27 de junho de 2011

Vai entender...

A Walt Disney Pictures, amplamente conhecida por produzir filmes familiares (pra não dizer infantis), nunca foi das mais felizes quando o assunto é tradução de títulos. Salvo raridades em que o nome original é mantido (WALL-E, Toy Story e Ratatouille são os únicos exemplos que me vêem à cabeça no momento), a filial brasileira da distribuidora tem uma tendência, digamos, peculiar de ignorar os nomes originalmente concebidos para seus longas e criar suas próprias e mirabolantes versões nacionais.


Obviamente que os exemplos acima, juntamente com tantos outros, não são alarmantes nem condenáveis, já que representam as tentativas da distribuidora de facilitar o contato do público infantil com o produto, que são legítimas e, ainda, não são particularmente ofensivas às propostas dos filmes.

Por essa mesma razão, fiquei espantado ao perceber a estranheza da divulgação do novo filme do Ursinho Pooh que, poucas semanas antes do lançamento oficial nos cinemas brasileiros, ainda não havia ganhado um título nacional (que, no original, é simplesmente o nome do personagem principal). Até que vi o cartaz nacional:

Cartaz Internacional x Cartaz Nacional: simplesmente Winnie the Pooh
A confirmação, para mim, veio quando o site Disney Mania divulgou as artes do DVD e Blu-ray nacionais. Logo o Pooh, um dos personagens com as histórias mais infantilizadas, vai chamar simplesmente Winnie the Pooh. Facilitar, não irá; nenhuma criança dirá que viu o Winnie the Pooh. Seria uma tentativa da Disney de educar o público brasileiro, que insiste em chamá-lo de Puff? Acho que não, não faz muito sentido.

Vai entender...

25 de junho de 2011

Dez Regras Para Salvar os Cinemas

Há alguns meses atrás, Pablo Villaça publicou em seu blog uma lista com 10 Regras Para Salvar os Cinemas, baseada em uma interessante análise das empresas que trabalham (com competência questionável) para que vejamos os filmes nas telas grandes.

Concordo com cada um dos itens, em maior ou menor grau. Apenas acrescentaria que um bom progresso seria feito se os próprios clientes dos cinemas tivessem mais educação e respeito para com os demais - e infelizmente enxergo isso como uma utopia.

Para acessar a lista, clique aqui.

22 de junho de 2011

Crítica | A Casa

por Eduardo Monteiro

La Casa Muda, Uruguai, 2010 | Duração: 1h22m34s | Lançado no Brasil em 23 de Junho de 2011, nos cinemas | Roteiro de Oscar Estévez. Baseado na ideia original de Gustavo Henández e Gustavo Rojo | Dirigido por Gustavo Hernández | Com Florencia Colucci, Abel Tripaldi, Gustavo Alonso e María Salazar.

O gênero terror figura, juntamente com comédias românticas, entre os mais desgastados da atualidade. Espíritos, casas assombradas, zumbis, crianças demoníacas e serial killers deixaram de ser ideias originais e se tornaram convencionices que raramente fogem do que já foi arduamente explorado. Dessa forma, é natural que os produtores busquem formas de surpreender o público, inserindo elementos que diferenciem seus projetos (desde pitadas de humor, como Premonição 3 ou Pânico 4, até simulação de documentários, como [REC] ou o pioneiro A Bruxa de Blair) ou, em casos específicos, se agarram a uma fórmula comercialmente bem sucedida e a exploram até que as fontes sequem, independente do resultado artístico (como Jogos Mortais e o recente Premonição 4).

É então que chegamos a A Casa, longa uruguaio lançado com a proposta de contar um caso aterrorizante em tempo real usando, para isso, um único plano-sequência. Partindo de uma história escrita por Gustavo Rojo e pelo diretor Gustavo Hernández, livremente baseada em acontecimentos reais, o roteiro escrito por Oscar Estévez acompanha o início da pernoite de Laura (Colluci) em uma casa mal conservada e adequadamente repleta de objetos sinistros, como crânios de animais e fotografias polaroid. Sem energia elétrica e com as janelas lacradas, a edificação se torna um pesadelo para a mulher depois que ela ouve sons estranhos vindos dos segundo pavimento, que se tornam mais assustadores após seu pai, Wilson (Alonso), subir para investigá-los.

Mesmo que inteligente do ponto de vista comercial, a veracidade do plano-sequência único é absolutamente questionável - e caso o filme tivesse sido realmente executado dessa forma (algo que não acredito), teria sido um esforço pretensioso e desnecessário para um filme com orçamento, cronograma e pessoal tão reduzidos, uma vez que os movimentos rápidos de quadro fechados e as repetidas imersões em escuridão completa são deixas perfeitas (e, para mim, óbvias) para cortes escondidos. No entanto, mesmo que intrigante, a técnica não é completamente bem sucedida, já que a ausência aparente de cortes não confere a urgência necessária à narrativa e, assim, somos obrigados a acompanhar Laura desbravando inutilmente os cômodos da casa diversas vezes por intermináveis minutos. Ainda por cima, o diretor acaba impedido de explorar uma montagem dinâmica para tentar dar algum sentido à reviravolta do final, já que aparentemente não há nenhum.

No entanto, há de se reconhecer o bom desempenho técnico da equipe, que realiza um bom trabalho na fotografia, basicamente iluminada por duas lanternas, e no design de som, que dá boas sugestões da natureza dos acontecimentos transcorridos fora de campo e, da mesma forma, cria um ambiente adequadamente silencioso e perturbador - interrompido apenas pela trilha sonora, que não ajuda nem atrapalha. O movimento de câmera surpreende em certos momentos (como ao entrar por uma janela do carro e sair por outra), mas o instrumento também é utilizado de forma prejudicial ao expôr excessivamente um objeto que deverá ser visto novamente ou, por fim, ao diminuir o ar documental quando se torna subjetiva, assumindo a posição de um personagem.

