


50/50, EUA, 2011 | Duração: 1h39m56s | Lançado no Brasil em 18 de Janeiro de 2012, em DVD e Blu-ray | Roteiro de Will Reiser | Dirigido por Jonathan Levine | Com Joseph Gordon-Levitt, Seth Rogen, Anna Kendrick, Bryce Dallas Howard, Anjelica Huston, Serge Houde, Philip Baker Hall, Matt Frewer, Andrew Airlie.
Inspirado na luta contra o câncer do produtor e roteirista estreante Will Reiser (que faz uma breve aparição como uma das pessoas inconvenientes que tentam consolar Adam em uma festa), o roteiro de 50% surge com a missão ingrata de frustrar expectativas predefinidas a respeito de "dramalhões sobre câncer" - e quanto a isso, alcança resultados adversos. Pesando para o lado desfavorável da balança, o destaque fica por conta de toda a atenção voltada para os interesses românticos do protagonista que, além de soarem falsos e forçados (a evidente falta de química entre Gordon-Levitt e Dallas Howard desde o princípio denuncia o que irá acontecer), em momento algum fogem do lugar comum e parecem apenas tentar ratificar as nuances da trajetória emocional do rapaz.
Por outro lado, o texto de Reiser é repleto de acertos - a começar pelos aspectos cômicos, que compactuam com a dificuldade inicial de assimilar a gravidade da doença ao mesmo tempo que funcionam como uma forma de defesa encontrada pelos personagens para conviver com ela. Além disso, a ideia de inserir Katherine (Kendrick) no tratamento de Adam, uma terapeuta jovem e inexperiente que parece ter na ponta da língua uma explicação teórica e engessada para cada sintoma psicológico do rapaz, é uma ótima sacada, já que contribui para a frustração do protagonista e ainda incita uma reflexão sobre o modo ocasionalmente impessoal e sistematizado com que pacientes são tratados (algo também representado, de forma bem menos sutil, pela frieza do médico que comanda o tratamento), além de nos levar a questionar se seguir um protocolo pré-estabelecido é sempre a melhor forma de tratar um paciente - e nesse sentido, é interessante notar como a relação entre Adam e Katherine só passa a surtir algum efeito positivo quando a garota quebra as regras predefinidas para a relação terapeuta-paciente e passa a usar, por exemplo, o toque no rapaz não como uma lição de casa da faculdade, mas como um afago intencional e pessoal.
Ainda nesse aspecto, o roteiro acerta ao não dedicar-se demais ao tratamento diferenciado que portadores de doenças graves recebem e suas naturais insatisfações quanto a isso, algo que é basicamente compactado na cena da absurda festa organizada pelo amigo Kyle (Rogen) que, por pouco, não o estabelece como um amigo desnaturado que enxerga na enfermidade de Adam uma oportunidade imperdível de aproximar-se de mulheres. Dessa forma, o delicado tema é explorado de forma mais interessante em outras frentes, como através da postura superprotetora da mãe de Adam, vivida com imenso talento por Anjelica Huston, que, além de sofrer com o tocante drama pessoal da solidão (o marido sofre de Alzheimer e o filho não retribui sua preocupação), empenha-se ao máximo em proporcionar conforto e suporte ao filho, ou até mesmo do comportamento imaturo de Kyle que, representando uma fiel encarnação da persona cinematográfica de Seth Rogen, jamais parece conseguir acostumar-se com a ideia de perder o amigo e, dessa forma, suas várias atitudes inapropiradas são compensadas por seu otimismo e pela fidelidade ao amigo.
Porém, como não poderia deixar de ser, 50% também traz as velhas discussões sobre a completa sujeição e impotência que uma enfermidade como o câncer causa em sua vítima, o que leva, naturalmente, às boas reflexões sobre a efemeridade da vida, potencializadas pela pouca idade do protagonista. Dessa forma, a boba cena em que Adam caminha por um corredor de hospital chapado por bombons de maconha só não é desastrosa por trazer o protagonista sendo obrigado a rir até mesmo da ideia da morte, tornando-se quase emblemática ao marcar o início da abdicação de algumas posturas excessivamente cautelosas que talvez o tivessem feito aproveitar a própria vida menos do que sua juventude teria permitido. Nesse sentido, o desabafo de Adam às vésperas de uma delicada cirurgia surge como um dos pontos altos do longa, quando o rapaz finalmente extravasa sua óbvia frustração diante da possibilidade de deixar o mundo sem nunca ter "visitado o Canadá" ou dito a uma mulher que a amava.
Tudo isso, claro, só é transmitido com eficiência graças à boa atuação de Joseph Gordon-Levitt que, escalado às pressas após James McAvoy abandonar o projeto por motivos pessoais, volta a exibir talento e carisma (tenho vontade de abraçá-lo quando, após descobrir sobre o tumor e com um sorriso simpático no rosto, ele diz ao médico: "Isso não faz sentido. Eu não fumo, não bebo. Faço reciclagem...") que criam um contraste adequado com a fisionomia mais dura, rígida, quase como um escudo, de quando o abatimento finalmente o alcança - o que é natural para uma pessoa que não consegue nem mesmo aliviar as tensões através do prazer carnal, por sentir uma intolerável dor nas costas durante o ato sexual. Além disso, a cena em que Adam e seus pais aguardam a chamada para a cirurgia é tão tocante quanto deveria ser e, graças aos belos desempenhos de Gordon-Levitt, Anjelica Huston e Serge Houde, representa um verdadeiro chute nas glândulas lacrimais até mesmo nos mais insensíveis mortais.
Com uma direção contida e discreta de Jonathan Levine (que ainda não havia lançado nenhum trabalho muito expressivo), a narrativa é conduzida de modo a permitir que sensibilidade e bom humor coexistam, conseguindo, por exemplo, encontrar um tom adequado para o desfecho que, bem como as chances de cura de Adam, possuiria a mesma probabilidade de problemas para cada uma das duas possibilidades, já que tanto um final feliz quanto um triste poderiam ser desastrosos nas mãos erradas (como não estamos vendo a novela das nove, a tensão durante o pronunciamento da cirurgiã após a operação existe sem que para isso haja pausas dramáticas).
Contando ainda com uma trilha que encontra espaço para canções de bandas como Pearl Jam e Radiohead e composições do sempre eficiente Michael Giacchino, 50% é um bom filme cujas possibilidades de premiação encontram ressonância em Juno, de 2007 - isto é, baixíssimas, apesar da badalação em torno do filme na ocasião do lançamento. Possivelmente não ficará marcado na história do cinema, mas isso não significa que deva ser esquecido ou mereça ser ignorado.
