
★★
Dr. Seuss' The Lorax, EUA, 2012 | Duração: 1h26m14s | Lançado no Brasil em 30 de março de 2012, nos cinemas | Baseado no livro de Dr. Seuss. Escrito por Ken Daurio e Cinco Paul | Dirigido por Chris Renaud e Kyle Balda | Com as vozes de Zac Efron, Danny DeVito, Ed Helms, Taylor Swift, Rob Riggle, Betty White, Jenny Slate.

Escrito por Ken Daurio e Cinco Paul, o filme se divide em duas linhas narrativas para desvendar os mistérios por trás do estilo de vida dos habitantes de Sneedville, uma cidade altamente artificial e sintética cuja economia é movida fundamentalmente pela venda de ar puro, mercado este monopolizado pelo ganancioso e diminuto Sr. O'Hare (Rob Riggle). Nesse contexto, o jovem Ted (Zac Efron), empenhado em conquistar a bela Audrey (Taylor Swift), decide atravessar a imponente muralha fronteiriça da cidade em busca de uma árvore de trúfula (planta cuja copa é formada por uma pelagem insuperavelmente macia e colorida) para presentear a garota, mas se choca ao encontrar campos marcados pela desolação e ausência de vida. Temendo os malefícios que a fotossíntese das árvores poderia trazer para seus negócios, O'Hare faz de tudo para dificultar os planos de Ted, que, seguindo uma sugestão da vovó Norma (Betty White), encontra além do perímetro da cidade uma solitária e triste casa na qual vive um homem com uma história - e aí entramos na segunda linha narrativa, dedicada ao relato de como uma invenção e a ambição de um jovem chamado Umavez-ildo (Ed Helms) aniquilaram todas as formas de vida das redondezas de Sneedville.
E o tal Lorax (Danny DeVito), como se encaixa nessa história? Bem, a razão para o personagem-título não ter sido mencionado até então é clara e simples: ele pouco aparece ao longo da projeção e praticamente não influencia o comportamento dos personagens ou os rumos da narrativa. Apresentando-se como guardião da floresta, o ser alaranjado, baixinho e bigodudo só aparece com sua missão ambientalista minutos após Umavez-ildo cortar uma árvore de trúfula para usar a macia e sedosa pelagem da planta como matéria-prima do protótipo de Sneed, invenção que muda os rumos de sua vida e cuja versatilidade abusa da boa vontade do espectador. Porém, dotado de um poder de persuasão ineficaz e aparentemente livre de habilidades mágicas que auxiliem em sua tarefa, o Lorax é um personagem basicamente descartável cujo único esforço real para deter a destruição do ecossistema que deveria proteger consiste na absurda decisão de jogar Umavez-ildo e sua cama num rio, vindo a salvá-lo da morte de forma quase involuntária. Por essas e outras, é natural que os "esforços" do guardião sejam vencidos pela pressão e ganância da interesseira família do inventor e pela estupidez surreal do processo extrativista adotado para os negócios - e por mais que o roteiro pareça tentar convencer o público que o envolvimento posterior do jovem Ted na causa ambiental fazia parte de um plano maior (e talvez premeditado) do Lorax ou algo parecido, é inexplicável que nenhuma atitude a respeito da devastação tenha sido tomada ao longo de décadas e é difícil ignorar que a principal motivação do garoto para proteger a última esperança de sobrevida das trúfulas não tem nada de altruísta, enfraquecendo ainda mais a batida mensagem ecológica - que, por sinal, já havia sido trabalhada de forma bastante semelhante (porém com muito mais inteligência) em outro longa de animação, WALL•E.

E já que citei a existência de similaridades entre O Lorax e o filme da Pixar, não poderia deixar de mencionar que a apropriação descarada de elementos oriundos de outras animações é recorrente e deselegante - e assim, salta aos olhos ver uma idosa surpreendendo a todos e revelando uma desenvoltura descomunal no snowboard (bem como a Vovozinha em Deu a Louca na Chapeuzinho) assim como o Sr. O'Hare se estabelecendo como uma versão masculina e vilanesca da estilista Edna Moda de Os Incríveis. Ainda nesse sentido, é necessário um esforço desmedido para não lembrar das lesmas cantoras de Por Água Abaixo (ou até mesmo do trio de roedores de Alvin e os Esquilos) sempre que os peixes cantores surgem em cena, já que suas similaridades se estendem desde a forma como executam suas intervenções na narrativa até o modo como suas vozes são destoadas digitalmente.
Os animais que habitam o Vale da Trúfula, aliás, recebem uma atenção especial dos animadores e demais artistas - e não é pra menos, já que tantos os tais peixes cantores quanto os barbalutes (espécie de ursinhos) ou os cisnes cismados exibem traços milimetricamente pensados para encantar o público e desviar a atenção do vácuo criativo deixado pela falta de assunto do roteiro. Assim, além de contar com um ou dois indivíduos propositalmente mais engraçadinhos que os demais (há um filhotinho de barbalute e um pequeno cisne vesgo), a fauna do Vale da Trúfula protagoniza uma infinidade de cenas avulsas e irrelevantes que, bem como aquelas envolvendo os minions em Meu Malvado Favorito, apenas incham o filme e desperdiçam um tempo precioso que poderia ser empregado no desenvolvimento da trama. Já o design dos personagens, mesmo sem aderir ao biotipo característico das criações de Dr. Seuss (com exceção, talvez, de Umavez-ildo e dos peixes cantores), abusa de traços caricatos e desproporções (algo usual em animações), enquanto o design de produção faz um bom trabalho na concepção do universo excêntrico, dominado por uma variedade de cores, curvas e formas assimétricas que remetem à eficiente Quemlândia de Horton e o Mundo dos Quem! Por fim, o uso de 3D não se baseia em sutilezas e traz objetos saltando "para fora" da tela sempre que possível, chegando ao cúmulo de se valer da concentração do espectador num plano fechado de uma cena mais calma para fazê-lo saltar na poltrona quando um objeto inesperado literalmente brota de uma parede e desponta veloz na direção da "câmera".
Repleto de piadas deslocadas e batidas (pense em uma gag envolvendo uma cena de ação movimentada e um elevador abarrotado de pessoas sendo usado como rota de fuga. Pensou? Pois é - ela existe aqui) dividindo espaço com números musicais moderadamente satisfatórios, O Lorax: Em Busca da Trúfula Perdida é, em última instância, um filme de promessas não cumpridas: o personagem-título deveria ser importante e não é; o veículo da família de Umavez-ildo abrindo-se como uma nave alienígena deveria ter algum sentido, mas não tem; uma semente caindo dentro de um garrafão que rola morro abaixo misturado a vários outros idênticos deveria gerar certa dificuldade de resgatá-la, mas não é o que acontece; se "ar puro" engarrafado faz tanto sucesso, era de se esperar que os habitantes de Sneedville sofressem com a atmosfera da cidade, mas não é o que vemos. Mas principalmente: os produtores e roteiristas de Meu Malvado Favorito e Horton e o Mundo dos Quem! poderiam ter repetido o feito deste último, mas acabaram honrado a memória do primeiro - e quem sai perdendo, claro, é o público.
Obs.: O Lorax: Em Busca da Trúfula Perdida é o primeiro filme a trazer a nova vinheta da Universal Pictures em comemoração do centenário da empresa. A anterior era utilizada desde 1996.