Infelizmente, a notável competência da equipe trabalha em função de um roteiro terrível, que força uma reviravolta absolutamente infeliz em seu ato final, além de rechear o restante da história com incontáveis clichês de filmes do gênero, como corvos, crianças sinistras, fotografias polaroid - e claro, a mocinha com camiseta branca ensanguentada na casa assombrada. Da mesma forma, Hernández desafia a boa vontade do espectador fazendo com que a mulher consiga sair da casa mesmo que a projeção esteja longe de acabar e, em certo instante, busca inspiração (talvez seja um eufemismo da minha parte) em Jogos Mortais e praticamente recria uma sequência na qual um personagem utilizava o flash de uma câmera fotográfica para explorar um ambiente escuro.

A Casa merece, portanto, reconhecimento pela eficiência de sua execução, especialmente diante dos recursos escassos disponíveis. Mas só. Nada que mereça um remake norteamericano ou algo assim...

Peraí! Oops...

Obs.: Há uma cena adicional durante os créditos finais. Ou seja: para todo efeito, o filme de fato NÃO é um único plano-sequência.

17 de junho de 2011

Crítica | Meia Noite em Paris

por Eduardo Monteiro

Midnight in Paris, Espanha/EUA, 2011 | Duração: 1h34 | Lançado no Brasil em 17 de Junho de 2011, nos cinemas | Escrito por Woody Allen | Dirigido por Woody Allen | Com Owen Wilson, Rachel McAdams, Marion Cotillard, Kathy Bates, Michael Sheen, Carla Bruni, Corey Stoll, Tom Hiddleston, Alison Pill, Adrien Brody, Kurt Fuller, Mimi Kennedy, Nina Arianda, Gad Elmaleh, Yves Heck e Léa Seydoux.

Obs.: Priorize ver o filme antes de ler o texto. Revelo detalhes que valem a pena ser descobertos durante a projeção.

Quem está acostumado com o padrão Woody Allen de fazer filmes irá se surpreender, já nos primeiros minutos de Meia Noite em Paris, com os créditos iniciais sendo divididos por um interlúdio com belas imagens da capital francesa, que a estabelece como um lugar tranquilo e agradável. Aparentemente livre de metáforas (a evolução do dia se dá para chegar ao turno dos acontecimentos centrais do filme, enquanto a presença de chuva é uma introdução de uma das idéias do protagonista sobre a cidade), essa intervenção é uma clara representação da fascinação do próprio cineasta com a cidade, o que é confirmado nos momentos seguintes (ainda durante os créditos iniciais) pelo diálogo entre os personagens de Owen Wilson e Rachel McAdams, no qual o primeiro descreve seu encanto pela cidade, e pelas cenas de turismo que o sucedem. No entanto, quando o protagonista, bêbado à meia-noite, entra em um carro que o leva para uma inusitada realidade, fiquei positivamente surpreso ao constatar que, diferentemente do que aparentava, este não seria um produto puramente turístico do tour europeu de Woody Allen, iniciado em 2005 em Londres com o admirável Match Point.

Assim, acompanhamos a história do escritor Gil (Wilson) que, insatisfeito com as dezenas de roteiros hollywoodianos superficiais que é obrigado a escrever, vê Paris como um local inspirador para trabalhar em seu romance inacabado e cogita, inclusive, a possibilidade de se mudar para a cidade. Enquanto sua noiva Inez (McAdams) divide com os amigos Paul (Sheen) e Carol (Arianda) o interesse em fazer um turismo tradicional arrematado com a badalação da noite parisiense, Gil prefere espairecer, acha aquela paisagem mais bela durante momentos chuvosos e considera os anos 20 como o auge cultural da cidade. Assim, quando o homem entra em um carro no meio da noite que o transporta para uma festa onde interage com Ernest Hemingway (Stoll), Cole Porter (Heck) e Scott (Hiddleston) e Zelda Fitzgerald (Pill), a estranheza da situação logo dá lugar a uma imensa satisfação de conhecer figuras admiradas por ele - o que transforma seus períodos diurnos em imensos anti-clímax, visto que Inez está cada vez mais azeda e interessada no arrogante e questionável conhecimento de Paul sobre tudo.

Sem tentar explicar as viagens temporais (um acerto, pois não há explicação), Woody Allen constrói aquelas experiências como uma concretização da influência que a cidade exerce sobre Gil, sem se importar em exagerar na convergência de personalidades históricas ou em suas caracterizações. Por outro lado, o diretor erra ao introduzir desnecessariamente elementos que nos façam questionar as regras que regem essas viagens, como um livro encontrado por Gil que indica influências suas no passado ou a subtrama envolvendo um detetive particular. Em outros instantes, o cineasta carrega nos diálogos expositivos numa estranha demonstração de desconfiança na inteligência do espectador, como ao exibir, por exemplo, o personagem de Owen Wilson descobrindo e verbalizando que o "portal" para a realidade alternativa se abria à meia-noite, sendo que isso já é indicado pelo próprio título do filme.

