10 de outubro de 2011

Crítica | O Zelador Animal

por Eduardo Monteiro

Zookeeper, EUA, 2011 | Duração: 1h41m53s | Lançado no Brasil em 7 De Outubro de 2011, nos cinemas | Roteiro de Nick Bakay & Rick Reuben & Kevin James e Jay Scherick & David Ronn. História de Jay Scherick & David Ronn | Dirigido por Frank Coraci | Com Kevin James, Rosario Dawson, Leslie Bibb, Donnie Wahlberg, Ken Jeong, Joe Rogan, Nat Faxon, Steffiana De La Cruz e as vozes de Nick Nolte, Adam Sandler, Sylvester Stallone, Cher, Judd Apatow, Jon Favreau, Faizon Love, Maya Rudolph, Bas Rutten, Don Rickles e Jim Breuer.

Há algumas semanas, a filial brasileira da Sony Pictures anunciou que O Zelador Animal chegaria aos cinemas apenas com cópias dubladas, alegando que a excepcional qualidade notada após a finalização do processo de substituição de vozes havia pesado decisivamente na determinação. Sem entrar no mérito da credibilidade do argumento e evitando aprofundar muito na discussão a respeito da preocupante tendência de crescimento dos lançamentos dublados, sou capaz de afirmar que a mutilação do áudio original não representa um grande problema para a versão brasileira desse longa. Por ser repleto de animais falantes e personagens caricatos e superficiais, não é de se espantar ainda que o ótimo Marcelo Adnet (um dos melhores atualmente no que diz respeito a improvisos, imitações e caricaturas) tenha sido escalado para dar voz a nada menos que cinco dos animais do zoológico em questão, local escolhido para sediar um romance absolutamente formulaico (para atrair os adultos) e dar espaço para a bicharada tagarelar (e atrair as crianças). Ou seja: afastando de uma vez por todas o público que valoriza um material interessante sem quaisquer mutilações audiovisuais (para todo efeito, a perda de imagem devido à inserção de legendas é irrelevante), O Zelador Animal garante àqueles que buscam um escapismo vazio uma recompensa à altura de suas pretensões.

Fruto da reunião de cinco diferentes roteiristas inspirados por uma história concebida pelos criadores de Norbit, o roteiro finge acompanhar o drama vivido pelo zelador Griffin (James), que, após receber um fora da então namorada Stephanie (Bibb), passa a cogitar a possibilidade de largar o emprego no zoológico, entristecendo a colega de trabalho Kate (Dawson). No entanto, o real foco do longa é revelado quando descobrimos que os animais são capazes de falar como Nick Nolte, Adam Sandler ou Sylvester Stallone (ou Adnet, Adnet e Adnet, na versão brasileira) mas, pelas razões misteriosas de sempre, preferem não expor esta habilidade para toda a humanidade. A partir daí, todas as oportunidades de gerar (tentativas de) humor com a tagarelice animal serão agarradas, especialmente aquelas ligadas aos conselhos que Griffin recebe da bicharada para tentar reconquistar Stephanie. Paralelamente, o zelador busca um meio de reverter a depressão vivida pelo gorila Bernie (Nolte e... Adnet) desde que este foi repreendido agressivamente por um detestável funcionário do zoo, Shane (Wahlberg).

Sem apresentar qualquer atrativo ou diferencial, a capacidade de falar dos animais vistos aqui gera já de cara uma série de questionamentos pertinentes (se são tão inteligentes - ou burros, dependendo do ponto de vista - e mais fortes que os humanos, por que ainda assim permanecem submissos?) que, obviamente, são eliminados quando lembramos que o filme é produzido por Adam Sandler. Já no que diz respeito à parte técnica dessa execução, com exceção do gorila Bernie (claramente vivido por um ator fantasiado) e de um ou outro espécime digital em aparições pontuais, a humanização é alcançada alterando-se digitalmente o movimento dos olhos e da boca de animais reais que, ainda que muito bem adestrados (símios, como sempre, são destaques nesse sentido), agem em várias cenas com uma espontaneidade inapropriada para uma produção cinematográfica com roteiro bem definido. Por sorte (ou azar, também dependendo do ponto de vista), não é o caso de O Zelador Animal e, dessa forma, em diversos momentos a relação entre fala e movimentos não parece totalmente coerente ou planejada - e não é difícil supor que muitos desses diálogos sejam fruto de improviso no estúdio de dublagem baseado na expressão corporal dos animais registrada em estúdio ou em locação, o que explica que tenham sido escalados para a função comediantes como Adam Sandler, Jon Favreau, Maya Rudolph e, novamente, Marcelo Adnet (não me espantaria se descobrisse que boa parte dos diálogos brasileiros não são traduções diretas dos originais).

Por outro lado, relevando problemas técnicos como os olhos vidrados e sem vida do leão Joe (Stallone e Adnet), não é totalmente condenável a ideia fundamental de inserir animais tentando agir com racionalidade, já que o fato de essa ser uma opção de humor totalmente óbvia não impede que algumas cenas protagonizadas pela bicharada sejam realmente engraçadas, especialmente a bizarra e surreal ida de Griffin e Bernie a um restaurante. Porém, o comportamento dos animais ser tão estúpido e contraditório quanto o dos humanos não é tão perdoável assim: se demonstram uma certa articulação mental que permite desde associações simples até a compreensão de informações mais complexas (como a composição da urina), por que diabos insistem em ensinar a Griffin técnicas selvagens de acasalamento, a não ser, é claro, para rirmos (o uso da primeira pessoa do plural não me insere nesse grupo) de Kevin James coaxando ou urinando publicamente em uma festa na tentativa de atrair o sexo oposto?

Contando com atuações irregulares e apagadas do elenco principal (Ken Jeong, em particular, está extremamente deslocado e interpreta o mesmo personagem de sempre), O Zelador Animal fere a lógica e subestima a inteligência do espectador até os últimos instantes da projeção quando, em uma corrida rumo ao aeroporto para evitar que o grande amor da vida de alguém vá embora para sempre, o protagonista e seu companheiro não só fazem uma pausa desnecessária que consome um tempo precioso como também chegam a optar por um meio de transporte incrivelmente lento para, em seguida, escalar uma ponte até um nível superior à pista de rolamento, apenas para que Griffin possa cair de uma altura perigosa e, assim, estabelecer um ridículo paralelo com a técnica de acasalamento de corvos - mas acaba ficando evidente que nem o instinto milenar das aves parece tão óbvio quanto o romance visto aqui. E já que falei de obviedade, suponho que contar que erros de gravação surgem durante os créditos finais não consiste uma grande surpresa para a maioria, já que essa decisão tem sido quase obrigatória em comédias pouco divertidas.

Tudo, claro, devidamente dublado.