20 de julho de 2011

Crítica | A Inquilina

por Eduardo Monteiro

The Resident, Reino Unido/EUA, 2011 | Duração: 1h31m19s | Lançado no Brasil em 22 de Julho de 2011, nos cinemas | Escrito por Antti J. Jokinen & Robert Orr | Dirigido por Antti J. Jokinen | Com Hilary Swank, Jeffrey Dean Morgan, Lee Pace, Aunjanue Ellis, Sean Rosales e Christopher Lee.

A Inquilina é um filme desenvolvido a partir de uma ideia assumidamente fraca. Após dedicar menos de trinta minutos da projeção à construção de um suspense de natureza a princípio desconhecida, o diretor-roteirista Antti J. Jokinen escancara a fragilidade de sua premissa ao esclarecer todo o mistério que, pela quantidade e obviedade dos elementos apresentados até então, se revela surpreendente apenas para aqueles que não conferiram nenhum material de divulgação (incluindo aí cartazes e trailer) ou que tenham dormido durante o primeiro terço do filme. E se em algum momento dessa crítica ficar excessivamente óbvia a resposta a esse mistério, acredite: a culpa não é minha, já que apresentarei basicamente os mesmos elementos que o longa oferece.

Escrito por Jokinen juntamente com Robert Orr (Anjos da Noite - A Rebelião), o roteiro acompanha a médica plantonista Juliet (Swank), que procura um apartamento em Nova York após um desentendimento com o namorado em função de uma traição. Graças a um anúncio divulgando suas intenções, ela é contatada por Max (Morgan), o simpático e solícito proprietário de um prédio com unidades disponíveis para locação a preços irrisórios para a realidade novaiorquina. Mas, após se dar conta de que é uma personagem de um filme de suspense, Juliet passa a ter medo de escuro, de portas rangendo ou de janelas abertas, temores esses que apenas ao público fazem sentido, já que descobrimos que a mulher é observada por alguém com acesso ao interior das paredes da edificação - e os principais suspeitos são o estranho avô de Max, August (Lee), e um misterioso homem (Pace) que observa de longe Juliet entrar e sair do prédio.

Por um lado, Jokinen até consegue criar um clima de inquietação nos primeiros dias de Juliet no apartamento, quando sugere que a protagonista pode estar sendo observada ao posicionar a câmera debaixo de sua cama ou ao passear pelo corpo de Swank de forma sugestivamente erótica enquanto ela passa creme em frente a um grande espelho. Mas, enquanto alguns desses elementos são simplesmente descartados pelo roteiro (a má recepção de sinal para telefone celular no prédio, por exemplo, nunca é usada como dificultador), os restantes deixam de ser sugestivos durante o longo flashback que, ao invés de apenas responder à pergunta central e deixar o espectador fazer mentalmente seu próprio retrospecto, revisita praticamente todas as cenas anteriores dando-lhes supostos novos significados - e nos poucos pontos que acrescenta algo realmente imprevisível, apenas piora o quadro geral (como engolir as convenientes coincidências?). Pior do que isso, a longa duração dessa sequência deixam a impressão de que os realizadores julgam que a reviravolta concebida por eles é mesmo sensacional e merece ser esmiuçada nos mínimos detalhes - e convenhamos que, com vinte e tantos minutos de narrativa e apenas três possíveis opções (sendo duas delas introduzidas como muito suspeitas), a incapacidade de dedução do espectador pode ser considerado quase um indicativo de preguiça.

E mesmo que Juliet ainda não esteja a par da reviravolta, ela continua a agir como se realmente soubesse estar em um filme de suspense e, assim, quando começa a dormir demais e perder o horário, a primeira ideia que tem é instalar um sofisticado sistema de câmeras de vigilância ativado por um detector de movimentos, simplesmente por suspeitar que há algo assustador no apartamento que a faz dormir demais. Ainda nesse aspecto, em certo momento, Juliet encontra em seu quarto um objeto suspeito que a motiva a realizar alguns exames, mas ainda assim parece incapaz de formular hipóteses sobre o que pode estar acontecendo, chegando ao cúmulo quando ela recebe os resultados desses testes e afirma para alguém que "há algo de errado no apartamento, mas não sei o que é". Como se não bastasse, o complemento dessa frase ("Não vá para lá!", enquanto ela, indefesa, está fazendo exatamente o oposto) ressalta um elemento fundamental para que o terceiro ato da trama funcione como mais um típico exemplar do gênero: a burrice.

Revelando-se muito mais competente como atriz do que como produtora (além de A Inquilina, ela também produziu este ano o igualmente irrelevante O Noivo da Minha Melhor Amiga), Hilary Swank faz o que pode com uma personagem que dá falsas esperanças amorosas a um homem apenas para depois desprezá-lo, com a mesma categoria que atende a um telefone celular achando que se trata da mesma pessoa da ligação anterior (meu Deus, será que ainda fazem celulares sem identificador de chamada?) e, mais uma vez em sua carreira, não se intimida em expor sua nudez em cena para fins narrativos. E se Jeffrey Dean Morgan e Lee Pace cumprem bem suas funções por mais imbecis que sejam, Christopher Lee é desperdiçado de forma quase ofensiva como um idoso que exibe um comportamento deliberadamente suspeito até o momento em que surge espiando a movimentação do hall por uma enorme fresta da porta entreaberta de seu apartamento ao invés de simplesmente utilizar o olho-mágico.

E por mais que Jokinen e Orr tentem conferir algum significado maior às ações vistas no segundo terço da narrativa através de pistas sobre o passado dos personagens, a verdade é que os sustos que Juliet toma sozinha e as cenas em que é inconscientemente assediada não causam nenhuma emoção e estão ali apenas para encaminhar a narrativa para o confronto final que, pela estupidez e longevidade, consegue variar entre o ridículo e a comicidade involuntária - e ainda é prejudicado por se passar em ambientes excessivamente escuros, que dificultam o entendimento do espectador sobre a geografia dos cenários. No entanto, há exceções nas quais o diretor chega perto de acertar e, dentre elas, uma que vale ser citada ocorre quando, numa curiosa inversão de papéis e com a ajuda da trilha sonora, assustamos com o vilão quase sendo desvendado por Juliet - mas, poucos segundos depois, já estamos nos perguntando se uma agulhada por debaixo da unha do dedão do pé é realmente a forma mais segura e discreta de dopar uma pessoa ou se o plano-detalhe do procedimento está ali apenas para causar repulsa no público.

Fazendo um mau uso de câmera lenta e incorporando elementos de outras produções famosas (há um plano em particular claramente inspirado em O Quarto do Pânico, de David Fincher), o finlandês Antti J. Jokinen sai de uma carreira de documentários e séries televisivas para uma empreitada nos cinemas que, talvez, tenha falhado principalmente na escolha do gênero, já que A Inquilina é decepcionante na subversão e previsível na fidelidade ao suspense. O que não significa que seu péssimo roteiro funcionaria em qualquer outro gênero sem que, digamos, fosse jogado inteiro no lixo e reescrito página a página - mas dessa vez com alguma inteligência. Bom, quem sabe da próxima vez ele acerta.