
As Aventuras de Agamenon - O Repórter, Brasil, 2012 | Duração: 1h19m15s | Lançado no Brasil em 6 de Janeiro de 2012, nos cinemas | Roteiro de Marcelo Madureira e Hubert | Dirigido por Victor Lopes | Com Hubert, Marcelo Adnet, Luana Piovani, Pedro Bial, Marcelo Madureira, Ruy Castro, Luiz Carlos Miele, Alcione Mazzeo, Paulo Coelho, Gulhermina Guinle, Tonico Pereira, Russo e a narração de Fernanda Montenegro.
Adotando uma estrutura que mescla (bondade minha) documentário com ficção, o filme se propõe a contar a história do jornalista fictício Agamenon Mendes Pedreira (Adnet, na fase jovem, e Hubert, na fase adulta), uma espécie de Forrest Gump brasileiro: mentalmente desfavorecido, o sujeito participa (certas vezes, de forma ativa) de diversos momentos da história mundial recente enquanto interage com o robô (talvez seja um ser humano, mas não posso precisar) Pedro Bial ou, mais diretamente, com a esposa Isaura (Piovani) e o psicoproctologista... er... Jacintho Leite Aquino Rêgo (Madureira), ambos inseridos exclusivamente para encaixar piadas sobre, respectivamente, traição e exame de próstata.
Episódico como uma sitcom repleta de pequenos esquetes, o longa dirigido por Victor Lopes sequer tenta disfarçar a linguagem televisiva enraizada e a própria falta de objetivo e limita-se a entregar um torturante episódio estendido de Casseta & Planeta (como não associar, por exemplo, as geringonças mirabolantes às Organizações Tabajara?), utilizando a profissão de seu protagonista como pretexto para abraçar todo e qualquer fato histórico que permita uma ou duas piadas. Incapazes de perceber que insinuações sobre tamanho do pênis não são a forma mais sofisticada de se fazer humor, Hubert e Madureira (que passaram - pasmem! - dois anos desenvolvendo o roteiro) não se intimidam nem mesmo em inserir grandes desastres dentre os eventos comicamente presenciados por Agamenon, rebaixando fatos como o ataque ao World Trade Center, a bomba atômica detonada em Hiroshima ou a morte da princesa Diana a situações dignas de chacota.
Dessa forma, adequando o desenvolvimento (bondade minha) da história à demanda por piadas, o diretor e os roteiristas criam uma verdadeira bagunça cinematográfica que, até para os padrões do próprio filme, assusta pela incoerência e pelo excesso de pontas soltas (como relacionar de forma coerente, por exemplo, o assassinato visto no começo do filme com os acontecimentos do desfecho?). Além disso, ignorando os óbvios problemas de ritmo (um clímax até é esboçado, mas o longa logo é encerrado de forma abrupta - o que no fundo acaba sendo um alívio), o filme apresenta uma série de problemas de linguagem, algo que não surpreende por tratar-se de um filme derivado de uma coluna escrita do Jornal O Globo produzida para o cinema por incompetentes - e repare, por exemplo, como o relato da infância de Agamenon se enquadraria perfeitamente em um show de stand-up ("Quando eu era criança, era tão pobre que todo mundo lá em casa usava uma roupa só: o vestido de noiva da minha mãe" - pausa para risos da plateia) mas, transformado em audiovisual, torna-se algo embaraçosamente sem graça.
Para piorar, a mediocridade dos roteiristas volta a ficar evidente quando uma série de piadas, que já eram sofríveis a princípio, são repetidas sem pudor algum ao longo do próprio filme, desde citações a fatos ou personalidades em épocas anteriores às suas existências até as recorrentes sugestões de que certos xingamentos são na verdade elogios. Além disso, a insistência em exibir seus personagens repetindo os próprios nomes, concebidos através de trocadilhos infantis (como o já citado Jacintho Leite Aquino Rêgo ou o Barão do Pau Barbado), só não é mais irritante que a importância dada à mediocridade da imprensa marrom brasileira, desde a ressurreição do caso do jogador Ronaldo com os travestis (céus, alguém ainda se importa com isso?) até as diversas menções ao Big Brother Brasil, possibilitadas graças à participação vexatória do apresentador Pedro Bial. E como se isso não fosse suficiente para datar o humor do filme, Hubert e Madureira ainda inserem paródias desconexas a produções nacionais (Bruna Surfistinha, Chico Xavier e Cidade de Deus), que certamente deixariam orgulhosos os americanos Aaron Seltzer e Jason Friedberg (Os Vampiros Que Se Mordam, Espartalhões, Deu a Louca em Hollywood). Ainda por cima, os roteiristas demonstram uma completa estagnação de seus sensos de humor, em especial, quando tentam emplacar piadas envolvendo a sexualidade de Leonardo DiCaprio que, derivadas de um ciúme masculino bobo e generalizado da época de Titanic, quando o ator fazia sucesso entre as mulheres, ignoram os mais quase quinze anos de carreira que se sucederam dali e que foram mais que suficientes para enterrar a sete palmos esse preconceito estúpido.
Surpresa ou não, tecnicamente, o filme também deixa bastante a desejar - a não ser, é claro, que o bunker (um trocadilho para "bunda", como descobri com o filme) de Hitler visto em certo momento seja uma homenagem enrustida aos cenários do seriado Chaves, produzido para a televisão na década de 70. Há de se reconhecer, entretanto, que os efeitos utilizados na transmutação do Agamenon jovem no adulto são eficientes, mas nem isso mascara a preguiça dos autores de criar uma explicação decente para a mudança repentina de aparência do protagonista e nem diminui o fardo da constatação de que dali para frente seremos obrigados a aturar em tempo integral a caricata performance de Hubert. Aliás, tirando Luana Piovani, que não é obrigada a usar dentaduras ou perucas que mais parecem assessórios do Pânico na TV, e Russo, o lendário assistente de palco da Rede Globo que, sumido há anos, aqui surge em uma ponta no único esquete minimamente divertido de todo o longa (aquele envolvendo a disputa que definirá o próximo papa), todos os profissionais envolvidos na produção deveriam se envergonhar de suas colaborações, alguns em maior grau (o falso depoimento de Fernando Henrique Cardoso é embaraçoso) e outros com menor vigor (shame on you, Fernanda Montenegro!).
O que nos leva, claro, à participação do ótimo Marcelo Adnet, tida como única esperança de salvação de um projeto que aparentemente já nasceu condenado. E não, nem o comediante consegue salvar as cenas que protagoniza, já que elas invariavelmente sofrem dos mesmos problemas citados anteriormente e obrigam o ator a entregar uma interpretação irregular, caricata e repleta de tiques falsos e irritantes, que talvez funcionassem em seus programas na MTV - quando, então, ele teria o benefício de texto, talento e criatividade próprios. E já que citei sua carreira televisiva, a (péssima e deslocada) cena em que Agamenon interpreta um funk em um navio militar é claramente inspirada nas paródias ou composições improvisadas que marcaram (e ainda marcam) os programas que elevaram Adnet ao estrelato, mas que, por outro lado, contavam com o descompromisso de estarem inseridas em um programa de TV, algo assumidamente descartável, despretensioso e passageiro.
Por fim, após muito sofrimento vendo Agamenon, pensando em Agamenon e escrevendo sobre Agamenon, ao menos um privilégio irei me autoconceder: o de encerrar o texto referenciando uma das piadas do filme. As Aventuras de Agamenon - O Repórter até que não é um filme ruim. É um filme péssimo (risos - ou não, né!).