Outro ponto que Woody Allen não foi completamente feliz é na escolha do elenco. Owen Wilson ganha a função de interpretar o alter-ego do cineasta da vez e consegue carregar com competência o filme, sem deixar que os maneirismos típicos atrapalhem sua composição, conferindo conhecimento e inteligência adequados ao personagem e expressando uma alegria genuína ao encontrar cada um de seus ídolos. Já Marion Cotillard surge apenas doce e encantadora e desempenha um papel importante como Adriana, ao passo que a sempre bela Rachel McAdams é prejudicada pela evolução brusca de Inez de noiva apenas incompatível a megera traidora e fútil, mas faz um bom trabalho. Não tão bem assim estão Alison Pill, que exagera na composição e no sotaque, Carla Bruni, inexpressiva e desconfortável em cena, e Léa Seydoux, que se revela insuficientemente carismática para a função que deve desempenhar na narrativa. Por outro lado, as participações de Kathy Bates, Michael Sheen, Tom Hiddleston, Corey Stoll e Adrien Brody são bem sucedidas, mas pecam por terem, em alguns casos, um arco incompleto. Nesse sentido, a ponta de Brody como Salvador Dalí surge como uma das mais interessantes pois, além de ser assumidamente curta, funciona bem como alívio cômico e, ao mesmo tempo, revela um pouco sobre o senso de humor do veterano cineasta: a insistência de Dalí com "rinoceronte" perde a graça pela repetição, mas acaba funcionando como um humor involuntário (ou será que não?), já que não há como ignorar o potencial cômico da citação deste animal específico durante um diálogo entre dois atores donos dos narizes mais notáveis de Hollywood.

Mas Woody Allen consegue escapar da auto-indulgência de transformar aqueles sucessivos encontros em meras projeções de seus próprios desejos ao questionar o que leva as pessoas a valorizarem mais o momento cultural de uma época passada do que o de seu próprio tempo. Assim, é conveniente que o roteiro em que Gil esteja trabalhando conte a história de um funcionário de uma loja retrô - e confesso que fiquei particularmente decepcionado por Allen ter concebido uma cena em que Gil, Inez e seus pais visitam um estabelecimento que vende objetos antigos em Paris e não a ter aproveitado para aprofundar o tema. Mas, por fim, o fato de essa discussão não apresentar uma solução fácil e definitiva (na última cena de Wilson e Cotillard que, com a presença dessa última, acaba dividindo curiosamente características com A Origem) não quer dizer que não seja satisfatória; aliás, é provável que Woody Allen não seja a melhor pessoa para tentar tecer explicações ou conclusões sobre essa ideia em relação ao passado, já que o próprio filme foi claramente concebido a partir da admiração do próprio cineasta por outras épocas.

Diferentemente do filme visto pela família de Inez em certo instante da projeção, Meia Noite em Paris não é mais um filme descartável e sem originalidade. É uma experiência incrível, com ótima trilha sonora, belas locações e um interessante elenco. É Woody Allen provando que não precisamos nos ater à época de ouro se sua carreira, de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa ou Manhattan, para podermos apreciar um de seus bons filmes.

14 de junho de 2011

A criatividade não tem limites!

O que essas duas fotos têm em comum?


Os mais desinformados (com todo o respeito) irão apontar as semelhanças das ocasiões em que foram tiradas, mas com razão. No entanto, muitos notarão que se tratam de imagens de divulgação de filmes do mesmo diretor: Meia Noite em Paris (que estreia na próxima sexta, 17) e o maravilhoso Match Point, de 2005, ambos de Woody Allen. Curiosamente, a segunda imagem já havia sido citada anteriormente aqui no blog quando apontei as inegáveis semelhanças entre os cartazes do filme e de outro da mesma distribuidora, O Noivo da Minha Melhor Amiga.

Mas não esperava que tão pouco tempo depois voltaria aqui para uma nova e semelhante observação.

Pois quando vi o pôster divulgado pela Paris Filmes (com a arte provavelmente desenvolvida aqui mesmo no Brasil) de Meia Noite em Paris, tive novamente déjà vus, que nos trazem a novas e inevitáveis comparações.


A imagem, que traz Owen Wilson e Rachel McAdams prestes a se beijarem, lembra muito o pôster contendo Jonathan Rhys-Meyers e Scarlett Johansson. Em ambos, o homem veste terno e a mulher, loiríssima e levemente curvada para trás, veste roupa clara e usa uma bolsa no ombro direito. Além disso, mesmo que involuntariamente, essas duas artes de divulgação remetem imediatamente a de Diário de uma Paixão, também estrelado por McAdams. E reparem que, nas três imagens, o homem está à esquerda e a mulher, à direita - o que não deixa de ser curioso (e em uma onda de completa bizarrice, a imagem no canto direito inferior do cartaz de Match Point remete ao pôster inteiro de Diário de Uma Paixão, por apresentarem momentos chuvosos)


Ainda acha as coincidências pequenas? Então tire novas conclusões ao ver a foto abaixo, com dois atores que interpretaram um casal em um filme lançado no mesmo ano que Match Point.

Penetras Bons de Bico

12 de junho de 2011

Crítica | Encantada

por Eduardo Monteiro

Enchanted, EUA, 2007 | Duração: 1h47 | Lançado no Brasil em 14 de Dezembro de 2007, nos cinemas | Escrito por Bill Kelly | Dirigido por Kevin Lima | Com Amy Adams, Patrick Dempsey, James Marsden, Timothy Spall, Idina Menzel, Rachel Covey e Susan Sarandon, as vozes de Jeff Bennett e Kevin Lima e a narração de Julie Andrews.

Encantada é um daqueles filmes assumidamente voltados para o público infantil que, ao mesmo tempo, são repletos de nuances que só podem ser compreendidas completamente pelos espectadores mais velhos - o que o transforma em um bem sucedido entretenimento familiar. Como se isso não fosse um indicativo bom o bastante de que o filme é produzido pela Disney, ainda somos presenteados com referências a diversas produções clássicas do estúdio e com o uso de duas técnicas que o consagraram e co-existem há vários anos, entre altas de uma e baixas da outra: animação em 2D e live action. Contando a história de uma princesa que é transportada do universo de contos de fadas para o mundo real, o longa apresenta o choque cultural entre personagens fantasiosos e reais e explora com surpreendente competência as lições que cada lado pode aprender com esse encontro, mesmo que eventualmente se perca em função da necessidade de manter o público jovem entretido e amarrar as pontas soltas.

