19 de agosto de 2011

Crítica | Professora Sem Classe

por Eduardo Monteiro

Bad Teacher, EUA, 2011 | Duração: 1h28m12s | Lançado no Brasil em 19 de Agosto de 2011, nos cinemas | Escrito por Gene Stupnitsky & Lee Eisenberg | Dirigido por Jake Kasdan | Com Cameron Diaz, Justin Timberlake, Lucy Punch, Jason Segel, John Michael Higgins, Phyllis Smith, Thomas Lennon, Molly Shannon, Eric Stonestreet, Dave 'Gruber' Allen, Matthew J. Evans, Kaitlyn Dever, Kathryn Newton, David Paymer.

Há pouco menos de dez anos, o ótimo Papai Noel às Avessas contava a história de um ladrão bêbado e derrotado que trabalhava em épocas natalinas fantasiado como o bom velhinho em shoppings centers apenas para, com esse disfarce, infiltrar-se nos bastidores desses complexos de compras a fim de executar assaltos nos estabelecimentos locais - e mesmo que por vezes o protagonista vivido por Billy Bob Thornton apresentasse condutas com as quais o público conseguia se identificar, o longa não se intimidava em abraçar seu mau caráter até os últimos instantes de projeção a fim de divertir, desenvolver o personagem e, sobretudo, manter-se coerente. Rodeado de comparações que já se iniciam pelos próprios títulos originais (Bad Teacher aqui e Bad Santa lá), Professora Sem Classe também aposta na radical subversão promovida por um indivíduo desprezível em uma profissão que lida diretamente com crianças. Mas, por mais divertidamente absurdas que ambas as situações sejam - e a permanência em uma função que claramente não dominam talvez possa ser explicada pela ingenuidade e inércia dos jovens com os quais os protagonistas têm de lidar -, não há como ignorar que, em um dos dois casos, o realismo da premissa é seriamente comprometida após ser botada em xeque já nos primeiros minutos de projeção. Obviamente me refiro à produção mais recente: contrapondo-se ao filme de 2003, onde era fácil aceitar o contexto e as circunstâncias (seja pela omissão do administradores do shopping center, pela relativa insignificância de um grupo de animadores sazonais ou por sua volatilidade), é impossível não se incomodar com a inexplicável recontratação da professora Elizabeth Halsey (Diaz) após nada menos que um ano lecionando na escola sem sequer se dar ao trabalho de disfarçar sua incompetência ou desprezo pela dinâmica da instituição ou pelos bons costumes.

E isso é apenas o começo. Partindo desse contexto fundamentalmente falho, os roteiristas Gene Stupnitsky e Lee Eisenberg (merecedores do céu pela versão americana do seriado The Office e do inferno pelo desastroso Ano Um) abordam um ano da vida de uma professora bastante incomum: com evidente aversão a regras, colegas de trabalhos e alunos, Elizabeth enxerga a profissão como uma forma fácil de ganhar dinheiro, em função de férias de verão desocupadas, horários reduzidos e a aparente facilidade de convencer os demais da credibilidade de seu método de ensino (que consiste em exibir filmes que vão de O Preço do Desafio a Pânico, enquanto ela própria dorme) através de explicações dotadas de um ar de falsa relevância. Porém, após levar um fora do noivo rico, ela passa a dividir apartamento com um operador de reboque e, para se sustentar, acaba sendo obrigada a regressar à sala de aula. Somando a tudo isso o projeto de fazer um implante de silicone nos seios, Elizabeth enxerga no milionário e recém-contratado professor-substituto Scott Delacorte (Timberlake) a chance de sanar seus problemas financeiros e finalmente subir na vida, mas terá de lidar com a concorrência da professora-exemplo Amy Squirrel (Punch) e as investidas do professor de Educação Física Russell Gettis (Segel).

Lamentavelmente, Professora Sem Classe é mais um daqueles filmes que moldam todos os seus elementos à necessidade de criar piadas e gags, mesmo que isso soe absolutamente falso e comprometa o conjunto da obra. Observe, por exemplo, como a trilha sonora de Michael Andrews (que desde que compôs para Donnie Darko parece ter se especializado em comédias), quando não soa como uma quase transposição do trabalho de John Murphy para O Cara, tenta forçadamente conferir humor a certos diálogos, como aquele em que a personagem de Diaz veste uma máscara de boazinha na intenção de manipular o diretor da escola, vivido por John Michael Higgins como uma figura nula que, caso tivesse todas suas cenas cortadas, possivelmente não afetaria o resultado final.

