20 de janeiro de 2012

Crítica | A Música Segundo Tom Jobim

por Eduardo Monteiro

A Música Segundo Tom Jobim, Brasil, 2012 | Duração: 1h24m26s | Lançado no Brasil em 20 de Janeiro de 2012, nos cinemas | Roteiro de Miucha Buarque de Holanda e Nelson Pereira dos Santos | Dirigido por Dora Jobim e Nelson Pereira dos Santos.

Não sou um grande conhecedor da vida e obra de Tom Jobim. Aliás, arrisco-me a dizer que, antes de ir ao cinema ver A Música Segundo Tom Jobim, seria incapaz de reconhecer sua fisionomia ou até mesmo apontar com plena convicção alguma composição de sua autoria, mesmo que soubesse reconhecer sua importância para a música brasileira. Contudo, após assistir ao filme, fui acometido por poucas mudanças: não tenho nenhum tipo de receio em afirmar que Garota de Ipanema ou Águas de Março foram compostas por Jobim, tenho uma boa noção do alcance internacional de suas letras e melodias e conheço, por alto, aquilo que há de mais importante em sua obra, mas continuo sem um maior conhecimento sobre sua vida e ainda não reconheceria o artista caso o visse em alguma fotografia.

Dirigido por Nelson Pereira dos Santos e Dora Jobim (neta de Tom), o documentário musical faz um levantamento da carreira de Antônio Carlos Jobim através de imagens de arquivo - sejam elas fotográficas ou audiovisuais - de diversos artistas interpretando as canções do compositor, além dele próprio, e... só. Sem qualquer tipo de narração e tendo as interferências textuais limitadas aos créditos iniciais e finais, o filme transfere para o público a tarefa de atribuir sentido e significado àquela colcha de retalhos, cuja apreciação depende intimamente da imersão do espectador na experiência sensorial oferecida pela coletânea.

Sem uma estrutura facilmente identificável, o filme salta de um número musical para o outro sem muito critério, jamais informando ao espectador o intérprete, a canção ou o ano de cada apresentação. Desse modo, o longa torna-se particularmente frustrante para os leigos, que não conseguem acompanhar com o mesmo prazer o desenrolar das apresentações e são obrigados a tentar extrair informações fundamentais sobre as imagens através de indícios contidos nelas, como a qualidade de som e imagem ou o surgimento de equipamentos ou penteados que denunciem a época em que foram registradas - ou em último caso, aguardamdo a chegada dos créditos finais, quando então todas as informações fundamentais sobre as participações finalmente são listadas. Como exemplo, cito a antologia que reúne as mais variadas versões do mega sucesso Garota de Ipanema, que reserva para seu final um dueto de Jobim com um artista cuja importância supus justamente pela forma como a apresentação fora encaixada ali, mas tive que esperar os créditos para descobrir que se tratava de ninguém menos que Frank Sinatra.

Além disso, mesmo que não seja sua proposta, o documentário parece tentar pincelar algumas passagens da vida de Tom Jobim, mas estas nunca ficam muito claras (novamente, do ponto de vista de um leigo), já que pequenos bilhetes ou anotações que vez ou outra dominam a tela não possuem uma caligrafia legível o bastante e fotografias ou imagens de Jobim fora dos palcos raramente ganham mais que alguns segundos na tela e na maioria das vezes não dizem muita coisa, necessitando então de uma narração que poderia esclarecer como todo aquele quebra-cabeça se forma e qual sua importância para a carreira musical do cantor. Dessa forma, saí do cinema com a nítida impressão que a carreira de Jobim se resumiu a: ficar famoso rápido, partir para a carreira internacional, voltar para o Brasil, fazer parcerias diversas e envelhecer do dia para a noite - e ainda não sei onde encaixar a construção de Brasília (que recebe um certo destaque) nessa história toda.

Porém, o documentário é suficientemente eficiente naquilo que se propõe: oferecer ao público uma oportunidade de apreciar a grandiosidade das músicas escritas por Jobim. Desse modo, é delicioso ver a sintonia do cantor em suas parcerias com Elis Regina ou Vinícius de Morais, assim como observar o interesse e a admiração que o trabalho do compositor despertou em artistas internacionais, que acabaram motivados a adaptar as letras ou o ritmo das músicas para a realidade cultural de seus países, estilos ou épocas ou até mesmo a interpretar as músicas em suas versões originais, num esforçado e irregular português que diverte e encanta, por exemplo, a plateia da canadense Diana Krall, durante uma apresentação ao vivo no Rio de Janeiro.

Não fosse o bom trabalho de pesquisa e restauração do material selecionado, A Música Segundo Tom Jobim poderia facilmente passar direto pelos cinemas e ser vendido por vinte e nove e noventa no varejo mais próximo, e certamente animaria festas ou marcaria presença na coleção de quaisquer brasileiros dotados de bom gosto musical. Tom Jobim é inegavelmente um grande nome da música brasileira, mas isso não é desculpa para endeusar sua carreira e imagem a ponto de tomar como verdade citações como aquela que surge logo antes dos créditos finais e justifica o documentário: "A linguagem musical basta". Mais de cem anos de Cinema, dos quais o próprio documentário agora passa a fazer parte, estão aí para provar que por mais poética que a colocação seja, ela não é das mais brilhantes - ao menos do ponto de vista cinematográfico.