Entrando de cabeça no universo Disney de forma quase literal ao embarcar em um travelling que leva o espectador para dentro do famoso castelo da vinheta da produtora, onde um gracioso livro passa a ser folheado, o filme é iniciado em animação 2D no reino de Andalasia e nos apresenta a Giselle (Amy Adams), uma alegre moça que, em um belo dia, é salva pelo príncipe Edward (James Marsden) de um terrível ogro. Apaixonados à primeira vista, os dois decidem se casar no dia seguinte, ideia que desagrada e muito a madrasta do rapaz, Narissa (Susan Sarandon). Temendo a ameaça que o casamento representa para seu poder, a megera rainha envia a moça para o mundo real (Nova York, com pessoas de carne e osso), onde acaba se esbarrando com o advogado e pai solteiro Robert (Patrick Dempsey) e sua filha, Morgan (Rachel Covey). Não demora muito para que Edward parta em uma missão de resgate, seguido por Nathaniel (Timothy Spall), o atrapalhado comparsa da rainha.

Com Giselle, Amy Adams é o destaque absoluto do longa, tendo a oportunidade de usar todo o seu talento e carisma em uma composição completa e complexa. Doce e inocente, a personagem está sempre disposta a enxergar o lado positivo das pessoas e das situações (como ao elogiar o sorriso de um mendigo banguela) ao mesmo tempo que demonstra curiosidade e interesse imensos em entender o comportamento dos seres humanos reais. Por essas e outras, o encontro entre o atarefado e cético Robert com a alegre e sonhadora Giselle surge como o grande atrativo do longa, já que, mesmo descrente da natureza fantástica da garota, Robert não consegue deixar de se influenciar por sua visão positiva da vida, ao passo que Giselle tem a chance de descobrir novos sentimentos e aprender um pouco sobre como funcionam os relacionamentos afetivos no mundo real. Assim, é adorável ver sua alegria e satisfação por se tornar um pouco mais real após sentir verdadeiramente raiva pela primeira vez, da mesma forma que é encantador vê-la cativando Robert a valorizar mais as pequenas coisas da vida, como ao se deslumbrar com o transporte de água feito pelo chuveiro, que, mesmo após explicações, ela continua considerando algo mágico.

Mas como em uma boa fábula da Disney, não poderia faltar romance em Encantada - e este também é beneficiado pela relação da dupla. Enquanto Robert tem um relacionamento apenas estável com a namorada Nancy (Idina Menzel) e considera isto o ideal para a felicidade, Giselle valoriza as recorrentes demonstrações de amor (inclusive através de canções, parte de sua natureza fantasiosa) embora mal conheça Edward, já que seu relacionamento com o príncipe é fruto da impulsividade comum em seu mundo. Mas com a convivência, Robert se vê repensando a validade de sua relação fria com Nancy e Giselle aprende a controlar seu ímpeto emocional, algo que ela só percebe ao reencontrar um Edward cantarolante, não conseguir corresponder seu canto e propor que se conheçam melhor em um encontro.

No que diz respeito aos demais personagens e ao desenvolvimento geral da trama, Encantada se prova bobo e superficial, mas divertido. O figurino e a maquiagem dos personagens são imaginativos e competentes como esperado, especialmente as roupas de Giselle (supostamente feitas por ela mesma a partir das cortinas do apartamento de Robert), que começam com um pomposo vestido de casamento e se tornam gradativamente mais contidos, refletindo a evolução da própria personagem. Também muito bem sucedida, é a trilha sonora do veterano Alan Menken, que faz uma ótima homenagem a Branca de Neve e os Sete Anões na sequência em que a princesa limpa e arruma o apartamento de Robert com a ajuda de animais tidos como pragas urbanas, e chega ao seu auge no divertidíssimo número musical no Central Park, também interpretado pela própria Amy Adams, no qual Giselle esbanja alegria, encanta os transeuntes e é aclamada por todos - além de ter uma letra cheia de mensagens positivas.

Dessa forma, é lamentável que o terceiro ato se revele tão decepcionante. Na tentativa de encerrar a projeção prendendo a atenção do público infantil e resolvendo o conflito de todos os personagens, o roteiro mistura diversas referências a animações clássicas com excessos de efeitos especiais e até mesmo um preguiçoso deus ex machina, desempenhado pelo esquilo Pip, para simplificar a resolução. E é mais triste ainda que tenha ocorrido momentos depois de criar com competência um dos momentos mais tocantes do longa, quando, durante um baile, um personagem quebra seus próprios paradigmas e expõe seu amor pela parceira de dança de uma forma inusitada e extremamente adequada.

Assim, quando o livro se fecha no final, a satisfação supera a frustração - e revisitar o filme para prestigiar as sutilezas da interpretação de uma ótima atriz e admirar o contraponto entre a ingenuidade e a frieza proposto pelo roteiro de Bill Kelly é um exercício que, para mim, nunca será nada menos que delicioso.

10 de junho de 2011

Filmes para rever no Dia dos Namorados

A palavra "rever" não foi escolhida ao acaso: se você ainda não viu algum desses títulos, corra logo atrás do prejuízo! Listo aqui 7 dos melhores filmes que conseguiram apresentar abordagens marcantes e eficientes sobre relações afetivas.

Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças
Eternal Sunshine of the Spotless Mind, EUA, 2004

O roteirista Charlie Kaufman pega idéias naturalmente tolas como destino e amor à primeira vista e as trabalha de um modo genial em um roteiro original e inteligente, que exibe uma história surpreendentemente romântica e repleta de ótimas idéias sobre o amor.


Simplesmente Amor
Love Actually, Reino Unido/EUA, 2003

Se vendeu como a comédia romântica definitiva e, diferentemente de filmes posteriores com propostas semelhantes como Idas e Vindas do Amor, consegue cumprir com a promessa e comover o espectador com uma série de pequenos casos que se intercalam às vésperas do Natal, acompanhados de uma ótima trilha sonora.