Os personagens, aliás, já nasceram condenados, variando entre arquétipos e estereótipos que, na maior parte dos casos, não conseguem ser salvos nem mesmo por seus intérpretes: Cameron Diaz, sempre com roupas e maquiagem marcantes ou provocantes, até alcança um bom desempenho como Elizabeth, desde seu evidente desdém até sua falsa simpatia, mas é limitada por um roteiro que não explora bem o potencial oferecido pela premissa, especialmente quando opta por resoluções fáceis e previsíveis que flertam com convenções de comédias românticas. Já Lucy Punch, como a inconstante e insegura professora Squirrel, usa e abusa da teatralidade de sua personagem, mesmo que não consiga estabelecer uma boa química com Justin Timberlake que, este sim, mostra-se cada vez mais à vontade em cena, interpretando aqui um professor politicamente correto, palerma, infantil, romântico e possivelmente o maior injustiçado da história, já que o roteiro induz uma rejeição a Scott simplesmente porque este não se interessou por Elizabeth no momento apropriado da narrativa. E se Phyllis Smith surge como uma agradável surpresa num divertido e doce contraponto à protagonista, Jason Segel, tão eficiente quando em projetos certos (como Ressaca de Amor), decepciona pela falta de carisma daquele que é o único personagem real e sensato da trama e que, por isso, permanece à espera para ser usado em um previsível e de difícil deglutição truque final - que só poderia ser considerado uma carta na manga no caso de um paletó invisível.

Incapaz de apresentar uma lógica interna decente, a narrativa desenvolve-se entre as diversas tentativas de Elizabeth de juntar dinheiro (o que resulta em uma das poucas boas sacadas, quando a protagonista vende os Achados e Perdidos e as latinhas de alumínio recolhidas no colégio) e a disputa com Amy pelas atenções de Scott, como se pulasse de um esquete para outro - isso quando não resolve concentrar-se no bullying sofrido por um aluno, subtrama que é dizimada imediatamente após cumprir sua função: fazer com que Elizabeth dê conselhos em um discurso que, no fundo, aplica-se a ela mesma (prefiro não comentar sobre o absurdo convite que a família do garoto faz à professora para uma reunião familiar no Natal). Por outro lado, há bons momentos que merecem o devido reconhecimento e apreciação, como a cena em que Elizabeth exibe sutilmente seu desinteresse pelos alunos quando mantém com o pai de um deles um diálogo neutro no qual jamais arrisca o uso de um pronome masculino ou feminino que denunciaria seu desconhecimento quanto ao sexo do(a) jovem. Da mesma forma, o diretor Jake Kasdan acerta na construção de uma cena que brinca com a abordagem comumente dada a assassinos de aluguel, quando a protagonista, temendo as consequências das ações de um personagem que pode destruir sua "reputação", incumbe seu brutamontes colega de quarto de encontrá-lo e entregá-lo um perigoso... envelope.

Apelando ainda para o clichê do cantor que dedica uma música a uma mulher especial e acaba gerando expectativas equivocadas em outra (e, no caso, estupidamente infundadas) ou para uma freada brusca em reação a uma notícia excepcional, deixando o espectador assustado pela constatação que, apesar de não parecer, o carro estava em movimento, Professora Sem Classe, ainda merece descrédito por sua passagem de tempo displicente (apesar de letreiros indicarem que passa-se um ano, a impressão que fica é que tudo aconteceu em 3 ou 4 semanas) e por, no desespero para distrair o público de seu roteiro falho, acabar recorrendo a gags disfuncionais e deploráveis, como a escatologia gratuita, um garoto com fisionomia congelada e boca aberta em dois momentos distintos (!!!) ou o jovem espinhento que não consegue esconder uma ereção quando vê uma mulher em trajes provocantes e molhados.

E que venham os palhaços, babás ou pediatras maus. Nas mãos certas, muito provavelmente teriam melhores chances do que essa reles professora.