e tamanha é a riqueza de detalhes que o filme concede uma segunda chance aos espectadores de desbravar as paredes dos cenários durante os créditos finais.

Misturando elementos de faroeste, ação e muita comédia, Defoe cria uma narrativa leve e fluida que toma como base a amizade e a fidelidade da tripulação do Capitão Pirata, vistas nos rostos e na dedicação quase cega de todos eles ao seu comandante. Além disso, o roteirista mantém a narrativa sempre em movimento, evitando passagens desnecessárias e não abrindo mão de suas ideias diante de desafios que o stop-frame possa oferecer. Nesse sentido, os artistas da Aardman sempre procuram soluções para evitar que as limitações da técnica prejudiquem a parte criativa do filme (a barba vistosa do protagonista, por exemplo, só foi possível graças a um sistema recente e avançado de modelagem de bocas intercambiáveis), mas em casos extremos, acabam tendo que recorrer à animação computadorizada, como é o caso da água, de alguma ação vista em segundo plano ou da mistura expansiva que desempenha um papel decisivo no clímax do filme. Por fim, Defoe acerta ao criar uma resolução que independe de fatalismos, apostando em uma série de eventos que culminam em uma conclusão mais do que adequada à natureza dos personagens.

Brincando ainda com a representação de viagens em mapas de uma forma semelhante àquela vista recentemente em Os Muppets e contando com cenas de ação brilhantemente orquestradas, Piratas Pirados! prova que o stop-motion, uma das mais antigas e artesanais técnicas de animação, ainda pode nos trazer grandes alegrias - e é uma imensa satisfação perceber que a Aardman, entrando em sua quinta década de existência e já tendo experimentado as vantagens da animação computadorizada, continua empenhada em gastar, em média, uma semana para que cada unidade produza quatro segundos de filme (conforme informações do próprio estúdio) para nos brindar com seus charmosos personagens e suas divertidas e empolgantes histórias.

PIRATAS PIRADOS! (The Pirates! Band of Misfits)

2 de maio de 2012

Crítica | Os Vingadores - The Avengers

Chris Hemsworth, Robert Downey Jr. e Chris Evans em OS VINGADORES - THE AVENGERS (The Avengers)

★★★★

The Avengers, EUA, 2012 | Duração: 2h22m11s | Lançado no Brasil em 27 de abril de 2012, nos cinemas | História de Zak Penn e Joss Whedon. Roteiro de Joss Whedon | Dirigido por Joss Whedon | Com Robert Downey Jr., Chris Evans, Chris Hemsworth, Scarlett Johansson, Jeremy Renner, Mark Ruffalo, Tom Hiddleston, Samuel L. Jackson, Clark Gregg, Stellan Skarsgård, Gwyneth Paltrow, Cobie Smulders e a voz de Paul Bettany.

Pôster/capa/cartaz nacional de OS VINGADORES - THE AVENGERS (The Avengers)
Caso não fosse uma ideia oriunda dos quadrinhos, a reunião de vários super-heróis famosos em um mesmo filme não seria um conceito muito difícil de ser alcançado pelas mentes criativas de Hollywood. Afinal, com os personagens já tendo sido devidamente apresentados em filmes individuais de sucesso, a convergência de suas histórias se torna uma decisão quase instintiva e certamente repleta de vantagens: os públicos (fora as intercessões, é claro) são somados, os acertos de cada um podem ser reprisados e a presença de vários personagens fortes dividindo a cena - alguns deles antes tidos como protagonistas - confere uma aura de grandiosidade ao projeto, transformando a reunião quase em um evento por si só. Felizmente, o diretor e roteirista Joss Whedon (Serenity - A Luta Pelo Amanhã) abraça com competência essas possibilidades mencionadas e transforma Os Vingadores em um filme de ação alucinante, ainda que peque por lançar mão do excesso de personagens e das tentativas de humor em detrimento da lógica e da razoabilidade de determinadas passagens.

Escrito por Zak Penn e pelo próprio Joss Whedon com base nas HQs criadas por Stan Lee e Jack Kirby, o longa tem início quando uma instalação militar-científica da S.H.I.E.L.D. é invadida pelo deus Loki (Tom Hiddleston), que, em sua busca desenfreada por poder, rouba o poderoso cubo Tesseract e domina as mentes do cientista Selvig (Stellan Skarsgård) e do arqueiro Clint Barton (Jeremy Renner) através de um tipo particular de magia. Temendo o possível desastre que a posse do artefato pelo vilão pode causar, o coronel Nick Fury (Samuel L. Jackson) tenta reunir algumas das mais heroicas, habilidosas e poderosas pessoas do planeta para deter Loki e resgatar o Tesseract antes que este seja usado contra a humanidade - e não demora muito para que, motivados por um objetivo em comum, passem a trabalhar juntos o playboy bilionário Tony Stark (Robert Downey Jr.), sob a armadura do Homem de Ferro, o ex-soldado Steve Rogers (Chris Evans), mais conhecido como Capitão América, o deus do trovão Thor (Chris Hemsworth), irmão adotivo de Loki, o cientista Bruce Banner (Mark Ruffalo), que em momentos de fúria e descontrole se torna o monstruoso Hulk, a habilidosa espiã Natasha Romanoff (Scarlett Johansson), também conhecida como Viúva Negra, e o então consciente Gavião Arqueiro, codinome do agente de elite Clint Barton.