WALL·E
WALL·E, EUA, 2008

A Pixar não só conseguiu humanizar com total competência um pequeno robô repleto de limitações mecânicas como também inseriu uma formidável mensagem ecológica em uma história fundamentalmente de amor, sem deixar de lado suas apaixonantes ingenuidade e inocência.


Moulin Rouge! - Amor em Vermelho
Moulin Rouge!, EUA/Austrália, 2001

Tenho uma forte queda por musicais, mas isso não é o único fator que determina minha paixão por esse filme. O modo exótico e frenético que Baz Luhrmann conduz o longa apenas intensificam a dimensão da história vivida por Christian e Satine, que é iniciada e finalizada de forma comovente com o belíssimo pensamento: "A melhor coisa que você aprenderá na vida é simplesmente amar e ser amado".


Diário de uma Paixão
The Notebook, EUA, 2004

Uma bela e comovente história de um amor puro e real que sobrevive ao tempo e às intempéries, e da dedicação de um homem para combater a última e mais grave delas. Beneficiado por uma direção segura e um casal de protagonistas talentosos e carismáticos.


Antes do Amanhecer
Before the Sunrise, EUA/Áustria/Suíça, 1995

Duas pessoas se conhecem durante uma viagem, trocam idéias e passeiam por uma bela cidade durante a noite, mas sabem que quando o sol nascer terão que voltar para suas vidas normais. Testemunhar os dois se apaixonando é uma experiência tão fascinante quanto conferir o reencontro 9 anos depois, em Antes do Pôr-do-Sol.


Apenas uma Vez
Once, Irlanda, 2006

Aqui, minha paixão por musicais e a admiração por construções cuidadosas da aproximação entre duas pessoas convergem em um filme pequeno mas grandioso, vencedor do Oscar de Melhor Canção Original pela belíssima Falling Slowly.


Extra:
Como brinde, apresento o trailer de Namorados Para Sempre que, embalado pela música You Always Hurt the One You Love interpretada por Ryan Gosling na cena mais adorável do filme, faz um apanhado geral da trajetória do casal de protagonistas, com destaque para os momentos mais românticos. E mesmo que ignore boa parte dos dramas vividos pelos personagens, acho que o clipe funciona muito bem como um curta-metragem, que ainda me emociona sempre que vejo.


Agora, prepare-se o momento Cuén!!! do post:

Crepúsculo
Twilight, EUA, 2008

Se você preza por plenitude e tranquilidade em sua relação, assista ao filme para aprender o que não fazer, para então evitar destruí-la. Agora, se seu namoro for marcado por angústia, indecisão, machismo, depressão e masoquismo, e ainda assim você aprecia essa concepção audestrutiva da vida, não posso fazer nada: reveja o filme. Mas aproveite e faça o mesmo com seus conceitos.

8 de junho de 2011

Crítica | Namorados Para Sempre

por Eduardo Monteiro

Blue Valentine, EUA, 2010 | Duração: 1h52 | Lançado no Brasil em 10 de Junho de 2011, nos cinemas | Escrito por Derek Cianfrance, Joey Curtis & Cami Delavigne | Dirigido por Derek Cianfrance | Com Ryan Gosling, Michelle Williams, John Doman, Mike Vogel, Ben Shenkman, Jen Jones, Maryann Plunkett e Faith Wladyka.

Estrategicamente lançado no fim de semana do Dia dos Namorados, Namorados Para Sempre tem de tudo para ser o romance da temporada, certo? Errado. Engana-se quem estiver levando as estratégias de lançamento a sério já que, depois de ignorar o tema e o desfecho de Reencontrando a Felicidade, a mesma distribuidora repete o erro com o ótimo e melancólico drama Blue Valentine. E por mais patético que seja, até um Deu a Louca nos Namorados seria mais fiel que a otimista ou até mesmo equivocada tradução escolhida.

Escrito por Joey Curtis, Cami Delavigne e pelo próprio diretor Derek Cianfrance, o filme acompanha a desgastante rotina de Dean (Gosling) e Cindy (Williams) que, mesmo casados e morando juntos, mal se falam, divergem na criação de sua jovem filha Frankie (Wladyka) e frequentemente parecem tentar se esconder um do outro atrás de óculos escuros. Para tentar dar uma idéia ao espectador das causas desta estranha relação, o filme eventualmente salta no tempo e mostra acontecimentos do período em que os dois se conheceram e vieram a se apaixonar. Mas será que o casal conseguirá manter as promessas de eternidade feitas no matrimônio?

Não é uma resposta simples. Frustrando quaisquer expectativas de quem pudesse esperar um entretenimento lúdico, o filme dedica a maior parte de seu tempo a explorar a complexa e distante relação do casal, adotando uma fotografia com cores alegres e ambientes bem iluminados para representar o próspero período em que se conheceram contrapondo a tons tristes e dessaturados que dominam o restante da projeção, chegando ao extremo nas cenas que se passam em um quarto de motel futurista banhado por um azul frio e claustrofóbico. Com a mesma finalidade, Cianfrance demonstra inteligência ao subverter situações comumente tidas como poéticas para conferir o devido tom à vida de casado de Dean e Cindy, abdicando da leveza e alegria ao estilo "propaganda de margarina" quando uma Cindy exausta é acordada pelo marido e pela filha, ou tornando um banho do casal no motel em um momento raro de relaxamento para a mulher que, por isso, se esquiva das investidas sexuais do esposo. Da mesmo forma, o amor à primeira vista do casal ganha uma grata naturalidade quando Dean busca inutilmente um modo de expressar seu sentimento enquanto se culpa por estar "assistindo a filmes demais", mas acaba percebendo que tentar explicá-lo é uma tolice e arremata com um belo pensamento: "Sabe quando uma música toca e você precisa dançar?"

Aliás, a presença de música se revela de grande importância na narrativa, não só por aproximar Dean e Cindy em certos instantes mas também por representar um dentre os vários elementos que estabelecem interessantes conexões entre o presente e o passado do casal. Para citar apenas alguns exemplos, vale lembrar do momento em que Cindy realiza alegremente uma ultrasonografia em uma paciente, que é remetido na angustiante sequência que se passa em uma clínica de aborto, ou quando ela se esquiva de relações sexuais com Dean em contraponto à sua libido do passado. Aliás, é interessante notar como essas duas situações representam uma espécie de bloqueio de Cindy em relação a sua própria natureza reprodutora já que, mesmo amando incondicionalmente a filha, foi sua gravidez a grande responsável pela atual conjuntura de sua vida. Além disso, é fácil concluir que tanto Cindy quanto Dean parecem dispostos a sustentar aquilo que chamam de família simplesmente para evitar que sua filha sofra com os problemas que eles mesmos enfrentaram na relação com seus próprios pais.

Mas toda a complexidade daquelas pessoas não seria alcançada caso não contasse com as brilhantes interpretações do casal principal. Voltando a comprovar que é um dos melhores atores de sua geração, Ryan Gosling surge com um princípio de calvice e uma aparência suja, vivendo Dean como um pai amoroso, porém um homem machista, acomodado e conformado com um emprego irrisório, tido apenas para sustentar seu alcoolismo e sua família e que se opõe à imensa disposição de quando trabalhava em uma transportadora e se preocupava, por exemplo, em tornar mais dignos os momentos finais da vida de um idoso - e repare como Dean se espanta sutilmente ao ser identificado como marido de Cindy por uma recepcionista do hospital onde a mulher trabalha, como se a simples ideia dela ter mencionado isto para as colegas de trabalho fosse particularmente absurda.

Mas por melhor que o ator esteja, é Michelle Williams quem se destaca com sua impecável composição. Sem precisar de grandes transformações na aparência para diferenciar as duas etapas de sua personagem, a atriz vive Cindy como uma mulher alegre e reservada que quase não consegue esconder sua satisfação ao constatar que um jantar promovido para apresentar Dean à família transcorre normalmente sem intervenções azedas de seu pai (Doman) - mas acaba tendo de abrir mão do plano de cursar medicina para se dedicar à função de mãe e esposa, sem imaginar que sua vida chegaria a ponto tal de desgaste que um dos poucos momentos de alegria que pudesse ter seria reencontrar um antigo colega (Vogel) no supermercado, mesmo que ele lhe traga lembranças irremediavelmente ruins.

No entanto, a cena mais marcante do longa não tem atuações intensas ou frases memoráveis, mas ganha a nossa admiração pela simplicidade com que foi concebida. Exibindo um desajeitado e breve número musical em que Ryan Gosling interpreta a canção "You Always Hurt the One You Love" apenas acompanhado por seu cavaquinho e pela simulação de sapateado de Michelle Williams, o momento une de forma sutil o presente e o futuro do casal (se passa em frente a uma loja de roupas de casamento) entoado por uma música (tema recorrente, como já citei) que resume perfeitamente as ações do próprio Dean durante toda a história (com uma melancolia adicional graças ao modo como é executada), além de representar um dos primeiros e últimos momentos de plenas sintonia e felicidade do casal (e não é à toa que o corte seguinte surja como um choque de realidade, levando-nos de volta ao frio quarto de motel onde uma descabelada Cindy inicia uma discussão). E se há alguma brecha que permita enxergar o desfecho com um mínimo de otimismo que seja, ela certamente está nessa cena - que, em suma, exibe uma doçura apaixonante a partir de uma interação simples entre duas pessoas que estão se conhecendo.

Namorados Para Sempre é, enfim, uma história de um casal jovem que sofre as consequências do início precoce e impulsivo de uma família e arrasta a relação até que esta se torne insustentável. Não sei em que nível de modernidade estão os casais de hoje em dia, mas imagino que a história esteja longe de ser o que procuram para celebrar o Dia dos Namorados. O que obviamente não impede que a obra seja amplamente apreciada fora desse contexto.

6 de junho de 2011

Crítica | Kung Fu Panda 2

por Eduardo Monteiro

Kung Fu Panda 2, EUA, 2011 | Duração: 1h31 | Lançado no Brasil em 10 de Junho de 2011, nos cinemas | Escrito por Jonathan Aibel e Glenn Berger | Dirigido por Jennifer Yuh Nelson | Com as vozes de Jack Black, Angelina Jolie, Dustin Hoffman, Gary Oldman, Seth Rogen, Lucy Liu, David Cross, James Hong, Michelle Yeoh, Danny McBride, Dennis Haysbert, Jean-Claude Van Damme, Victor Garber e Jackie Chan.

Em certo momento da metade final de Kung Fu Panda 2, fui pego de surpresa quando Team America: Detonando o Mundo veio de forma meteórica à minha mente. Se a simples associação entre os filmes já era preocupante em função dos públicos-alvos diametralmente opostos, a coisa piorou quando me dei conta da razão da recordação: o contexto que antecede a resolução do conflito visto aqui é muito semelhante ao daquele filme. E por melhor que Team America seja, a comparação jamais poderá ser encarada com bons olhos, já que um dos grandes méritos do longa de Trey Parker era abraçar uma história terrivelmente clichê e fingir levá-la a sério, tornando histericamente divertidas as tentativas tolas das marionetes de conferir alguma credibilidade ao material - enquanto aqui, os roteiristas Jonathan Aibel e Glenn Berger parecem realmente levá-la a sério.

Elevando Jennifer Yuh Nelson, uma das designers do filme anterior, ao posto de diretora, o filme acompanha a primeira grande missão do panda Po (Black) após se estabelecer como o lendário Dragão Guerreiro e derrotar Tai Lung no longa anterior. Juntamente com os Cinco Furiosos, ele deve enfrentar o pavão Lorde Shen (Oldman) que, diante de uma profecia que prevê sua morte por um ser preto-e-branco, prepara um arsenal de uma perigosa arma à base de metal e fogos de artifício que "pode acabar de uma vez por todas com o kung fu".