Todavia, os temperamentos e alguns objetivos díspares impedem que a convergência das trajetórias dos heróis transcorra espontaneamente - e é curioso que a primeira vez em que Homem de Ferro, Thor, Capitão América, Hulk, Viúva Negra e Gavião Arqueiro dividem de fato a cena só ocorre já no terceiro ato da projeção. Assim, o roteiro de Whedon acerta ao dedicar uma boa dose de atenção à hesitação de Bruce Banner diante da convocação de Romanoff (repare as sugestivas manchas de tinta verde nas paredes do barraco onde esta cena transcorre), à chegada de Thor à Terra e seu embate com o Homem de Ferro e o Capitão América ou ao crescente desentendimento entre os personagens na nave porta-aviões da S.H.I.E.L.D., culminando em uma colaboração motivada essencialmente pelas forças das circunstâncias, pelo instinto de sobrevivência e pela bússola moral de cada um deles. É uma pena, portanto, que reviravoltas absurdas no comportamento de alguns dos heróis acabem comprometendo o arco narrativo, com destaque especial para a transformação abrupta de Hulk ocorrida em um momento-chave de Os Vingadores: apresentado pelo próprio filme como uma criatura agressiva e descontrolada, que não consegue sequer distinguir aliados de inimigos, o personagem se torna um ser consideravelmente prudente de uma hora para outra, assumindo de vez o aguardado papel de super-herói - algo que o roteiro parece tentar explicar de forma rasteira através de um diálogo pouco esclarecedor que antecede a mudança comportamental. Em menor grau, também é triste ter que assistir a Loki, tido como um deus sábio e perspicaz, abaixando suas defesas e desdenhando do monstro verde, algo descaradamente incluído apenas como pretexto para uma cena com claras motivações cômicas.

Chris Evans, Robert Downey Jr. e Samuel L. Jackson em OS VINGADORES - THE AVENGERS (The Avengers)

E já que mencionei isso, vale ressaltar que as inserções de humor no filme nem sempre apresentam uma organicidade adequada. Agregando os aspectos cômicos vistos em Thor e nos dois Homem de Ferro e expandindo-os para praticamente todos os personagens, Whedon constrói uma infinidade de gags que, mesmo funcionando bem na maioria das situações, saltam aos olhos sempre que ferem a lógica em detrimento da graça, como na cena em que Thor defende vigorosamente o meio-irmão e, após descobrir suas ações malignas recentes, solta um ágil "Ele é adotado!", num misto inexplicável de constrangimento e espirituosidade. Da mesma forma, a inesperada descarga de adrenalina de Hulk sobre o deus do trovão durante a batalha do clímax é uma opção absolutamente óbvia e forçada de humor e que apenas ressalta a tentativa desesperada dos realizadores de construir um Hulk cômico, ao passo que os já conhecidos egocentrismo e arrogância de Tony Stark, as constatações e lamentações de Bruce Banner sobre sua própria condição e as tiradas pontuais do retrógrado Steve Rogers conseguem ser tão divertidos e eficientes quanto as brincadeiras feitas com os excepcionais métodos de investigação e interrogatórios da Viúva Negra.

Porém, é nas cenas de ação que Os Vingadores se supera como um entretenimento de peso: intensas, bem coreografadas e repletas de destruição, as sequências utilizam bem os elementos dos cenários e as habilidades particulares de cada personagem, sendo beneficiadas ainda pela eficiência homogênea dos efeitos especiais. Entretanto, por mais interessante que seja acompanhar aqueles heróis se enfrentando, lutando lado-a-lado ou somando seus poderes, é inegável que a aparente invulnerabilidade dos Vingadores cause uma carência de tensão, perigo e urgência nos embates, o que naturalmente diminui nosso investimento emocional naquelas sequências - e a situação não melhora nem quando um deles é avisado que estará embarcando em certa "viagem apenas de ida" segundos após tomar uma decisão altruísta, já que a afirmação se revela completamente mentirosa. Além disso, o excesso de personagens acaba sendo constantemente usado como um pretexto para ressurgimentos arbitrários sempre que um confronto parece além da capacidade de um ou mais personagens - e no meio disso tudo, nem o curioso plano-sequência que percorre os ares de Nova York e flagra cada um dos heróis em ação consegue se salvar, já que acaba ressaltando a improbabilidade e a conveniência de os embates ocorrerem tão próximos uns dos outros. Ainda nesse sentido, o filme acaba apelando para decisões pouco criativas para equilibrar as colaborações de cada integrante do grupo no clímax, de modo que os humanos comuns e desfavorecidos dentre os Vingadores (isto é, a Viúva Negra e o Gavião Arqueiro) acabam sendo submetidos a estripulias excessivamente arriscadas e pouco críveis.

Decepcionante em sua versão em 3D (o que não é nenhuma novidade, já que foi submetido ao processo de conversão), Os Vingadores estabelece o grupo de super-heróis como uma ótima promessa para o futuro das adaptações da Marvel, a julgar que, à primeira vista, os filmes individuais desses personagens podem estar condenados pela provável demanda desmedida por justificativas para que cada herói enfrente seus antagonistas sem a ajuda de suas novas e eficientes parcerias. Se todo esse esforço criativo fosse direcionado para novas aventuras dos Vingadores, acredito que poderíamos esperar boas surpresas vindas da equipe do coronel Fury.

Obs.: há uma cena adicional durante os créditos finais, além de mais uma extra ao final da projeção (adicionada às pressas na véspera do lançamento e, por isso, ausente em boa parte das cópias).

Tom Hiddlestone em OS VINGADORES - THE AVENGERS (The Avengers)