Se no primeiro Kung Fu Panda as boas cenas de ação e a ótima direção de arte eram o suficiente para perdoar a história rasa, agora o drama de "ser você mesmo" é substituído por uma boba crise de identidade para justificar cenas de ação burocráticas e com notável defasagem de clareza e inspiração, possibilitadas por um design de produção que não impressiona tanto quanto o do antecessor. Assim, o roteiro retoma uma das melhores piadas do filme original apenas para destruí-la: o ganso Sr. Ping (Hong) - que continua sendo o personagem mais divertido - finalmente revela que Po é adotado, mas esse fato é convenientemente apresentado apenas para estabelecer conexões com a trama do vilão e reescrever a lição dada no primeiro filme - e o pouco que é apresentado de sua infância (geralmente em uma interessante animação em 2D) acaba transformando a história em uma versão apressada de Harry Potter (vilão toma conhecimento de uma profecia sobre a própria morte e tenta impedir que ela se concretize atacando o grupo supostamente responsável).

Mas não é só o assassinato daquela piada que surge como um momento mal aproveitado. No encerramento da cena em que a pequena comitiva está partindo do Vale da Paz, Tigresa (Jolie) volta-se para Sr. Ping e, no intuito de consolá-lo, diz que Po estará de volta "antes que ele possa dizer 'macarrão'" - e, sem ter muito o que fazer para encerrar a seqüência de forma interessante, os realizadores apelam para o mais previsível e barato sentimentalismo envolvendo o ganso. Em outros momentos, Po derrota pequenas ameaças apenas para, segundos depois, perceber que ela era na verdade muito maior - o que, além de ser um recurso pouco original para gerar humor (com as famosas caretas das animações da Dreamworks), aqui é usado mais vezes que o necessário. Aliás, o próprio comportamento do panda é decepcionante, já que depende de sua aparentemente insuperável imaturidade para movimentar a história - e as piadas envolvendo sua pança haviam cansado já no primeiro filme. É uma pena, portanto, que alguns personagens novos (naturalmente com bom potencial) sejam tão desperdiçados, comos os mestres Boi Toró (Haysbert) ou Crocodilo (Van Damme), que permanecem praticamente sem função durante todo o tempo - e até mesmo o já conhecido Shifu (Hoffman) e os Cinco Furiosos não têm participações marcantes.

Em compensação, ao menos o vilão se revela minimamente interessante. Com um design que acerta ao manter o visual naturalmente desajeitado e desproporcional da ave ao mesmo tempo que cria uma aura ameaçadora, o pavão exibe alguma complexidade ao projetar suas próprias inseguranças nos personagens que o cercam ao mesmo tempo que parece esconder um complexo envolvendo sua aparência exótica. No entanto, seu megalomaníaco plano é tão inconvicente quanto a solução encontrada para ele, uma vez que em momento algum as armas utilizadas correspondem às altas expectativas criadas a seu respeito nos momentos iniciais da projeção - e se as habilidades que possibilitaram Po derrotar Tai Lung no primeiro Kung Fu Panda pareciam uma estranha e divertida obra do acaso, agora o modo que encontra para enfrentar Lorde Shen soa exageradamente trivial, como se pudesse ser executado por qualquer um dos Cinco Furiosos (mas devo reconhecer que, esteticamente falando, a cena funciona bem, já que a animação de bolas de metal e fogo é bem executada e visualmente inspirada).

Contando ainda com pontuais boas sacadas (como detalhes da concepção de Sr. Ping na juventude ou o lúdico momento em que Po e os Cinco Furiosos se escondem em uma fantasia de dragão - cena essa que, fotografada em um plano plongée, remete a jogos de videogame como o clássico Pac Man), Kung Fu Panda 2 falha por não conseguir explorar os reais potenciais do primeiro filme, se limitando a ser uma narrativa ocorrida após aqueles acontecimentos e não uma consequência natural deles. Assim, o longa acaba rebaixando-se a um entretenimento leve e vazio, produzido para despertar o interesse principalmente das crianças que, assim como um filhote de porco visto em certo momento da projeção, estão ali só para ver o estabanado, obeso e engraçadinho panda. E se depender da sugestão dada na última cena, essa é uma tendência que eventualmente voltará a se confirmar.

4 de junho de 2011

Crítica | O Noivo da Minha Melhor Amiga

por Eduardo Monteiro

Something Borrowed, EUA, 2011 | Duração: 1h52 | Lançado no Brasil em 13 de Maio de 2011, nos cinemas | Baseado no romance de Emily Giffin. Escrito por Jennie Snyder Urman | Dirigido por Luke Greenfield | Com Ginnifer Goodwin, Kate Hudson, Colin Egglesfield, John Krasinski, Steve Howey, Ashley Williams, Geoff Pierson e Jill Eikenberry.

Quando escrevi sobre as semelhanças entre o pôster de O Noivo da Minha Melhor Amiga e o de outro filme da mesma distribuidora, sugeri que o desfecho do longa poderia ser facilmente deduzido a partir de sua arte de divulgação. Enganei-me. Por mais que boa parte dos elementos que me fizeram ter essa idéia estejam presentes no novo filme de Luke Greenfield, meu palpite (que não revelarei para não estragar a "surpresa") foi totalmente equivocado. Esse fato é extremamente adequado para gerar uma reflexão sobre a validade de criar expectativas e predisposições para qualquer filme - mas não pode ser encarado como um sinal da eficiência e capacidade de surpreender desta obra em particular. Aliás, não ser completamente previsível pelo pôster talvez seja um dos únicos méritos do filme.

Estabelecendo-se como mais um exemplar do limitado subgênero de comédias românticas com histórias que antecedem um casamento e apresentam um triângulo amoroso envolvendo pelo menos um dos noivos, o filme acompanha o desconsolo de Rachel (Goodwin) diante do noivado de uma antiga paixão de faculdade, Dex (Egglesfield), com sua melhor amiga, Darcy (Hudson). Mas a situação se complica após Rachel e Dex trocarem alguns beijos e descobrirem que nutrem uma paixão secreta e mútua, dando início a um relacionamento afetivo que pode botar em risco as amizades envolvidas.

Mas o que esperar de um filme que, já em seus primeiros minutos, demonstra total falta de confiança na inteligência do espectador ao martelar informações através de diálogos expositivos mesmo que já estejam sendo transmitidas por meio de outras estratégias mais sutis? Se o fato de Rachel já ter conhecimento de sua própria festa surpresa era sugerido na primeiríssima cena, havia realmente a necessidade de colocar alguém perguntando-lhe se fora mesmo surpreendida? E se, nesta mesma festa, é Darcy quem rouba as atenções com um discurso que exalta sua alegria com seu próprio noivado, além da decoração formada por imagens suas segurando cartazes de congratulações à amiga, é realmente necessário que o amigo Ethan (Krasinski) explicite duas vezes o óbvio egocentrismo da mulher? Para o roteiro de James Snyder Urman, baseado no romance de Emily Giffin, essas intervenções são sim necessárias, assim como o video exibido durante a ocasião, que é usado para apresentar de forma didática o passado dos quatro personagens centrais, sem a mínima cerimônia.

A partir daí, o que se segue é um vai-e-vem interminável que não se diferencia em praticamente nada de tantas outras comédias românticas do subgênero, já que até mesmo o título nacional reduz o filme a uma versão alternativa de, por exemplo, O Melhor Amigo da Noiva (até eu, que raramente confundo nomes de filmes, gaguejei na hora de comprar o ingresso!). Além da falta de originalidade, o filme se torna extremamente aborrecido por investir em acontecimentos implausíveis para dar uma falsa sensação ao espectador que algo de fato está ocorrendo. Desse modo, quando Rachel e Dex são acordados na manhã seguinte à primeira transa por uma ligação de Darcy à procura do noivo, o casal opta por ter um ataque de nervos ao invés da protagonista simplesmente atender ao telefone e conversar naturalmente com a amiga como se nada tivesse acontecido. Ou ainda: após derrubar acidentalmente todas as suas canetas na sala da faculdade, o que impede Rachel de solicitar ao colega da fileira da frente a gentileza de pegá-las no chão ao invés de entrar em desespero? E como explicar a repentina mudança de humor de Rachel ao dançar com Darcy uma música no último volume, às 3 da madrugada (Vizinhos? Que vizinhos que nada!), segundos após se safar de uma aflitiva enrascada que quase expôs seu relacionamento secreto?

A busca por essas explicações é tão tola quanto tentar entender o que faz Rachel persistir na amizade com Darcy, já que esta última é vivida por Kate Hudson como uma mulher fútil, arrogante, burra, imatura e egocêntrica - o que ao menos dá à atriz a chance de se divertir no papel. Menos difícil é compreender as razões de Dex para se envolver com ela (além das exigências de roteiro), já que o personagem de Colin Egglesfield é um paspalho inerte, com uma infantil submissão ao conservadorismo dos pais, mas que pelo menos se sai bem na função de ser... bonito (quando não faz cara de Tom Cruise). Enquanto isso, o Ethan de John Krasinski agrega muito do Jim do seriado The Office, porém com a ironia e o carisma substituídos por uma aborrecida e imatura mania de se comunicar através de piadas. E Ginnifer Goodwin também não se sai muito bem como Rachel, tendo que alternar a expressão de desconsolada e falsa alegria com inapropriados impulsos infantis (como na estúpida e batida cena de provocação de casais na pista de dança).

E é ainda mais assustador perceber que, em um filme abordando conflitos da crise dos 30 anos, os termos de ordem das descrições dos personagens sejam "imaturo" e "infantil". Assim, foi com relativo alívio que, próximo ao clímax, me animei com a proximidade do desfecho da narrativa - mas acabei caindo na pegadinha de Greenfield, que ainda havia reservado mais 20 autodestrutivos minutos de projeção até o verdadeiro final, aproveitando o tempo extra para derrubar aquilo que considerávamos mais concreto e articular mais dois ou três clichês, os quais havíamos comemorado a ausência. Mas se o filme pode ter dois finais, é de direito que também me seja concedido um segundo palpite! E acreditem: se eu tivesse realmente tido essa chance antes da sessão, o segundo sim teria sido certeiro.

Obs.: Há uma cena adicional durante os créditos finais que: 1) é estranhamente mal situada cronologicamente; 2) destrói algo de funcional e eficiente do final e 3) conta com um letreiro de "Continua..." que dispensa comentários.

3 de junho de 2011

Se For Pra Estragar, Não Traduza!

Não é de hoje que as distribuidoras aproveitam o sucesso de outros filmes para ajudar a promover seus próprios lançamentos. Há dois anos atrás, The Hangover (que tinha como destaque a participação de Zach Galifianakis) da Warner Bros. foi transformado em Se Beber, Não Case! - e, meses depois, foi vítima de sua própria infidelidade na tradução quando Hot Tube Time Machine da Imagem Filmes virou A Ressaca, aproveitando o sucesso da comédia do estúdio dos irmãos Warner.


Agora, It's Kind of a Funny Story, também com a presença de Galifianakis, foi magistralmente traduzido pela Universal Pictures. Vejam o resultado:

Se Enlouquecer, Não Se Apaixone (Fonte: Revista Ver Vídeo)
Coincidência? Pode ter certeza que não!